No final desta semana, as redes sociais se transformaram num
palco de exposição de um youtuber que virou assunto de polícia. Enquanto se
discute se o rapaz é ou não pedófilo, há algo muito mais sério em análise.
Milhares de crianças e jovens debatendo a pedofilia é o primeiro ponto preocupante. A politização da
discussão sexual é o segundo ponto. O problema que parece individualizado no tal influenciador revela o risco imposto diariamente à formação cívica de nossos jovens.
Por Victor Dornas
Ainda durante a campanha eleitoral, Jair Bolsonaro chegou ao Jornal
Nacional com duas apostilas que, segundo ele, apresentavam conteúdo impróprio
para menores e estavam sendo distribuídas pelo governo ao acervo das escolas
públicas. Em virtude do jeito empolado de Bolsonaro, de seu próprio passado onde
o mesmo quase se envolve numa troca de tapas com a colega mulher que o provocou,
a questão foi tratada de um modo inadequado, uma vez que ele personificou politicamente
a figura política de bastião da moralidade.
Assim sendo, atualmente no Brasil tudo que se discute sobre
sexualidade é atraído quase que magneticamente ao circo político onde, de um
lado está Jair Bolsonaro e de outro os grupos organizados em torno de causas
identitárias.
O jovem que foi acusado pelo vazamento de áudios onde o mesmo
supostamente se envolve num crime nojento onde a vítima seria uma menina de 6 anos, não
apenas vem falando durante muitos anos a milhares de crianças como também pertence a
grupos de outros influenciadores digitais que também mesclam de forma
irresponsável conteúdo adulto com o infantil sem qualquer represália da grande mídia. Ao contrário, são admirados, cultuados e legitimados.
E esse grupo de influenciadores que ficam
cada vez mais famosos e acumulam riquezas contabilizando seu rebanho rentável formado,
em parte considerável, por crianças, também resolveram se meter com a discussão
política. Agora, diante do tal vazamento do áudio, eles também falam em
parafilias, como se fossem psiquiatras, e defendem bandeiras, sugerem pautas e
tudo mais.
Após o incidente, usuários fizeram uma busca em vídeos pretéritos
onde o tal influenciador fala sobre pedofilia e nos comentários várias crianças
dizem que ele estava indiretamente “pedindo ajuda”, sendo que o conteúdo vazado
não apenas se trata de pedofilia mas de exposição de menor da forma mais grotesca
que se possa imaginar. Note-se: Crianças internalizaram o discurso cientificista
arcaico de que ciência e moral não se misturam.
A ideia de tratar fenômenos mentais classificados como
parafilias, isto é, condutas sexuais abjetas, como meramente científicas foi um
erro cometido há séculos na formação de ciência, onde muito se filosofava,
inclusive sobre o significado da própria ciência. Acadêmicos deslumbrados com
os louros do iluminismo acreditavam que resolveriam todos os problemas do mundo
e que tudo deveria ser enquadrado na ciência, inclusive o psiquismo.
Logo veio a chamada crise da subjetividade, onde o ser humano
notou que a ciência não era um novo ser divinizado e sim uma ferramenta com
inúmeras imperfeições e metodologia específica voltada justamente para o erro e
não para a pretensão dogmática de domar a própria realidade. Assim,
descobriu-se, por exemplo, aquilo que já se sabia desde sempre.
Parafilias como
a pedofilia andam juntas com desvios morais, isto é, com o caráter que, embora
não seja cientificamente abordado, não é menos importante na confecção da
realidade. Pergunta-se: Por qual motivo crianças estão debatendo sobre assuntos
psiquiátricos com ideias tão arcaicas que vitimizam um pedófilo? De onde vem
essa deturpação?
Não há dúvida que o aparelhamento ideológico persiste nos
meios acadêmicos e, com isso, nossos jovens foram moldados por conceitos já
abandonados pela civilização moderna. Erros, fracassos, bem intencionados ou
não inicialmente, mas que nunca passaram disso: Fracassos.
O saudoso Millôr dizia que “quando uma ideologia fica velinha
ela vem morar no Brasil.” É isso mesmo. Não há razão, contudo, para personificar a
discussão sobre os limites de temas sexuais impostos a jovens ou crianças na figura
excêntrica de Jair Bolsonaro. Não se trata dele e sim de uma cultura de miséria
intelectual que macula o desenvolvimento sadio de jovens que passam a
incorporar um psiquismo doentio onde tudo na vida giraria em torno de causas
identitárias.
Não há nessas redes uma distinção etária e o acesso à baixaria é
irrestrito, por isso vemos nossos jovens dizendo essas coisas. Não se trata
apenas de falatório e também não é uma questão de censura e sim da obviedade de
que criança ou pré-adolescente não reúne maturação intelectual suficiente para
discutir cientificismo envolvendo psiquiatria, isto é se um coitadinho que não
encontra tratamento para a sua pedofilia tem ou não desvio de caráter.
O pior de tudo: As plataformas se isentam de qualquer
responsabilidade. São apenas plataformas sedentas por movimentar a dinheirama
digital e o culto à personalidades que na maior parte das vezes não exibem
nenhum talento a não ser o de produzir discussões inadequadas ao público
infantil, sem se aterem aos efeitos disso tudo.
(*) Victor Dornas - Colunista do Blog Chiquinho Dornas , fotos ilustração: Blog-Google..
(*) Victor Dornas - Colunista do Blog Chiquinho Dornas , fotos ilustração: Blog-Google..