Por Victor Dornas
A indicação de Kassio
Nunes ao Supremo selou a paz entre os poderes, de modo que Bolsonaro agora é
amigo íntimo de Dias Toffoli. Os dois se encontraram na casa do ministro para
tomar uma cervejinha e assistir futebol. “Ele se sente bem aqui”, disse o
preposto do Lula. O presidente da OAB que até ontem trocava tiros virtuais com
o presidente, está em paz. A maior parte dos ministros, exceto Fux (talvez por ser
o único juiz de piso daquele tribunal) está feliz. E o congresso?
Tirando a
bancada do PT e seus satélites que só se comprazem com as pautas que ostentem
bandeiras vermelhas e o partido Novo que reside na ilusão de que o Brasil é um
país de gente decente, todos estão felizes também. O decano Celso de Mello, no
entanto, não está nada feliz. Está furioso na verdade e, dessa vez, com razão.
O legislador quando redige
um texto legal procura prever distorções, porém quando o índice de pilantragem
atinge o pico, nenhuma lei funciona, por mais bem feita que tenha sido esculpida
em seu escopo. A Constituição Federal brasileira, entretanto, é um emaranhado
de absurdos e assim condiciona todo o resto.
Quando se outorga ao presidente a
indicação de um ministro para a suprema corte, pressupõe-se que, diante de uma
situação flagrantemente constrangedora, ou seja, do próprio presidente ser julgado na corte, com prerrogativa de foro, aliás, o ministro indicado se declarará
suspeito, incapaz de julgar por amizade com o réu. Num país de pilantras,
todavia, não adianta apenas "supor".
Seria necessária a previsão expressa e adequada.
O resultado da lacuna em questão é que
o pilantra do Lula aparelhou o Supremo de modo que um sujeito como Dias
Toffoli, agora amigo íntimo de Bolsonaro, que passou a vida sendo advogado do
PT pudesse julgar as causas envolvendo o partido em questão , ou seja, seus
confrades. Ele jamais se declarou suspeito. Julgou, inclusive, o próprio
patrão, o salvando de apuros como aquele último que motivou sua soltura por
manobras garantistas da lei processual penal.
O caso Bolsonaro x Kassio Nunes é mais ou menos do mesmo tipo, porém com alguns pontos peculiares. O ministro indicado pelo presidente, no caso o tal Kassio, “herdará” os processos do decano. O filho do presidente e senador Flávio Bolsonaro já impetrou nove recursos ao Supremo para protelar o rito processual da rachadinha da Alerj, que segundo as trezentas páginas de relatório do Ministério Público do Rio temporariamente suspenso, vai além disso e envolve peculato e formação de quadrilha. O primogênito do presidente, orientado por advogados especializados em estuprar lacunas legais, não estava protelando por acaso.
A ideia era esperar que Bolsonaro pudesse escolher um substituto de Celso de Mello, relator de uma décima manobra do filho do presidente que exige prerrogativa de foro para fugir do juiz de piso carioca e ser protegido pela corte dos advogados de políticos, o panteão do STF. E assim foi feito pois, como já se sabe, Kassio é amigo da prole Bolsonaro há algum tempo e foi levado ao presidente com mais intimidade há muitos meses pelo político agregado da família Hélio Lopes.
Ainda há a
possibilidade de Kassio, diferentemente de Dias Toffoli, se mostrar uma pessoa
mais decente e declarar a sua suspeição, porém é possível que ele não faça isso
e, assim, Jair Bolsonaro terá escolhido o relator do caso que julga o próprio
filho, este que foge de um processo de 300 páginas do MP do Rio.
O legislador talvez
não imaginasse tal disparate. Ora bolas, ninguém pode
escolher o próprio juiz!
Quando se precisa dizer
o óbvio é sinal de falência terminal de uma sociedade. O Brasil hoje é dividido
em duas massas de ignorantes, fanáticos pelo PT e também por Bolsonaro. Nenhum
deles vê qualquer problema nisso, pois estão hipnotizados pela própria burrice.
Inúmeros experimentos de psicologia feitos há décadas demonstram como o ser
humano desprovido de racionalidade tende ao comportamento bovino, ainda que
isso envolva muitos tons de crueldade.
Um experimento bastante famoso é o do eletrochoque de Milgram em que uma pessoa
aparentemente normal tortura pacientes alegando cumprir ordens. Recomendo uma lida
sobre isso para aqueles que quiserem entender o fenômeno populista brasileiro,
com espeque ainda no caudilhismo sul-americano, tanto de petistas como de
bolsonaristas. Dá no mesmo. Clinicamente denominado de déficit de programação
cognitiva. Tentar dissuadi-los é perda de tempo, pois são soldados em missão,
numa causa impossível, certamente interminável. Leva-se a rixa à cova.
Enfim, desconfio que a
fúria do decano talvez tenha a ver com essa usurpação jurídica. De mais a mais, Gilmar
Mendes suspende a ação da lava jato que investigava 150 milhões desviados na
Fecomercio, Sesc e Senac. O alvos eram escritórios de grandes advogados como o
tal Zanin que defendeu Lula na ação do Triplex e também Wassef que abrigou o
miliciano Queiroz, amigo íntimo da família Bolsonaro que foi grampeado negociando
cargos no congresso.
Querido leitor, o abraço de Bolsonaro e o Toffoli é
simbólico.
Estão quase todos em
paz. Muita paz! O país agora respira com tranquilidade já que há tanta paz
institucional. Uma pergunta ainda intriga a alma deste insignificante
articulista, neste reino de titãs devotados à paz, do maravilhoso Bolsonaro, o
mito. A dúvida é a seguinte:
Paulo Guedes também
está em paz? Talvez sim...