Duas podem ser as
hipóteses que explicariam o favoritismo do ex-presidente Lula em muitos
institutos de pesquisa de opinião. Há nesse caso um fato curioso a ser
observado, quando se verifica que o ex-presidente petista, por todos os
acontecimentos que redundaram em sua prisão e também na de seus mais próximos
colaboradores, transformaram Lula numa espécie de candidato invisível, que só é
visto por iniciados da sua seita, em ambientes especiais e fechados e pelas
redes virtuais da internet.
Tem-se aqui um autêntico candidato fantasma à brasileira, fabricado, sob medida, pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, através de um polêmico processo, antijurídico, que trouxe consigo até um neologismo estranho: “descondenação”, ainda não tratado nos dicionários tradicionais. Não por outra, as eleições de 2022 vão se configurando num pleito inusitado, digno das ficções do tipo surrealistas. As duas hipóteses capazes de explicar o favoritismo do ex-presidente são os já desacreditados institutos de pesquisa, por suas metodologias acrobáticas, e um caráter que considera a corrupção e roubo dos recursos públicos atos sem grandes importâncias para a vida política e para o próprio sentido de cidadania.
A acreditar nessa hipótese, estamos num caminho sem
volta, rumo ao brejo. A outra explicação para a vantagem nas pesquisas do
ex-presidente e ex-presidiário é a de que o esquecimento dos fatos pretéritos,
numa espécie de alzheimer político severo e coletivo, afeta a maioria dos
eleitores neste país. Vale lembrar que não é o que se vê nas ruas. Mas, em
qualquer das duas hipóteses, estamos no sal, desidratados de saúde e de
caráter.
O simples fato de os brasileiros, como também
atestam pesquisas recentes, classificarem o tema “combate à corrupção” como um
projeto para o país menos importante do que fatores como a inflação e o
desemprego demonstra que, a má formação ou a ausência total desta faz de nossos
cidadãos presas fáceis para a engabelação desses profissionais da política.
O que se poderia esperar de um cidadão minimamente atento
é que negasse perdão a gestor público ladrão. A explicação para o favoritismo
nas próximas eleições de pessoas que dilapidaram os cofres públicos e
empurraram o Brasil para a mais profunda crise de todos os tempos não pode ser
debitada a sentenças do tipo que nos classificam como um país sem seriedade.
Tampouco pode ter sua explicação no conluio estabelecido, de forma sorrateira,
entre os eleitores e os eleitos.
Há aqui uma explicação que parece fugir aos
alfarrábios de psicologia ou mesmo à hipótese do inconsciente coletivo, tudo
isso com pitadas e propensões à autoflagelação e até à parafilia. Há, caso se
confirmem as previsões dos institutos de pesquisa, um fenômeno, de ordem
psíquica, a ser estudado no comportamento dos eleitores ou dos que publicam as
pesquisas. Basta coletar as previsões das eleições passadas para compreender os
índices bizarros de preferência e os votos recebidos.
Caso não exista mesmo essa doença mental, as
probabilidades mais aceitas para explicar o comportamento do tipo esquizofrênico
dos eleitores só poderão ser buscaas em tratados sociológicos como o de Sérgio
Buarque de Holanda em “Raízes do Brasil”, de 1936, ou Casa Grande e Senzala de
Giberto Freyre, de 1933. O mais certo e talvez mais popular seria buscar
explicações do tipo antropológicas e sociais para essas preferências do
eleitorado em obras como Pedro Malasartes ou “Macunaíma”, de Mário de Andrade,
publicada em 1928. Até que o eleitor possa entender, definitivamente, que a
corrupção antecede a males como inflação e desemprego e está na raiz de todos
os nossos problemas como nação, muitas eleições terão passado, mantendo o
Brasil onde sempre esteve: no passado.