O presidente Lula, depois de pensar durante quatro
dias inteiros, chegou à conclusão de que estava “assustado” com um dos seus
grandes modelos de virtude política, o amigo, parceiro e ditador Nicolás
Maduro. Não era para menos. Maduro, num dos destampatórios mais neuróticos que
já conseguiu produzir em cima de um palanque, ameaçou com todas as letras “um
banho de sangue” e “uma guerra civil”, pelo menos, se não ganhar as eleições do
próximo domingo na Venezuela. Quem poderia imaginar uma coisa dessas, não é
mesmo?
Lula e o PT-PSOL, há pelo menos dez anos, são
possivelmente as maiores macacas de auditório que Maduro tem no mundo. O
problema da Venezuela, segundo Lula, é ter “democracia demais”. Os crimes, a
fome e a calamidade sem precedentes que o ditador provocou na Venezuela são
culpa, de acordo com Lula e o seu profeta diplomático Celso Amorim, do
“bloqueio econômico” aplicado pelos Estados Unidos. Como ele vai, agora, fazer
uma coisa dessas e deixar os amigos com a brocha na mão?
No Brasil de hoje, quando Maduro e Lula se
desentendem, um dos dois está traindo o outro – ou ambos estão conseguindo se
trair ao mesmo tempo.
Maduro tornou-se a pior humilhação que Lula já teve em
sua ideia fixa de ser um “líder mundial”. Foi recebido no Brasil com tapete
vermelho, quando está com a cabeça a prêmio no resto do mundo por tráfico
internacional de drogas. Fez dívidas que não paga e que Lula não cobra. É
furiosamente bajulado pelos magnatas do governo. Mas justo agora, quando Lula
está se submetendo aos papéis mais sórdidos para sustentar que a Venezuela é
uma linda democracia, seu amigo vem e lhe faz uma crocodilagem dessas, com a história
do “banho de sangue”.
Ficou difícil até para Lula – que apoia as prisões
políticas, a tortura, a censura, a miséria e todas as desgraças que o seu
aliado comanda na Venezuela, mas não tem coragem para lhe dar a mão na hora em
que ele sobe no trampolim para poluir a piscina, em vez de disfarçar ficando na
água. O resultado é essa palhaçada que está aí. No começo Lula se escondeu –
não falou nada sobre o surto de Maduro. Depois achou que seria pior ficar
quieto, e resolveu se declarar “assustado” com as ameaças. Levou um contravapor
em regra do tirano – e agora está aí feito um tonto, sem ter ideia do que
fazer.
Maduro não perdeu tempo para enviar seu cala-boca a
Lula. Disse que se ele estava assustado, devia tomar um chá de camomila e não
encher mais a paciência. Pior: disse que o sistema eleitoral do Brasil não
permite a auditoria dos votos, ou seja, é uma fraude geral. Foi um momento de
puro horror. Quer dizer que Maduro, o herói de Lula, do PT e do Itamaraty, está
dizendo a mesma coisa que Bolsonaro disse – e pela qual foi declarado
inelegível pelo TSE até 2030?
Sim, quer dizer isso mesmo, e aí o presidente da
República, o TSE do ministro Alexandre de Moraes e a “suprema corte” (que
considera como “golpe de direita” qualquer crítica às suas preciosas urnas),
ficam vendidos e mal pagos. No pânico, o TSE suspendeu o envio à Venezuela dos
dois “observadores” que iriam lá para validar a fraude maciça que têm sido
essas eleições – duas candidatas da oposição proibidas de concorrer, prisão de
opositores, censura, sabotagem aos votos dos 4,5 milhões de eleitores venezuelanos
que tiveram de se exilar do seu país, cédulas de votação em que o nome de
Maduro aparece treze vezes, e por aí afora.
O ditador proibiu a presença de fiscais independentes
nas eleições; estava pronto para dizer que os observadores do TSE iam atestar a
honestidade do processo, junto com o MST, o Black Lives Matter, o Hamas, os
aiatolás do Irã e outros paradigmas da democracia mundial. Vai ter agora de
fazer a sua fraude sem a colaboração direta e oficial do governo do Brasil – ou
apenas com o aval do ministro-de-fato Celso Amorim.
Dizia-se, num Brasil que há longo tempo não existe
mais, que quando pobre comia galinha um dos dois estava doente. No Brasil de
hoje, quando Maduro e Lula se desentendem, um dos dois está traindo o outro –
ou, mais provavelmente, ambos estão conseguindo se trair ao mesmo tempo.