Grupo de Helio Ortiz tinha intermediário, conhecido
como "o cabra", para aliciar possíveis clientes - Criminosos cobravam até R$ 220 mil por uma vaga em
cursos de medicina. O grupo também agia fora do DF
*Por Ana Viriato
Alvo da Operação Panoptes, deflagrada
na última segunda-feira, a organização criminosa liderada por Helio Ortiz
fraudava vestibulares de universidades públicas e particulares, além de
concursos. Os detalhes da negociata estão descritos em um dos depoimentos
anexados ao inquérito da investigação. Aos policiais da Divisão Especial de
Combate ao Crime Organizado (Deco), Miguel (nome fictício), 58 anos, contou
que, para emplacar a aprovação da filha dele, de 21 anos, em uma faculdade
pública de Medicina do DF, Bruno Ortiz cobrou R$ 220 mil.
Como consta no termo de declaração, a
abordagem aconteceu por meio de um representante de medicamentos conhecido como
“o cabra”. Miguel contou que, em março de 2016, comentou, no consultório onde
trabalha, sobre a preocupação da filha com a dificuldade em conseguir a
aprovação no curso — a moça tentava uma vaga desde 2015 em diversas
universidades e, ao todo, prestou 10 vestibulares. “O cabra”, então, disse que
“conhecia uma pessoa que poderia resolver seu problema”.
No mês seguinte, o mediador o
apresentou a Bruno Ortiz, em uma padaria do Guará. À época, o filho de Helio
Ortiz informou que “seu trabalho seria somente em vestibulares da universidade
pública do DF”. O integrante da organização criminosa ainda explicou que, no
dia da prova, a moça teria de realizar o exame com uma caneta de tinta
apagável. Posteriormente, o grupo remarcaria o gabarito, com as respostas
corretas.
Bruno Ortiz acrescentou que, se a filha
de Miguel desejasse a escrita da redação, uma terceira pessoa responderia a
prova no lugar dela — neste caso, seria cobrado um adicional de R$ 800. À Deco,
Miguel disse tê-lo questionado sobre o que aconteceria se a aprovação não fosse
concretizada. Ele recebeu uma resposta sucinta: “Não seria exigido pagamento”,
disse Ortiz.
A ideia despertou a reprovação de parte
da família. A filha de 21 anos ressaltou que “aquilo seria desonesto e que,
caso anuísse, estaria retirando a vaga de outra pessoa”. A esposa de Miguel
também mostrou-se contrária à estratégia. “Não é certo”, disse a companheira.
Ainda assim, ele fechou negócio e pagou
uma entrada de R$ 45 mil a Bruno Ortiz. O restante seria dividido em outros
dois repasses: metade a partir da publicação do nome da moça na lista de
aprovação e o restante, após a matrícula. A jovem de 21 anos realizou as
provas, mas não passou no vestibular.
Bruno ainda havia oferecido a Miguel
vagas em outras duas faculdades particulares do DF e em outra, no estado de
Goiás. Nesse caso, indicou a mediadora Alda Maria de Oliveira Gomes,
ex-funcionária pública e alvo de condução coercitiva na Operação Panoptes. Em
dois encontros, durante o ano passado, a mulher teria cobrado R$ 170 mil pela
aprovação no curso de medicina nessas universidades privadas.
Punições
O delegado adjunto da Deco, Adriano
Valente, confirmou que as investigações alcançam também fraudes em
vestibulares. “Ainda não é possível precisar o número de certames fraudados.
Possivelmente, será deflagrada uma nova fase da Operação Panoptes, voltada
especificamente a essa modalidade criminosa”.
Os candidatos que pagam por vagas em
universidades públicas ou privadas podem ser enquadrados no crime de fraude à
certame de interesse público. Caso os pais realizem o repasse pelos postos e os
concorrentes sejam menores de idade, há, ainda, incidência de corrupção de
menores. Além disso, a depender do número de envolvidos e do grau de
proximidade, o grupo classifica-se como organização criminosa.
Alda Maria prestou esclarecimentos à
Deco sobre a suposta participação no esquema de fraudes. Procurado pelo
Correio, o advogado de Bruno Ortiz afirmou que não teve acesso aos autos e,
portanto, não poderia comentar as acusações.
(*) Ana Viriato – Foto: Reprodução Polícia Civíl do
DF – C.B. – Correio Braziliense