Nunca vi ninguém chorando fazer
“snif, snif”, tossindo com “cof, cof” ou dormindo e ressonando um “zzzz”. E
muito menos ouvi um “crash” quando se imitava o ruído de um acidente. Era tudo
coisa de gibi, onomatopeias – algumas delas resultado da preguiça dos
tradutores – que aparecem em tirinhas e HQs.
Mas conheci o “I”. Não está
errado; é a pronuncia da terceira vogal mesmo. É também o apelido do sujeito
que não chama Iolando nem Ilson, possível corruptela de Wilson.
O ”I” dele, nos disse, vem do
inglês “easy”, que pode ser fácil, mas também tranquilo, calmo. É um sujeito
peculiar e quando fala, como nos quadrinhos, praticamente dá para ver os balões
saindo da boca.
Toda frase é interrompida por um
efeito sonoro para aumentar a intensidade da ação ou suavizar uma afirmação –
“e aí – psshh – tudo ficou calmo”, concluiu um caso felizmente curto. As
onomatopeias são acompanhadas de gestos largos, como se estivesse no palco de
teatro kabuki, naquela mímica exagerada.
No início é interessante, mas
depois da segunda dose cansa. É como ouvir uma novela no rádio com sonoplasta
ruim, que não acerta o ruído correto e não prende a atenção como faz um bom
contador de causos que, a partir de uma história minúscula, desenvolve uma
narrativa longa, recheada de humor e suspense.
Mas os gestos chamavam a
atenção, porque não eram usuais. A gente sabe que dependendo da cultura um
gesto pode agradar ou provocar uma briga.
Na Inglaterra, o punho fechado
com o indicador e o mínimo levantados é cumprimento dos fãs do rock heavy metal
por lembrar, dizem, a silhueta do tinhoso. Na Itália é ofensa grave – é chamar
o outro de chifrudo, e neste caso sem cheiro de enxofre.
Quando os norte-americanos unem
o polegar e o indicador e esticam os outros dedos querem dizer que está tudo
bem, OK. No Brasil, o significado é bem outro e impublicável, pelo menos num
jornal de respeito. Para os japoneses é símbolo para dinheiro.
Os brasileiros costumavam
apertar o lóbulo para elogiar alguma coisa. Os mais explícitos acrescentavam
“da pontinha da orelha”, para deixar claro a sensação de agrado. Na Itália – o
que há com esse pessoal da bota? – é o mesmo que chamar o outro de homossexual.
Mesmo gestos meio
universalizados comportam exceções. Quando se movimenta a cabeça de um lado
para outro em quase todo mundo é interpretado como negativa. Mas na Grécia e
Bulgária é para dizer sim.
Mas o nosso personagem, “I”, não
tinha preocupação de ser mal interpretado e literalmente falava pelos
cotovelos, honrando a origem latina da expressão, atribuída ao dramaturgo
Quintus Horatius e que nasceu da observação de pessoas que abrem os braços e cutucam
os outros enquanto falam. E “I” cutucava, não apenas com o cotovelo, mas também
com a ponta dos dedos, procurando atrair a atenção.
Ceará, responsável pela
introdução do personagem na mesa do bar, anunciou que ia embora. Foi quando
Maurição abandonou a fleugma e disse: “Pode ir. Mas não esquece o pacote.
Visshhhh! Pow! Puf!”.