Jack Corrêa tem o dom de entreter
e seduzir. Com essas características e um jeito bem mineiro, o lobista e
escritor chegou a Brasília em 1983, vindo de Belo Horizonte (MG), e se tornou
um dos mais experientes e requisitados profissionais das hoje chamadas “relações
institucionais” de Brasília. Para contar as histórias que viveu no trabalho de
percorrer os corredores e gabinetes do poder, Corrêa lançou um livro com 44
casos em que aparecem personagens como Pelé, Maria Bethânia, Roberto Carlos e
Chico Xavier, além de personalidades do mundo político.
Ao Correio, Jack Corrêa contou
sobre os desafios da profissão, inspirações e se declarou lobista com orgulho.
Lobby Stories certamente desperta atenção dos que apreciam a política, dos
profissionais das relações governamentais, dos estudiosos e dos curiosos que
desejam entender melhor as antessalas dos gabinetes. Afinal, pelas próprias
palavras do escritor, Brasília respira lobby. Confira, a seguir, os principais
trechos da entrevista.
Como surgiu a ideia para o
Lobby Stories? Cheguei
muito novo, aos 24 anos, ao cargo de diretor de cerimonial do Governo de Minas
Gerais. O Francelino Pereira, que era o governador, quando me chamou, pensei
que estava trabalhando com alguém que poderia concorrer à Presidência da República.
Aquilo me deu muita responsabilidade. Quando eu saí de lá, vim para Brasília
abrir o escritório da Fiat para ser o representante da montadora aqui. Eu
sempre tive o hábito de gravar as coisas que acontecem comigo, coloco na agenda
ou em um papelzinho. Fui juntando todo esse material. Tinha casos que
aconteceram na época do cerimonial e tinha vontade de contar sobre isso.
Veio outra obra antes
dessa, o Sem Cerimônia, certo? Sim. Não tinha o objetivo de vender e foi escolhido pelas escolas de
relações públicas de várias universidades do país. Aquilo me realizou muito.
Depois, fiz uma outra edição, de 2000, e não republiquei.
Mesmo aposentado continua
fazendo lobby? Em 2016,
me aposentei na Coca-Cola. Pensei em ter um escritório para sentar, escrever e
receber amigos. Nunca imaginei que teria clientes como tenho hoje. Por isso,
continuei no lobby. Já estava na hora de olhar para o retrovisor e pensar no
que eu fiz do dia 3 de setembro de 1983, quando cheguei de Minas, com passagem
só de vinda para Brasília.
Como as histórias foram
escolhidas? São 44 casos de amor por uma
profissão. Peguei os casos e fui colocando de modo aleatório. Achei que ficou
uma receita muito legal e a ideia é mostrar o quanto Lobby Stories tem para
ensinar o que se fazia de lobby no Brasil até recentemente.
Quais são os desafios da profissão
hoje? A OCDE (Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico) proibiu uma série de atividades. Por
exemplo: é proibido dar passagem, hotel, etc. A pessoa que tem que trabalhar
para fazer relações com o governo, conta com pouca oportunidade de criar
relacionamento 1 centímetro da linha para fora do oficial. Os casos do livro
são do tempo em que isso não existia. Conto como era para a pessoa entender e
pensar: “e agora?” Agora, com internet, com as proibições das doações
eleitorais, com as proibições dos comportamentos éticos da OCDE, você fica em
uma situação bem restrita de criar mecanismos de aproximação e relacionamento.
Nunca foi tão difícil fazer
lobby… Sim, nunca foi tão difícil.
Brasília respira lobby. Você tem a central econômica do país que é São Paulo,
mas tem a central de decisão, que é Brasília. Com uma caneta, se derruba o
planejamento de um mundo de empresas. Só com uma assinatura! Por mais poderoso
que São Paulo seja, quando se tem que definir o futuro do planejamento da sua
empresa, o lugar é aqui.
O senhor se incomoda em ser
chamado de lobista? Você está em frente a uma obra única e primeira em que um lobista fala
‘eu sou lobista’. Nas dedicatórias do livro, coloquei o “lobby do bem” porque
estamos falando de coisas sérias, regulares e éticas — a defesa legítima de
interesse. Eu, definitivamente, não me incomodo. A imprensa nunca diferenciou
um lobista, que é uma pessoa que trabalha e leva uma ação da sua empresa para a
formação das políticas públicas no Congresso ou Executivo, dos caras que são
operadores de propinas.
Existe um projeto de lei, na
Câmara dos Deputados, que trata da regulamentação do lobby. O senhor tem
acompanhado? É o Projeto 1.202, de autoria do
Carlos Zarattini (PT-SP). Há um ano, ouvi o deputado Rodrigo Maia (sem
partido-RJ) falar que estava na pauta. De lá para cá, nunca apareceu nada.
Existe uma força que não deixa regulamentar a profissão de lobista. No dia que
regulamentar, você pode falar de boca cheia que é lobista e apresentar um
número de registro. Aí a transparência vai ficar absolutamente concreta.
Qual é a sua avaliação sobre
o país, atualmente, com a instabilidade das relações institucionais? Qualquer pessoa da nossa profissão tem que ser,
antes de tudo, apartidário. O que interessa é o resultado. O resultado com o
meio ambiente não me deixa feliz; com a indústria, com a bolsa, não me deixam
feliz. Não posso negar uma realidade que estou vendo. Então, isso já responde a
pergunta.