UnB apura casos de assédio. Comunidade acadêmica se mobiliza em defesa
de mulheres que trabalham como porteiras dos quatro câmpus da universidade
pública. Elas reclamam de perseguição, principalmente daquelas que engravidam
ou voltam de licença-maternidade
*Por Isa Stacciarini
Trabalhadoras de uma empresa terceirizada da Universidade de Brasília
(UnB) denunciam ter sofrido assédio moral de um dos supervisores da firma. Elas
são contratadas pela SS. Empreendimentos e Serviços Eireli, conhecida como
Servite, e prestam serviço de portaria em cada um dos quatro câmpus da
instituição pública. Todas são subordinadas a um chefe da firma privada,
chamado de preposto, acusado de persegui-las.
Em fevereiro, elas fizeram uma representação no Decanato de Gestão de
Pessoas Terceirizadas (DGPT) da UnB. Antes, em dezembro, denunciaram o caso à
Superintendência Regional do Trabalho (SRT-DF), que passou a fiscalizar a
empresa. Algumas das supostas vítimas tiveram apoio psicológico oferecido pela
universidade. Elas também contam com apoio de estudantes e de centrais
sindicais. Há cartazes anexados nas paredes de prédio da UnB contra o
supervisor. Eles denunciam casos de assédio moral, perseguição e demissões
injustas. Em negrito e em letras garrafais, consta o pedido: “Fora o preposto
da Servite”.
De 270 a 280 pessoas trabalham como porteiros nos câmpus da UnB, em uma
escala de 36 horas de folga para cada 12 horas trabalhadas. Uma das empregadas
que relata ter sido vítima do supervisor cumpre aviso prévio desde 22 de março.
Ela tem 31 anos e trabalha há 10 como porteira em blocos da UnB. Diz sofrer
perseguição desde a chegada do representante da empresa, há pouco mais de um
ano. A mulher contou que a retaliação do supervisor começou quando ela voltou
da licença-maternidade, em julho de 2018, após o filho nascer em março.
No retorno ao emprego, a funcionária trabalhou um mês para ter direito a
férias. Retomou oficialmente em setembro, antes da criança completar seis
meses. Amparada pela legislação, a babá levava o bebê para a mãe amamentar
durante uma hora ao dia, mas a empregada conta que o chefe comparecia todos os
dias ao posto dela. “Ele ficava me perseguindo, me procurava todo dia no
plantão, falava que só o meu filho não se acostumava com mamadeira nem comida e
duvidava de mim. Eu ficava tão nervosa que o meu leite secava”, relatou a
moradora de Águas Lindas (GO).
Mudanças
Antes de engravidar, a porteira trabalhava na Faculdade de Educação
(FE), onde existe estrutura de berçário para crianças e apoio para mãe. Quando
voltou do trabalho, após a licença-maternidade, ela foi transferida para a
função reserva. “Chegaram a dizer que o posto foi desativado, uma desculpa. Não
se sensibilizaram para me deixar lá”, comentou.
Há dois meses a porteira enfrenta atraso no repasse do vale-alimentação
e do valor da passagem. Para ir ao trabalho, pagou o transporte com o dinheiro
que usa para comprar remédios do filho. Sem dinheiro para cumprir a escala de
trabalho, procurou a sede da Servite, no Rio Grande do Norte. “Quando o
preposto foi acionado para resolver a minha situação, ele gritou. Nunca teve
diálogo. Toda relação foi baseada no grito”, lamentou, em lágrimas.
Chefe da seção de inspeção do trabalho da SRT-DF, Fernando Reis disse
que iniciou, em janeiro, a fiscalização das denúncias. Em 12 de fevereiro, um
auditor esteve na empresa e deixou uma notificação. Dois dias depois, começou a
análise da documentação para a Servite apresentar a resposta. O prazo foi
prorrogado, mas Fernando não informou para quando. Se for constatada alguma
irregularidade, a empresa será autuada.
A UnB confirmou a abertura de processo para apurar as denúncias, sem
prazo para a conclusão da apuração. Caso a universidade identifique alguma
irregularidade, é possível notificar a empresa terceirizada, multá-la e até
rescindir o contrato.
Em nota oficial, a Servite informou que as denúncias serão apuradas. Até
o fim da investigação, o supervisor alvo da denúncia será afastado para ter o
direito de defesa. Mas a empresa duvida da veracidade dos relatos. Acredita
terem sido motivados “por rancor das denunciantes, diante do fato de terem sido
desligadas da empresa, com outros colaboradores. Os desligamentos em questão,
que fique claro, ocorreram a pedido do contratante, a UnB”.
A empresa também disse “investir fortemente” na capacitação dos
colaboradores, por meio do setor de recursos humanos, e que “coíbe
veementemente qualquer tipo de assédio, estando esta política presente no
manual entregue a cada colaborador”.
(*) Isa Stacciarini – Foto: Michael Melo – Correio Braziliense
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