O brasileiro acompanhou
com afinco as lambanças das eleições americanas e um discurso muito comum entoado
nos perfis simpáticos ao candidato republicano Trump era de que a sua eleição
livraria o mundo de um “domínio chinês”. O primeiro incômodo trazido nesse tipo
de argumentação é que, convenientemente, este inimigo do governo protecionista
Trumpista é justamente o único país no mundo capaz de lhe oferecer alguma
oposição, ou concorrência.
Nos ditos movimentos de
mercado, sabe-se que há uma lei universal e imutável: Todos que adquirem o
monopólio não admitem concorrência. É uma verdade extrapolada do egoísmo humano
que se materializa no sucesso de um empreendimento. Nenhum monopólio aceita
concorrência. No caso, ironicamente, os Estados Unidos foram superados pelo PIB
chinês.
Há quanto tempo na
geopolítica a maior economia do mundo não é ameaçada?
Por isso, ainda que a
China tenha de fato questões controvertidas que não coadunam com os nossos
valores ocidentais, faz-se necessário pontuar que toda crítica motivada por
americanos deve ser encarada dessa forma, antes de tudo, ou seja, da fala de
duas partes que compõe um litígio, ou o maior dos litígios da guerra econômica
na geopolítica contemporânea.
Não se deve acreditar
em tudo que é vendido neste fluxo de informações, uma vez que estamos muito
mais antenados com as versões americanas das coisas do que com as orientais ou
asiáticas. A maior parte dos “achismos”, ou modelos espectrais de ideologias
políticas ideais (liberalismo, libertarianismo, social democracia) tudo isso é
cria do próprio mundo ocidental.
Da mesma forma que a
China sustenta setores cruciais da economia americana, como, por exemplo, o
fornecimento de metais raros para a fabricação de tecnologia, nós aqui temos a
China como o nosso principal cliente comprador de matéria-prima e outros tipos
de produtos exportados.
Aliás, outro discurso infeliz da manada Trumpista é que
a eleição do republicano seria benévola ao Brasil, quando em verdade o
protecionismo, nesses quatro anos, feriu ao menos uma dúvida de países e nós
inclusos nisso. Isto é, não foi a China que sobretaxou nosso alumínio e sim os
Estados Unidos. Não foi a China que sobretaxou o nosso aço e sim os Estados
Unidos. Não foi a China que nos proibiu de vender aviões militares e sim os
Estados Unidos.
A fragilização de uma
economia “barreirista” e hostil, caso se concretize mesmo no governo Biden,
provocará, de imediato, uma queda no dólar. Sendo o real, em parte, uma moeda
lastreada no dólar isso talvez amenize um pouco o tombo do nosso recorde de desvalorização
monetária, embora em termos de economia real, nada disso resolverá nossos
problemas.
Outro fato controverso
na lida da matilha Trumpista é que o republicano é vendido como um inimigo dos
chineses, quando na prática, em seu governo, a China nunca cresceu tanto, uma
vez que Trump fechou-se como um caramujo, preocupado com suas posses, contudo
cessou o ritmo de sua própria economia em termos de exportação. Muito fechado
em si mesmo, criou para a China um cenário ideal. Nada disso, entretanto, foi
determinante nas eleições, uma vez que palavras como “lockdown” é que
influenciaram mais os votos dos americanos.
A política imperialista
americana, aquela que se intromete na soberania de outros países, sempre se
defendeu argumentando que essa polícia global tinha por escopo maior o
desenvolvimento e a modernização de países que muitas vezes massacram seus
povos com a barbárie fundamentalista. Pois bem, a China, nos anos 90,
experimentou o chamado socialismo de mercado e gostou. Modernizou-se e, num
ritmo cada vez mais acelerado está limpando a sua sujeira. A ideia não era
essa? Depende, pois a China foi além e está incomodando.
Não era para crescer
tanto assim, imagina o burocrata americano...
O Brasil, amargando
números de desemprego cada vez mais graves, um local inóspito a ambientes de
negócio, uma ignorância ímpar nas questões da quarta revolução industrial, a
tecnologia da informação, se acha no direito de tecer críticas sobre a China.
Por mais atraente que seja o discurso aos incautos, a prática, no entanto, nos
coloca na situação de um dos países que mais decaiu em muitos aspectos que
acusamos o governo chinês de falhar.
Na questão do 5G, por exemplo, a despeito da interferência de figuras americanas no nosso mercado, a China exige apenas uma coisa: Ela quer participar das licitações. Isso não é uma questão determinante para a economia chinesa, com o maior PIB mundial, mas a contratação de um serviço como este, por razões ideológicas, atestaria que o Brasil de fato não entendeu nada do que está acontecendo no mundo. Um país perdido na fantasia e no caudilhismo.
Na geopolítica,
pensa-se antes de tudo no próprio povo. Um governo ideologizado
e subserviente não terá nenhuma chance de figurar num cenário competitivo.