A mocinha estava visivelmente
desconfortável no restaurante. Olhava para os lados, encurvava os ombros,
abaixava a cabeça e encolhia as mãos, como quem fosse dar um soco, mas com os
punhos virados para dentro. Recusou uma mesa mais central e fomos todos para um
canto, meio escondidos por pilastras.
Era uma reunião de trabalho, um almoço sem álcool, com pratos
executivos que seriam pouco apreciados, porque com assunto sério na mesa não há
culinária que resista. No batente, não há espaço para o prazer. Mas claramente
havia alguma coisa perturbando a moça, que continuava inquieta, até que um mais
afoito perguntou: “Você está bem? Parece incomodada…”
A moça corou – ainda não chegou aos 40 anos, mas é daquelas
pessoas que ainda se constrangem – e depois de alguns segundos de hesitação
respondeu que eram as unhas. Só havia outra mulher na mesa; a única que
conseguiu entender a extensão do problema. E as duas concordaram que o assunto
era grave.
A moça das mãos encolhidas revelou sua angústia: estava
trabalhando tanto que há duas semanas não ia à manicure; e o esmalte começou a
quebrar nas pontas. Falou com tanto sentimento que nos arrependemos de tê-la
chamado para aquele almoço-reunião, embora os homens não tenham inteligência e
sensibilidade suficientes para dar importância ao motivo da apreensão feminina.
Há muitos homens que fazem as unhas regularmente; alguns vão
apenas para tirar a cutícula, outros precisam aparar as pontas para evitar que
encravem e até quem passe uma base que deixa as pontas dos dedos luzindo como
árvores de natal fora de época.
Para os homens, a unha tem um sentido mais pragmático:
violonistas costumam deixar as úngulas de uma das mãos para melhorar o
dedilhado, jogadores de sinuca deixam a unha do dedo mindinho maior que as
outras (e não tenho a menor ideia do porquê) e golpistas deixam os gadanhos dos
polegares maiores para camuflar a bolinha no jogo de esconde, de onde tirar
dinheiro dos otários.
Mas as mulheres têm uma relação mais lúdica com as unhas. Tão
estreita que só elas sabem a diferença entre uma cor e outra, até porque nunca
se soube que ‘chinelo de pano’ estava no arco-íris ou na paleta de alguma
aquarelista, mas aparece no rótulo de esmalte como característica. Tem também o
‘Minnie lacinho de poá’, que certamente faz menção à rata namorada do Mickey, o
‘beijo’, ‘chita bonita’, recado e ‘meiga e decidida’ – nenhuma dessas “cores”
está no arco-íris.
Azar de quem foi criado na limitação dos lápis para colorir,
ainda que fossem aqueles estojos caprichados da Faber-Castell de 24 cores – e
olha que hoje há coleções com 120 tonalidades. Mas certamente não há ali um
lápis da cor ‘Minnie sou toda ouvidos’, ‘vendaval’ ou ‘guerreira preguiçosa’,
todas presentes nas melhores manicures.
Ai dos obtusos físicos e gráficos que acreditam que o mundo é
formado por apenas três cores – amarelo, azul e magenta – e suas misturas.
Certamente precisam prestar mais atenção às mãos femininas, onde as cores se
multiplicam e, talvez por isso, causem tanta dor de cabeça.