Está certo que a articulação
política do governo Lula está muito ruim. Lula não ajudou, privilegiando a
retomada das relações internacionais do Brasil em detrimento da política do
quintal, que define o programa de governo e as grandes questões do país. Mesmo
com esses erros, não se justifica a ofensiva da Câmara dos Deputados, liderada
por Arthur Lira.
As negociações por cargos e por emendas são legítimas e
inerentes ao regime democrático. Mas, com a ganância insaciável de interesses
fisiologistas, Lira extrapola totalmente os limites do razoável para
estabelecer uma política de chantagem. Com apenas seis meses de governo, adotou
uma postura de boicote sistemático ao novo governo. Argumenta que falta
articulação com o parlamento. ´
No caso, articulação significa grana, cargos e ministérios para
que as excelências façam o jogo rasteiro que as mantém no poder. É assim que
eles conseguem a façanha de serem eleitos com uma atuação que privilegia
claramente os interesses pessoais em detrimento dos coletivos ou republicanos.
Bastou que fossem liberados 1, 7 bilhão em emendas para que ocorresse na Câmara
o milagre da aprovação da MP do governo com o novo perfil dos ministérios do
governo Lula.
Lira quer impor um programa próprio atrasado e simplesmente
impedir ao governo de governar. Enfraqueceu os ministérios do Meio Ambiente e
dos Povos Originários, votou o projeto para flexibilizar as regras de
preservação da Mata Atlântica e o inconstitucional projeto do Marco Temporal.
Não atende aos interesses da maioria dos brasileiros.
No governo anterior, tentou passar a boiada de um verdadeiro
combo de destruição do meio ambiente, com o afrouxamento das regras contra o
desmatamento de nossas florestas, a regularização fundiária das terras griladas
e a legalização do garimpo ilegal em terras indígenas.
Recentemente, nós vimos o resultado da negligência com os
yanomanis nas cenas terríveis de que pareciam tiradas dos campos de
concentração nazista. O agronegócio será o primeiro a perder com essa política
de terra arrasada.
As excelências vivem falando em não permitir o retrocesso, mas
são, em si mesmas, os maiores retrocessos. O que a maioria que domina a Câmara
dos Deputados representa? Eles foram eleitos pela negociações nebulosas do
Orçamento Secreto e pelo abuso do poder econômico. Sem isso, não sobreviveriam.
Mudou o governo, mas eles querem usar os mesmos métodos de chantagem,
expropriação e privilégios.
Vejo alguns colegas da imprensa deslumbrados com o poder que
Lira enfeixa desde a era do Orçamento Secreto. Mas, para quê, com qual
projeto? Ele quer ressuscitar a Funasa, histórico reduto de esquemas de
corrupção. Posa e é tratado por parte da mídia com o status de estadista,
de Primeiro Ministro, mas, na verdade, é o Primeiro Ministro da Vanguarda do
Atraso. Não foi eleito presidente; foi eleito deputado.
Pesquisadores e observadores do cotidiano da política brasileira
são unânimes em avaliar que esse é o pior parlamento de toda a história
republicana, salvo as honrosas e louváveis exceções.
Parece que o sistema eleitoral se esmerou em fazer, para a
Câmara dos Deputados, a seleção dos piores elementos, os mais despreparados, os
mais desqualificados, os mais destituídos de valores éticos ou republicanos. É,
preciso, no mínimo, chamar os fatos com os seus nomes. E, enquanto isso, no que
for possível, o Senado precisa barrar as insanidades da Câmara.