Integração é a solução
Por Milena de Lannoy
Arquiteta e urbanista, mestre em arquitetura sustentável e especialista
em reabilitação ambiental sustentável
O relatório entregue por Lucio Costa aos membros do júri do concurso
para a nova capital falava que a cidade modernista “nascia do gesto primário de
quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo
reto, ou seja, o próprio sinal da cruz”. Essa cidade de vanguarda é elogiada
por pessoas e arquitetos do mundo inteiro. Lucio propôs uma técnica rodoviária
inovadora para a época, sem cruzamentos e de acessos intuitivos, com largos e
velozes eixos. Com sábias decisões, projetou uma capital que contemplava o
avanço da indústria automobilística, permitindo às pessoas morar perto do
trabalho e se deslocar de modo ágil e organizado. Como descreveu JK no livro
Por que Construí Brasília, “já havíamos entrado na era do automóvel”.
Entre 1985 e 1987, Lucio retornou à cidade e escreveu Brasília
Revisitada. Ele observou o tráfego com a fluência de rodovias, e a facilidade
de se atravessar a cidade livre de engarrafamentos. Mas traduziu como
incompreensível até então não existir um serviço de ônibus municipal impecável,
que aproveitasse as facilidades urbanísticas.
Em 1992, tiveram início as obras do sistema metroviário. Segundo o
Metrô-DF, os trens transportam, em média, 160 mil passageiros por dia. Apesar
de o desenho da cidade não favorecer esse modal, deve-se considerar as outras
vantagens: transporte seguro, limpo, rápido e não poluente. Nesse último, ele
perde só para a bicicleta, que também é saudável e econômica.
Nos últimos anos, as condições de mobilidade vêm se degradando não
apenas em Brasília, mas no Brasil. O crescimento urbano difuso e fragmentado,
impulsionado pela sedutora indústria automobilística, teve como consequência a
dependência do carro, resultando na contramão da mobilidade urbana sustentável
— que é a realização do direito de ir e vir a todos os cidadãos, garantido pelo
instrumento da acessibilidade universal.
Segundo Carlos Henrique Carvalho, pesquisador do Ipea, as famílias
brasileiras gastam mais com transporte privado do que com público em
praticamente todas as faixas de renda. O problema é que o automóvel, além de
confortável, proporciona status e satisfaz de forma individual. O número da
frota de veículos de Brasília é incompreensível. A média é de 1,7 veículo para
cada dois habitantes, realidade que faz com que os brasilienses passem cada vez
mais tempo em engarrafamentos.
Em vários países, instalou-se uma nova mentalidade sobre o uso
consciente de meios de transportes não poluentes, coletivos e individuais, como
a bicicleta. Foi necessária uma condição de colapso para se repensar a
mobilidade no nosso país. Em Brasília, o problema é um pouco mais complexo,
pois existe a dinâmica das “cidades dormitórios”. Metade da população trabalha
no Plano Piloto e precisa percorrer grandes distâncias.
A solução deve ser baseada na integração dos diferentes modais.
Portanto, da mesma forma que Lucio Costa propôs uma alternativa que atendeu de
forma satisfatória as condições de trânsito por ao menos três ou quatro
décadas, será necessário refletir quais as possibilidades que poderão ser
implementadas por aqui e que ofereçam aos brasilienses, nos próximos 50 anos,
formas de mobilidade sustentáveis e democráticas.
(*) Milena de Lannoy – Foto: Arquivo pessoal –
Correio Braziliense
Apenas uma consideração: participei da equipe original de Urbanismo da Novacap (DUA) que desenvolveu o Plano Piloto de Lucio Costa (1957).Entre as inúmeras tarefas que assumi foi , junto com Augusto Guimarães Filho, projetar todo o Complexo da área Central,compreendendo a Plataforma Rodoviária incluindo o Terminal dos Ônibus), e as duas Praças de Pedestres que dele fazem parte.Pouco tempo mais tarde desenvolvi com o próprio Lucio o sistema de linhas de ônibus que deveriam servir à cidade,onde as diversas linhas se combinavam na área térrea da Plataforma.A cidade seria toda atendida por meio de bilhete único.Mais tarde ainda, no ano de 1992, junto com Maria Elisa Costa e Augusto Guimarães Filho, fomos contratados analizar o traçado do Metrô,já em execução, na área urbana do Plano Piloto (nesta altura já tombado pelo IPHAN. Não nos cabia discutir a existência do sistema metroviário, mas apenas estudar os impactos da sua implantação na área urbana. Havia um plano proposto para a sua implantação pela Empresa que já executava a obra. A sua execução seria um desastre completo e significaria a destruição definitiva do Plano Piloto.Seriam construídas duas linhas, uma em cada banda da Área Sul chegando a Plataforma Central, uma situada na w2 Sul e outra na W2 Norte, perfazendo cerca de 12km de linhas, com Estações em cada uma destas linhas.A permanecer o "Traçado Oficial", a W2 "iria transformar-se numa segunda e indesejável W3, pois alocalização das Estações , em contato com o sistema viário de superfície tornar-se-iam pontos indutores de transformação, em particular de acréscimo de gabarito, de ocupação e, pior, acarretariam amodificação do caráter secundário da via, aumentando o tráfego local e compromentendo a tranquilidade das Super Quadras contíguas.Na L2 dar-se-ia impacto similar e, mais, o encontro das duas linhas no Centro seria tecnicamente inviável.Propusemos então, após detidos estudos sobre sistemas metroviários existentes mundo afora que o Eixo viário/tronco já executado tinha todas as condições para receber o Metrô e absolutamente favoráveis do ponto de vista construtivo e dentro das Normas observadas para este sistema de locomoção e, sobretudo, com enorme economia de custos.Isto ensejou ainda o Projetos das Passagens de Ligação de Pedestres entre as duas bandas do Eixo Residencial. Lamentavelmente, embora aprovados pelo então Governador da Cidade, elas não foram implementadas. Elas seriam construídas como parte do Acesso as Estações e resolveriam definitivamente destas INDISPENSÁVEIS ligações de Pedestres hoje, ainda, usando uma passagem projetada para ligações de tubulações públicas. Estes esclarecimentos mostram que Brasília , embora não previsse o Metrô, seu traçado, ao contrário do que se diz, aceitou-o normalmente, incorporando-o no seu EIXO RODOVIÁRIO TRONCO sem qualquer alteração aberrante e obediente ao Tombamento pelo IPHAN. Se seria ou não implantá-lo ou não é outra questão a ser discutida.Pessoalmente penso que se Brasília fosse desenvolvida obediente ao seu propósito, não haveria necessidade de implantá-lo, mas com a "conurbação" dos "Núcleos Satélites"(hoje tornados bairros da Capital), ele serve complementarmente aos demais sistemas existentes.
ResponderExcluirExistem pequenos erros de gramática a serem corrigidos, mas isto não impede a compreensão da leitura...enviei antes da revisão, o almoço estava posto!!!
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