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100 dias de governo Bolsonaro

100 dias de governo Bolsonaro

*Por Armando Castelar 

Quando um governo começa, sabe-se pouco sobre como ele será. Quais serão as equipes e as alianças políticas? O que da retórica eleitoral se transformará em política pública? Responder essas questões é, para mim, a principal razão para observar atentamente os 100 primeiros dias de governo, atualizando impressões e expectativas. Poucas vezes, isso valeu tanto como no governo Bolsonaro. Isto posto, quais os destaques dos 100 primeiros dias do governo Bolsonaro e o que eles prenunciam para a economia?

O destaque positivo, para mim, foi a qualidade da equipe econômica. É uma equipe bem preparada, coesa e disciplinada. Isso tem permitido gerir o (Super)Ministério da Economia surpreendentemente bem. Ajudou a equipe ser formada não só por bons economistas, mas também por pessoas com experiência na máquina pública e nas articulações com o Congresso. Há também boas equipes em outros ministérios. O da Infraestrutura, por exemplo, também tem surpreendido positivamente.

O governo também produziu uma boa reforma da Previdência, com rapidez, e manteve a disciplina de priorizá-la, a despeito de ter extensa agenda de outras reformas, na economia e em outras áreas. Surpreendeu-me também o grande apoio que a imprensa e o empresariado têm dado à reforma da Previdência.

Por outro lado, também surpreendeu a forma de o presidente se relacionar com o Congresso, em que pese reconhecer que foi isso o que prometeu nas eleições. Eu pensava que, como outros presidentes brasileiros desde a redemocratização, ele abraçaria o presidencialismo de coalizão, fazendo uma parceria com partidos que comporiam sua base no Congresso, e com os quais dividiria os ônus e os bônus do mandato presidencial.

Não fui só eu que pensei assim: os próprios congressistas parecem ter se surpreendido com a postura do presidente. Eles passaram fevereiro esperando um gesto nesse sentido do presidente, que, porém, “dobrou a aposta”, rotulando esse tipo de parceria de “velha política” e associando-a à corrupção. Só em meados de março, os congressistas parecem ter assimilado a surpresa.

Em lugar do presidencialismo de coalizão, o presidente quer trabalhar com maiorias pontuais, formadas em cada votação. No resto do tempo, cada um em seu poleiro. Isso terá implicações relevantes para como a política e a economia vão funcionar. Deixem-me citar duas delas. Primeiro, as partes vão buscar entregar o mínimo possível em cada votação, poupando suas fichas para a próxima rodada. Além disso, buscarão valorizar ao máximo seu voto, deixando para decidir apenas no último momento. Isso elevará muito a incerteza.

Segundo, governo e Congresso vão buscar promover sua popularidade, enquanto tentam comprometer a do outro. Será uma relação de disputa, não de parceria. Isso influenciará o que será aprovado, fortalecerá os grupos de interesse e favorecerá o populismo, como se viu este mês com a anistia aos produtores rurais (Funrural) e a interferência do presidente na política de preços da Petrobras. O Congresso também já sinalizou como reagirá a essa nova realidade. De um lado, reduzindo a autonomia do Executivo, via, por exemplo, a emenda constitucional do Orçamento Impositivo. De outro, jogando com dois instrumentos que controla: o conteúdo e o tempo das propostas do Executivo que aprovará.

No caso da reforma da Previdência, talvez por ter pego o Congresso de surpresa, e sem entrar no mérito da questão, o Executivo conseguiu repassar ao Congresso a responsabilidade por aprovar a reforma da Previdência. Ou, então, assumir a culpa se o desempenho da economia piorar ainda mais.

Por isso, o Congresso deve aprovar a reforma da Previdência, só que não como quer o governo. Em relação ao conteúdo, o Congresso vai reagir à nova situação desidratando o impacto fiscal da reforma da Previdência. Fará isso para reduzir o seu ônus político, mas também para limitar o bônus do Executivo.

O tempo, porém, será o principal instrumento. Este, não custa lembrar, joga contra o Executivo: quanto mais ele passa, menor é sua perspectiva de poder. Assim, o Congresso vai demorar a aprovar a reforma. Isso colocará o governo na difícil posição de ter de decidir se continua priorizando apenas a reforma da Previdência, abandonando outras reformas, ou se muda de estratégia e tenta avançar com todas as reformas ao mesmo tempo. Não será um clima bom para a economia. Isso pode forçar uma relação mais cooperativa entre os dois Poderes. Ou pelo menos, assim espero.

(*) Armando Castelar - Coordenador de economia aplicada do Ibre/FGV e professor do IE/UFRG - Correio Braziliense

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