Uma fotografia é ponto de
intersecção de histórias de duas famílias distintas. A imagem mostra um ônibus
chegando para trazer trabalhadores para construção da nova capital. O
fotógrafo, Jankiel Gonczarowska, um apaixonado por Brasília, publicou em uma
matéria da revista Manchete em 1957. Contudo, ele não imaginava que também
estava mostrando na foto o início da trajetória de um pioneiro.
Gonczarowska, foi
um importante fotojornalista que atuou em alguns dos principais jornais do
país. Ele tem um extenso trabalho de cobertura política, tendo acompanhado
diversos presidentes. A partir de 1956, acompanhou de perto a campanha e a
eleição de Juscelino Kubitschek. No ano seguinte, foi designado para fotografar
o início das obras de Brasília. Na época, morando no Rio de Janeiro, ficou em
uma ponte-aérea entre a antiga e a nova capital. Em uma dessas viagens,
registrou um ônibus chegando com trabalhadores.
Essa foto ficou muito famosa, foi pendurada em museus como parte da história de Brasília e esteve em tamanho grande nas paredes do Bar Brasília e Bar da Brahma. Porém é mais importante ainda para uma pessoa, o homem que pode ser visto de pé na porta do ônibus. Sindoval Eneias, na época cobrador da Expresso Planalto e morador de Anápolis, largou tudo para participar da epopeia brasileira. Ao se ver na foto da revista, ficou muito orgulhoso e carregou essa história durante toda vida, se tornando uma imagem muito importante para toda família dele.
A fotografia tem tanta história
que, em 2018, ficou marcada para sempre na pele de Lidi. A cantora tatuou o
ônibus como homenagem ao pai. “Eu queria dar um presente a ele, e estava sem
ideia. Resolvi tatuar a foto. Ele ficou super emocionado! A filha dele carregando
a história dele no ombro”, conta.
No entanto, Lidi e Sindoval não
sabiam quem era o autor da foto. Até que, um dia, o artista plástico Marcelo
Jorge postou nas redes sociais a imagem. Após ser indagado por Lidi, contou que
era uma fotografia de Jankiel Gonczarowska e que estaria no livro Brasil - duas
décadas, duas capitais, da filha do fotógrafo Sandra Gonczarowska Mussi, que
será lançado dia 11 de novembro.
Marcelo colocou as duas em
contato. Sandra mora no Canadá desde os anos 1990, mas foi criada em Brasília e
resolveu que lançaria o livro na cidade e, junto com o lançamento, aproveitou
para marcar um encontro com Lidi e Sindoval. “Eu acho que por essa meu pai não
esperava”, brinca Sandra sobre esse encontro inusitado “Fico muito feliz em saber
que a fotografia é tão importante para a família dela, tão importante que ela
tatuou no corpo próprio corpo”, pontua a filha do fotógrafo falecido em 1988.
“Meu pai é um candango anônimo,
apenas mais um que entregou muito suor à construção de Brasília. Muitos veem
esta foto e nem têm ideia que o menino mineiro na porta hoje tem 80 anos, teve
três filhos, dois netos, e nunca mais saiu da cidade”, destaca Lidi. “Eu me
sinto muito feliz, pois , com o lançamento do livro, finalmente vou poder dar
ao meu pai uma cópia da foto em boa resolução”, brinca a filha do candango.
Coletânea Inédita: O trabalho
apresenta registro fotojornalístico e pessoal de Jankiel Gonczarowska durante a
mudança da capital do Rio de Janeiro para Brasília, com fotos da construção da
nova capital e desse grande processo de transição na história do Brasil. A
primeira parte da obra foca nas imagens da década de 1950 no Rio de Janeiro,
enquanto a segunda é da década de 1960 em Brasília. O livro é uma coletânea
inédita de fotos tiradas por Jankiel e conta com 171 imagens do acervo do
fotógrafo.
Porém a ideia do livro partiu de
um agrado para a família. Sandra fez uma edição dos trabalhos do pai para
presentear os irmãos. Jankiel teve 13 filhos, porém como morreu no final dos
anos 1980, não tendo conhecido boa parte dos netos e bisnetos. O livro era,
portanto, para mostrar um pouco mais das imagens feitas por Jankiel para a
própria família. Contudo, um dono de editora teve contato com o livro e afirmou
que a obra deveria estar nas livrarias.
O livro Brasil- duas décadas, duas
capitais terá lançamento 11 de novembro. “Eu vi a importância e orgulho que eu
tenho do meu pai, foi lá que eu vi o sentido que meu pai dava para as
reportagens”, conta Sandra.
“Estou muito feliz de poder
compartilhar não só esse livro, mas a memória e o olhar lindo que ele tinha
pelo Rio de Janeiro, por Brasília, pela fotografia e pela arte”, afirma Sandra.
Ela aponta que é importante que mais pessoas tenham acesso ao material. “Ele
tinha um olhar humano para todas as pessoas que ele fotografava, desde os mais
simples nas favelas, até celebridades, grandes políticos, presidentes”,
analisa.