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As histórias de mulheres que mudaram o Carnaval do DF

As histórias de mulheres que mudaram o Carnaval do DF. De pioneira à criadora de um dos blocos mais cobiçados da capital, elas estão mostrando o poder feminino na grande folia. (*Por Fernanda Suassuna)

No comando de blocos, à frente de bandas e até mesmo nos bastidores. O protagonismo feminino no Carnaval do Distrito Federal tem se tornado cada vez mais evidente, sobretudo aquele com viés ativista. Além de uma série de reivindicações contra o machismo e o assédio, elas comemoram a potência do encontro de mentes nada frágeis na folia.

Em meio a importantes discussões sobre os debates de gênero (que alcançam da política a reality shows globais), o Metrópoles apresenta iniciativas de mulheres da capital federal que lutaram para derrubar estereótipos e fizeram dos festins um cenário mais diverso e respeitoso para todos.

Pioneira dos blocos: Uma das primeiras mulheres a ressignificar o Carnaval local é exemplo de força e resiliência. Aos 39 anos, Jul Pagul mantém vivas as memórias de quando, há uma década, abria espaço na praça do extinto Balaio Café para festas e blocos com pegada feminista e a favor das causas LGBTQ. O movimento pela liberdade feminina ainda era incipiente na cidade, mas ela sabia que tinha uma missão a cumprir.

Em sua visão, ter contribuído para que as mulheres se mantivessem “inteiras e livres” foi um ato radical, praticamente de desobediência civil.

Em tempos de necropolítica, o Carnaval é uma revolução. A cada ano, é mais desafiador trabalhar na folia Jul Pagul  

Após o que ela classifica como uma violência misógina sofrida por um ex-sócio, a carnavalesca resolveu criar o Bloco das Perseguidas, em 2012, junto com uma amiga.

“Um dia, surgiram cartazes na rua do Balaio com minha cara como uma macaca e a palavra ‘perseguida’. Naquela época, me abalei muito com essa atitude”, lembra Jul.
Jul Pagul é produtora cultural e antiga proprietária do Balaio Café. No Carnaval do ano passado, ela foi responsável pela Praça dos Prazeres, um dos mais efervescentes espaços de folia do DF, que inclui blocos como o 8 de Março e o das Perseguidas, ambos com recorte militante em prol da causa feminina.

Pagul também está envolvida em outros projetos contra o machismo na festa mais tradicional do país. Entre eles, o Frente Ampla, Mulheres Antifascistas e a campanha Folia com Respeito. “Costumo dizer que sou carnavalesca porque quero que minhas netas saibam que elas podem ser o que bem entenderem”, conclui a produtora.

“Costumo dizer que sou carnavalesca porque quero que minhas netas saibam que elas podem ser o que bem entenderem”, conclui a produtora.

Folia com respeito: Com o objetivo de prevenir a violência contra a mulher no Carnaval, a coordenadora e carnavalesca Letícia Helena está à frente da campanha Folia com Respeito, realizada desde 2016 nos blocos de rua.

Um dos propósitos do projeto é informar aos foliões, por meio de campanhas de conscientização, sobre como reagir quando uma vítima relatar alguma situação de assédio.

Reafirmar nossos espaços e o direito ao nosso corpo é fundamental para sermos respeitadas. Letícia Helena  

A ideia, segundo a organizadora, é simples: empoderar a mulherada e ensinar o público a curtir os festejos respeitando a diversão alheia.

“Defender a integridade física da mulher é uma necessidade diária”, afirma a carnavalesca.
Essa Boquinha Eu Já Beijei Pelo sétimo ano desfilando nas ruas brasilienses, o bloco Essa Boquinha Eu Já Beijei já está entre os maiores do Distrito Federal. No Carnaval de 2019, 40 mil foliões curtiram o evento na capital. 

Produtora cultural e uma das idealizadoras do projeto, Mariana Miranda aponta que o principal objetivo é promover uma festa democrática e promover a diversidade. “Saímos às ruas para protagonizar essa retomada de espaço do Carnaval, de fomento da cultura, de visibilidade às comunidades e de reconhecimento à própria origem da data”, pontua. 

“O Carnaval é um momento oportuno para pautar esses assuntos – não só o machismo e a falta de protagonismo feminino mas também a misoginia, o racismo e a LGBTIfobia –, justamente pela carga histórica e de resistência que ele carrega e porque não há nenhuma outra data em que os brasileiros ocupem os espaços públicos de forma tão significativa e orgânica” (Maria Miranda, produtora cultural e uma das idealizadoras do Boquinha.)
Girl power: idealização e a produção do bloco é feita somente por mulheres O fato de apenas mulheres integrarem a liga é avaliado pelo grupo como um marco e também “uma decisão política e afetiva”. 

“As mulheres continuam sendo invisíveis no meio artístico e sofremos com a ausência de espaços em muitos contextos, com menos convites, sets mais curtos, remunerações inferiores e descrédito do nosso trabalho. A criação de um coletivo feminista, que apoie, fortaleça artistas e produtoras e confronte essa estrutura machista, era uma pauta urgente para nós”, defende. 

Além da pauta feminista e LGBTI, o grupo abraça a conscientização dos foliões para o autocuidado. Conceito que será trabalhado tanto nas redes sociais quanto na apresentação deste ano, marcada para o dia 15 de fevereiro, na Funarte. 

“Temos o manual do folião. Ele ressalta a importância de hidratar-se, ficar perto dos amigos, guardar o celular em local seguro, não vestir fantasias para minimizar ou se apropriar de outras culturas e usar a palavra de ordem que estabelecemos para avisar o bloco sobre qualquer episódio de violência ou assédio, que não serão tolerados”, evidencia. 

Cenário: Se impor em dos feriados mais festejados pelo povo brasileiro é, de fato, um ato de resistência. Embora os crimes de violência física e sexual contra mulheres aconteçam cotidianamente, os relatos aumentam no período do Carnaval. 

Dados do Disque 100 (Disque Direitos Humanos) e do Ligue 180 (Central de Atendimento à Mulher) divulgados em 2019 apontam que os casos de violência sexual crescem até 20% no mês de fevereiro. 

Não à toa, assédio em festas e blocos de rua foi o grande estopim para que coletivos liderados por mulheres passassem a exigir uma mudança significativa por meio de campanhas, projetos e agremiações carnavalescas. 

As fontes ouvidas pelo Metrópoles afirmam que o caminho é longo e de batalha. No que depender de nomes como Jul Pagul, Letícia Helena, Mariana Miranda e outras mulheres que se dedicam ao Carnaval brasiliense, esse é apenas o começo de uma grande revolução. 

“Não é só nesse período de folia. Essa briga por espaço e respeito é fomentada por nós durante o ano inteiro, com várias atividades desenvolvidas e diálogos estabelecidos com o governo. Nos orgulhamos de pautar questões tão importantes como o combate ao machismo, ao racismo, à misoginia e à LGBTfobia”, conclui Mariana.

(*) Por Fernanda Suassuna - Fotos: Amanda Goes - Facebook - Metrópoles

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