Amarrando cachorro com linguiça
*Por Circe Cunha
Está mais do que atestado, nesses tempos de
desnudamento geral, que obras públicas, geradas a partir de decisões políticas,
estão, na sua grande maioria, eivadas de suspeitas de superfaturamento e
sobrepreços, gerando propinas e alimentando o ciclo da corrupção endêmica. Há
anos é sabido que as grandes construções públicas por todo o país, e em todo o
tempo, tocadas pela maioria das empreiteiras nacionais a partir de decisões de
presidentes da República, governadores e prefeitos, estão repletas de irregularidades
que começam ainda na fase de licitação e vão se estendendo à margem da lei à
medida em que as obras avançam.
Na realização da última Copa do Mundo de Futebol no
Brasil, 100% das obras de construção dos estádios para receber os jogos
apresentaram algum tipo de irregularidade. Algumas delas, como é o caso do
estádio Mané Garrincha, simplesmente triplicaram de preço. Se forem feitos
levantamentos para averiguar os prejuízos gerados pelas obras públicas aos
contribuintes, apenas nos últimos 10 anos, poderemos estar diante de números
absolutamente astronômicos, que demonstram que a associação entre políticos e
empreiteiros tem sido organizada apenas para dilapidar e saquear o Tesouro.
Torna-se ainda mais sintomático quando se verifica que os tribunais de
contas e outros órgãos de fiscalização do dinheiro público nada fizeram para
pôr fim à farra delituosa. Na maioria dos casos, as instituições só começam a
agir depois dos seguidos alertas feitos pela imprensa ou após a polícia colocar
um par de algemas em alguns figurões. Pior é que, a cada mecanismo criado para
coibir essas práticas danosas, outras estratégias são preparadas para dar
continuidade à ação desses verdadeiros bandoleiros engravatados que desfilam
impávidos pelos salões atapetados da corte.
A situação chegou a tal ponto que é muito melhor e mais econômico para o
contribuinte proibir, definitivamente, que políticos tomem a frente das obras
públicas. Nessa altura dos acontecimentos, muitos brasileiros aprenderam a
enxergar aqueles políticos, desfilando em obras públicas com o capacete branco
de proteção e mangas arregaçadas, como um sinal de que naquele canteiro de obra
brotam flores fáceis e abundantes. Abduzida por uma casta de políticos do mesmo
matiz ético dos que pululam pelo resto do país, não é surpresa para ninguém
que, também na capital, esse fenômeno tenha sido repetido com a mesma
desenvoltura, desfaçatez, pelas empresas e por igual modus operandi.
Obras como o Estádio Mané Garrincha, o Centro Administrativo do GDF
(Centrad), o BRT (expresso DF), o Jardim Mangueiral, entre outras construções,
como a própria Ponte JK, são exemplos de grandes empreendimentos tocados por
políticos de capacete branco e que geraram prejuízos incalculáveis aos
brasilienses, que, só agora, tardiamente, são reclamados na Justiça. Se
tivessem dado ouvidos ao filósofo de Mondubim, esses políticos, disfarçados de
empreiteiros, saberiam que mais cedo ou mais tarde o alheio sempre chora e
clama por seu dono legítimo.
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A frase que foi pronunciada
“Errar é bom, desde que não se torne um hábito”
(Michael Eisner, empresário americano)
(*) Circe Cunha – Coluna “Visto,
lido e ouvido” – Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog -
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