Bolsonaro é o primeiro
político da história humana que, em tese, anuncia pra uma plateia inteira de
autoridades e funcionários diversos o desígnio
criminoso."Coincidentemente", protagoniza um governo que ainda não
demonstrou qualquer escândalo de corrupção. A explicação para a
confluência de realidades antagônicas bizarras é a falta de instrumentalização
jurídica de um país que chancelou sua polícia como um poder paralelo. A
anarquia cozinhada nos editorais jornalísticos.
Por Victor Dornas
Em entrevista ao
Fantástico, Sérgio Moro diz que jamais quis prejudicar o governo. Trata-se de
uma óbvia inverdade que poderia ser justificada pelo menos por dois motivos. O
primeiro deles é que Moro não goza mais de prerrogativa de função. Sendo um
homem comum, seria um alvo fácil que deve medir o que diz. O segundo
motivo, na visão deste articulista uma razão que soa mais interessante e
crível, seria de que Moro é uma personalidade em conflito que não mediu o efeito
daquilo que fez, isto é, não protelou tanto sua permanência no cargo de um
governo que agora tenta demolir só para colher provas. Já que não há
provas.
Já Bolsonaro colhe
aquilo que sempre plantou na carreira bravateira. O governo petista sediou
os maiores escândalos de corrupção da história do país, entretanto, em boa
parte, os crimes eram praticados por vários partidos, dentre eles o PP, onde
Bolsonaro muito tempo ficou. Na ocasião, a militância bolsonarista achou que
seria conveniente estimular na polícia federal uma chancela anárquica de
insubordinação e, com isso, achou-se, por exemplo, que um grampo envolvendo um
presidente da república poderia ser divulgado sem a autorização do Supremo. Na
época parecia interessante. Hoje, com o feitiço contra o feiticeiro, deputados
e senadores da base aliada dizem que se arrependem de terem apoiado situações
como essa pois, por óbvio, experimentam agora do mesmo veneno.
A situação da PF lembra
um pouco a questão das milícias pois tudo que há de mais perverso começa com um
discurso pretensamente maravilhoso. Uma polícia que está prendendo bandidos
como nunca se viu nesse país merece respaldo, sem dúvida alguma, porém se não
atentarmos ao fato de que a politização do órgão é nociva e perigosa,
testemunharemos cada vez mais escândalos sem fulcro legal, isto é, como vimos,
numa pandemia, um presidente da república gravado sem cometer nenhum crime que
seja, com intento evidentemente politiqueiro. Dessa vez, a PF nada tinha a ver
com o fato. Mas Celso de Mello só agiu assim por estar imerso numa cultura de
que, acima da lei, há a necessidade de publicizar tudo.
Para avançarmos
democraticamente precisamos refletir nossa própria lei. Precisamos
entender que uma suprema corte não pode ser formada por advogados. A PF deve
estar isenta de politizações, isto é, deve ser criticada quando se insurgir
acima da lei, ainda que no caso pareça cômodo por vermos figuras políticas
sendo postas no xilindró.
O único resultado
possível no desrespeito legal é a crise institucional, isto é, uma polícia ou
promotores que dispensam equivocadamente certas exigências legais para “prender
bandido” sendo metralhados depois por um Supremo formado de advogados
politizados. O retrato institucional pusilânime. Um caos eterno.
Bolsonaro reclamou
quando o PT quis nomear diretores alinhados na PF, sendo que a própria lei
indica que se trata de um cargo de confiança. Agora colhe aquilo que plantou no
populismo ao tentar criminalizar uma conduta legal. A população assimilou que
Bolsonaro quer “interferir” na PF, seja lá o que isso signifique. Há poucos
dias a maioria que esperneia nas redes sociais sequer sabia da existência do
cargo e segue um coro impulsionado pelo coliseu midiático diário.
Que possa haver algum
desígnio criminoso no presidente ou em qualquer agente público, não há dúvida.
Mas ninguém anuncia que cometerá um crime dessa forma, ora bolas! Para uma
plateia repleta de autoridades do alto escalão?
O político criminoso
sempre é pego na surdina, numa ligação grampeada, no dinheiro escondido, no
repasse fraudulento. Não numa gravação a luz do dia já sabida e anunciada. É
ridículo e causa perplexidade que pessoas desgostosas em relação ao governo,
com alguma instrução jurídica, fomentem a questão sem atentar para a destruição
completa do arrimo normativo, isto é, crime não se supõe no futuro, como um
vidente. Se a ideia do presidente era proteger os filhos ou promover
interferências criminosas na PF, tudo que ele conseguiu foi atrair todos os
holofotes do país para questão.
A famigerada lista do
COAF relaciona 27 políticos e 75 assessores, dentre eles Flávio Bolsonaro e
Fabrício Queiroz. Quem encabeça a lista é o deputado Jorge Piooani do MDB, com
28 milhões sendo investigados. Depois disso vem outros nomes do PDT, PSC, DEM e
PP com quantias bastante superiores ao que se investiga no caso do filho do
presidente. Não se ouve falar na investigação de nenhuma dessas pessoas no
noticiário.
Não há como supor um
delito criminoso cometido por um presidente, usando-se o Supremo pra divulgar
vídeo que ameaça questões de segurança nacional. Um vídeo com falas do nosso
Ministro da Economia que expõem as estratégicas do alto escalão do governo. Não
se faz algo assim por mera suposição. Onde vamos parar nessa rixa
polarizada montada pra vender jornais?
O Brasil é uma
democracia que ainda não compreende direito a importância da lei. Autonomia
da polícia federal não significa a politização injustificada de seus agentes. A
politização que aliás, no Brasil, alcança inúmeros órgãos técnicos, tribunais
superiores e, por isso, alcança também nossas casas.
Não aprendemos ainda,
como nação, os limites da lei. E agora desejamos um Estado Policial, isto
é, a essência do fascismo e da rixa.
(*)
Victor Dornas - Colunista do Blog Chiquinho Dornas , fotos ilustração:
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