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ENTREVISTA: Otávio Nóbrega, professor de imunologia, UnB

Contra covid-19, qualquer vacina é suficiente. Durante o programa CB.Saúde, especialista alertou que aplicação de doses em excesso pode comprometer defesas do organismo

 

Em entrevista ao CB.Saúde — parceria do Correio com a TV Brasília —, Otávio Nóbrega, professor de imunologia na Universidade de Brasília (UnB), comentou alguns dos efeitos das vacinas contra a covid-19 no organismo e ressaltou a importância da imunização coletiva para redução dos casos e das mortes provocadas pela doença. No programa, transmitido ontem, o diretor científico da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia no DF alertou que a aplicação de doses em excesso pode gerar “suicídio” das células de defesa do organismo, bem como prejudicar o atendimento do restante da população. Confira os principais trechos da conversa com a jornalista Carmen Souza:

 

O que a variante Delta — identificada primeiro na Índia — representa para o Brasil? Qualquer nova variante é preocupante. A proliferação delas pode afetar a eficácia das vacinas existentes. Para nossa satisfação, todas as vacinas hoje disponíveis são eficazes contra a Delta. Existe um caso, porém, da variante Beta, prevalente na África do Sul, em que há conhecimento de que a vacina Oxford/AstraZeneca não é tão eficaz contra ela.

 

O governo de São Paulo anunciou o adiantamento da segunda dose. Isso é possível? A Inglaterra também decidiu que anteciparia a segunda dose, e essa é uma medida que o governo de São Paulo busca replicar, na tentativa de antecipar o grau máximo (de proteção) que se atinge com o imunizante. Ainda não se sabe se é possível (ter o resultado esperado). Mas, se a doença não for controlada, nada impede que outra variante surja. 

 

Pensando no fato de que não há vacina disponível para todo mundo, antecipar a segunda dose é uma estratégia interessante? No caso das variantes existentes, principalmente a Gama — identificada primeiro no Brasil —, estudos clínicos mostram que, no caso da CoronaVac, aguardar 21 dias para a segunda dose, e da Oxford/AstraZeneca, esperar três meses (para aplicação do reforço) não é uma questão simples de atraso, não é uma questão de logística de distribuição, é por eficácia mesmo. 

 

Outra estratégia, essa adotada no Rio de Janeiro, é combinar doses. Qual a opinião do senhor nesse sentido? Isso aconteceu por uma situação específica, com a vacina da AstraZeneca, por uma questão de cautela. Há suspeitas de trombose em gestantes relacionada a esse imunizante. Mas essa doença é muito comum e pode ter ocorrido por outro fator, não pela vacina. Ainda não há uma relação de causalidade estabelecida. Aconteceu em uma pessoa de um grupo de 100 mil imunizados. Se formos analisar, na população, a trombose acontece em uma a cada 10 mil pessoas. Ou seja, (o registro) foi até mais raro entre os vacinados. Como aconteceram alguns casos com gestantes, o Programa Nacional de Imunização optou por não aplicar o reforço dessa vacina para as grávidas que haviam sido imunizadas com a primeira (dose). Nesse caso, possibilitou-se a troca. A recomendação, porém, é de não haver intercambialidade. Começou com uma vacina? Tome a segunda dose da mesma (marca) se não estiver grávida.

 

Um homem de Minas Gerais tomou quatro doses de três fórmulas diferentes. Qual é o risco desse tipo de comportamento? O risco é provocar o efeito contrário. Doses elevadas e repetitivas, em vez de estimularem os nossos linfócitos (células de defesa do organismo), podem, na verdade, determinar que esses linfócitos morram, ou seja, uma morte celular programada. Eles ficam hiperestimulados pela vacina e, em vez de terem vida longa, suicidam-se. E, não permanecendo vivos, deixam o indivíduo desprotegido, mais vulnerável.

 

Qual a consequência para quem escolhe qual vacina tomar? A consequência, em termos individuais, é de a pessoa permanecer desprotegida por um tempo maior. Qualquer vacina é suficiente para proteger do vírus. E, em termos coletivos, essa pessoa também está expondo outras quando ocupa uma vaga. Principalmente aqui no Distrito Federal, onde a imunização é feita com base em agendamento. 

 

Podem surgir outras formas de imunização, como a vacina por inalação, por exemplo? A vacina contra a covid-19 deverá, com o tempo, integrar o Programa Nacional de Imunização de forma continuada, passando a fazer parte de nossas políticas de vacinação periódicas e, talvez, ser uma dose sazonal, como aquela contra a gripe. Há desenhos para tentar integrá-la com essa contra a gripe, em uma vacina única, administrada com uma só injeção, para maximizar a proteção das pessoas. Da mesma forma que já se estuda a combinação de diferentes estratégias, pois sabe-se que a tecnologia usada nas da AstraZeneca e da Janssen, que é de um vetor viral não replicante, é diferente daquela usada na CoronaVac, de vírus inativado. A princípio, vejo bastante benefício na tentativa de fazerem estudos clínicos que conjuguem as duas estratégias. Dois mecanismos diferentes, agindo conjuntamente no organismo e (resultando) da mesma aplicação para conferir a imunidade contra a doença. É possível.


Mariane Rodrigues – Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press – Correio Braziliense



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