A estudante do 5º semestre de medicina da
Universidade de Brasília (UnB) Ingrid Ribeiro Soares da Mata, 28 anos, foi
convidada, em abril e em junho deste ano, para representar a universidade em
dois eventos internacionais de pediatria, nos Estados Unidos e em Dubai
(Emirados Árabes). O convite veio após ela publicar o artigo As implicações da
pandemia da covid-19 na saúde mental e no comportamento das crianças, na
revista Residência Pediátrica, de versão eletrônica com veiculação
quadrimestral, feita pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Apesar do
reconhecimento científico, ela não conseguiu apoio financeiro suficiente, o que
a fez criar uma rifa para garantir a presença, pelo menos, no evento nos EUA.
“Fiz a primeira rifa, de um tablet, no valor de R$
10, e consegui arrecadar R$ 6,3 mil. A viagem para São Francisco inclui
hospedagem, alimentação, visto americano e parte dos custos do congresso, que
também envolve o coffee break e o almoço. Até o momento, consegui pagar o visto
e a taxa do congresso, que vai me exigir um total de cerca de R$ 13 mil para
participar pessoalmente. Pedi auxílio da UnB, com edital aberto, mas só dão até
R$ 2 mil. Se eu não conseguir ir, vou tentar participar remotamente”, diz. “Mas
se eu conseguir bater a minha meta para São Francisco, vou tentar ir para
Dubai, em que a passagem está em torno de R$ 5 mil e a hospedagem no hotel em
torno de R$ 3 mil, fora os custos com o evento”, explica Ingrid.
Em 6 de abril, a estudante recebeu um e-mail do
Congresso Mundial de Pediatria para ser oradora honorária do encontro, marcado
para os dias 11 a 13 de outubro de 2021, em São Francisco, EUA. Em 25 de junho,
ela recebeu o convite para se apresentar na 4ª Conferência de Pediatria e Pediatria
Clínica, em Dubai.
Influência da família: Ingrid conta que
procurou a professora de pediatria da UnB Marilúcia Picanço para fazer
trabalhos de pesquisa sobre o tema após a morte da avó, em abril de 2018.
“Minha avó, que me criou desde pequena, ia comigo ao HUB desde os meus dois
anos até os 17 para fazer acompanhamento com a nefrologista pediatra, porque eu
tenho problema renal. Quando eu tinha cinco anos, falei para a minha avó que
voltaria àquele corredor, um dia, como médica pediatra. Em 2019, a minha avó
faleceu e eu tive luto tardio. Entre o início e final de abril, fiquei em luto
e com uma depressão forte pela morte da minha avó. Me tranquei no quarto por
duas semanas, e perguntei à professora Marilúcia, que dava aula na disciplina
de Metodologia Pesquisa em Perinatal e Crescimento Neurodesenvolvimento 1 e 2,
se eu podia entrar na turma. Foi o que me fez levantar da cama”, relata a
estudante.
A professora conta como foi o trabalho inicial da
estudante. “Os psiquiatras falam até em síndrome da gaiola, de crianças que se
omitem a voltar a ter o contato com outros colegas e até nem conseguem brincar.
A ansiedade, transtorno de ansiedade, está associado ao medo, vendo as pessoas
morrerem, principalmente os parentes. Isso repercute no emocional e no
desenvolvimento dessas crianças. A Ingrid fez um compilado sobre essa questão e
o grupo analisou”, declara Marilúcia Picanço.
Ingrid cita outra influência para elaborar o
artigo: a irmã mais nova, Ana Maria, de 10 anos. A estudante de medicina
recorda que quando começou a pandemia no DF, em 2020, a menina, com 9 anos na
época, começou a se isolar e a ficar introvertida. “O tempo todo ela ficava com
álcool em gel na mão e com muito medo porque, no início de junho, a minha mãe e
a minha outra irmã, de 24 anos, pegaram a covid-19. Eu me isolei na casa das
minhas primas. Todos nós fizemos o teste de RT-PCR, e só o da minha irmã pequena
ficou com o resultado inconclusivo. Ela ficou trancada dentro do meu quarto, e
não tinha contato com ninguém. Com esse isolamento, eu ficava ligando para
saber como ela estava”, relembra.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria
(SBP), uma criança pode ficar de duas a três horas na frente de uma tela e em
jogos de videogame, limite que Ana Maria extrapolava. “Na escola da Ana,
estavam sendo três aulas on-line por semana durante a tarde. A minha irmã
Gabriela estava terminando a faculdade de direito, o meu pai estava cheio de
reuniões no trabalho dele, e a minha mãe também. Então, depois que a Ana Maria
terminava a aula, continuava em jogos, e não conseguia interagir com a família.
Aí observei todo esse processo, que me fez criar o artigo”, acrescenta a
estudante.
Mãe de Ingrid, a conselheira tutelar Ana Maria da
Mata Soares, 48, confessa as dificuldades que teve de lidar com os momentos
críticos de ansiedade e preocupações da filha pequena com a pandemia da
covid-19. “Educá-la está sendo muito complicado até hoje, porque ainda é muito
novo esse momento na mente dela, principalmente no início da pandemia, quando
ela ficou muito ansiosa e nervosa. A Aninha me perguntava se eu passava álcool
em gel quando estava na rua, se ninguém na nossa casa morreria. Então fomos
trabalhando o diálogo com ela aos poucos, explicando que não podíamos entrar em
pânico”, lembra.
Para tentar suavizar os efeitos da pandemia, a mãe
reuniu a família para interagir durante a rotina diária. “Antes estava muito na
base do ‘não e acabou’, mas como vi que ela estava muito ansiosa, a ponto de
dormir até tarde, compramos jogos de tabuleiro para jogar em família no fim de
semana. Outra coisa que tem funcionado são os filmes que também assistimos
todos juntos. Graças a Deus temos esse recurso, mas muitas famílias brasileiras
com crianças em casa não têm internet para uma aula on-line, ou a mãe chega em
casa cansada e mal tem tempo de interagir com os filhos”, analisa a conselheira
tutelar.
Empecilhos: Até 2019, a Fundação de Apoio à
Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF) contava com editais de apoio à
participação em eventos científicos, um caminho que Ingrid podia solicitar
apoio. “Em 2020, a FAP-DF não publicou editais dessa natureza em virtude do
cenário mundial de pandemia de covid-19, situação que proibiu viagens nacionais
e internacionais. Agora, a Fundação trabalha na elaboração de novos editais
para o atendimento dessa demanda. A equipe técnica está em fase de prospecção
dessas iniciativas, mas ainda não há previsão de lançamento”, diz a FAP, em
nota.
O órgão acrescenta que, atualmente, há editais
abertos, como o Edital de Demanda Espontânea 4/2021, disponível
em >>> (http://www.fap.df.gov.br./) Porém, “esse edital contempla propostas de
pesquisa científica, tecnológica e de inovação, mas o público-alvo é
pesquisadores doutores vinculados às instituições públicas ou privadas de
ensino. Não sou doutora”, justifica Ingrid.
Como participar da rifa: Pix:
ingriddamata@gmail.com - Conta do Nubank: Agência: 0001 e
conta-corrente: 20610830-7 - Conta do Banco do Brasil - Agência:
1239-4 e conta-corrente: 68995-5 - Celular (61) 9 8494-9475.