Calma, leitor afoito e irritadiço. Respira. Lê de
novo. Repara que o título deste texto é uma pergunta, não uma afirmação. E por
um motivo bastante simples: jamais seria capaz de bancar uma declaração
categórica dessas. Não em tempos normais e muito menos no ambiente caótico da
política brasileira atual. Pronto? Mais calmo? Ótimo. Então vamos lá explorar
essa ideia - por mais estapafúrdia que ela pareça: a de que Pablo Marçal
é o novo Bolsonaro.
A questão surgiu depois da divulgação de uma pesquisa
que mostra um, digamos, aumento súbito no interesse do eleitorado paulistano
pelo candidato que se vende como antissistema, outsider e
conservador-revolucionário – por mais contraditório que sejam esses termos.
Claro que estou falando dele, Pablo Marçal, o homem que está surfando no vácuo
de poder criado pela trapalhada 4D do ex-mensaleiro e ex-aliado de Lula
convertido em “direitista”, Valdemar da Costa Neto.
Acontece que Valdemar da Costa Neto, presidente do
partido que deu guarida a Bolsonaro e tantos e tantos bolsonaristas órfãos de
uma agremiação ideológica formal, negou ao ex-ministro Ricardo Salles uma
candidatura assim puro-sangue à Prefeitura de São Paulo. No lugar, impôs ao
atual prefeito e candidato à reeleição, Ricardo Nunes, um vice. Isso tudo em
troca do apoio de Bolsonaro a Nunes. O detalhe é que tanto Bolsonaro dá quanto
Nunes aceita o apoio muito a contragosto.
Foi essa barbeiragem política das velhas raposas o que
deu a Pablo Marçal a oportunidade de usar todo o seu poder de persuasão (aquilo
que antigamente chamávamos de “lábia”) para conquistar o eleitor bolsonarista.
Que vê em Nunes um político sem nenhum comprometimento com as pautas ditas
conservadoras; em Boulos, um militante de extrema-esquerda; em Tabata Amaral,
uma representante do progressismo bilionário; e em Marina Helena uma liberal
“limpinha demais” para encarar o jogo sujo da política.
Uma proeza e tanto: E o mais importante: um
eleitorado que talvez (ah, talvez!) não enxergue mais em Bolsonaro... o
Bolsonaro de antigamente. Aquele que passou trinta anos no Congresso sem fazer
um amigo. O Bolsonaro que entrou para o imaginário popular como alguém
antissistema. Como um outsider. Como um conservador de espírito revolucionário
o bastante para querer botar ordem na casa sem se submeter a conchavos ou à
tirania do “politicamente correto”.
Desconstruir o mito, nada menos do que o mito, e fazer
surgir em seu lugar outro fenômeno eleitoral com o qual esse amálgama
incompreensível chamado “direita” se identifica. Esse é o tamanho da proeza de
Valdemar da Costa Neto. E, por extensão, do próprio Bolsonaro. Que, por algum
motivo para mim insondável, abandonou sua jeitão instintivo de fazer política,
rendendo-se aos cálculos nem-tão-geniais assim do cacique do PL. Se bem que não
sei por que me surpreendo. Não depois das nomeações de Bolsonaro ao STF.
Ressalvas e vejabens: Mas esse não é o ponto e vale
ressaltar aqui que estou (estamos) refletindo sobre a substituição de Bolsonaro
por Pablo Marçal no imaginário da direita. Uma substituição que não significa
necessariamente o sucesso eleitoral de um ou o fracasso eleitoral do outro.
Trata-se, a meu ver, de um fenômeno interessantíssimo, que é a necessidade que
esse eleitorado sente de um líder destemido o bastante para dizer, na cara dos
demais candidatos, tudo o que ele, eleitor, tem vontade de dizer. Mas não pode.
Aí, porém, é que a proverbial porca torce o também
proverbial rabo. Porque, à semelhança de Bolsonaro, no caso de Pablo Marçal há
todo um universo de ressalvas e vejabens entre o que ele é na realidade e o que
ele se tornou no insaciável (e pobre) imaginário (olha ele aí de novo!) do
povo. Meu temor é o de que a direita se decepcione. Ou pior: de que ela seja
mais uma vez traída. Mas que sei eu, não é mesmo? E, no mais, vocês já estão
bem grandinhos para se deixarem enganar assim de novo. Espero.