O russo Pavel Durov, de 39 anos, criador do Telegram,
foi preso no fim de semana na França, ao chegar a um aeroporto particular perto
de Paris.
Nesta segunda-feira (26), o Ministério Público da
capital francesa disse num comunicado que Durov foi preso no contexto de uma
investigação judicial aberta contra “uma pessoa não identificada”, iniciada
pela unidade de crimes cibernéticos da promotoria em 8 de julho.
A declaração esclarece que a investigação é relativa a
12 acusações, entre elas, cumplicidade em crimes como administrar uma
plataforma online para permitir transações ilícitas; posse, distribuição,
oferta ou disponibilização de imagens pornográficas de menores; fraude; e
aquisição, transporte, posse, oferta ou venda de drogas, além de lavagem de
dinheiro e recusa a entregar, a pedido das autoridades competentes, informações
ou documentos necessários à realização e operação de interceptações permitidas por
lei, entre outras. A plataforma alega que cumpre as leis da União Europeia.
O empreendedor russo, que se diz um libertário, nasceu
em São Petersburgo (à época, Leningrado) em outubro de 1984, quando ainda
existia a União Soviética. Quando ele tinha quatro anos de idade, sua família
se mudou para a Itália, mas retornou para a Rússia após o fim do comunismo.
Ele se formou na Universidade Estatal de São
Petersburgo e em 2006 lançou o VK, uma rede social que chegou a ser chamada de
Facebook da Rússia.
Em abril de 2014, Durov postou no VK ordens que
recebeu para que a plataforma entregasse ao Serviço Federal de Segurança da
Rússia dados pessoais de manifestantes da Ucrânia que exigiam a saída do
presidente pró-Kremlin Viktor Yanukovych e para que fosse bloqueado o perfil do
líder opositor Alexei Navalny. Ele se recusou, e poucos dias depois foi
demitido do cargo de CEO do VK.
Durov declarou que desobedeceu às ordens porque
representariam “uma traição aos nossos usuários ucranianos”. “Depois disso, fui
demitido da empresa que fundei e fui forçado a deixar a Rússia. Perdi minha
empresa e minha casa, mas faria tudo de novo – sem hesitar”, disse o
empresário, que, durante os protestos contra o ditador Vladimir Putin entre
2011 e 2013, já havia se recusado a bloquear perfis de usuários críticos ao
Kremlin.
O centro operacional do Telegram, um app de mensagens
que também é usado como rede social e que, assim como o VK, foi fundado junto
com o irmão de Durov, Nikolai, fica em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
A partir de 2018, o Kremlin tentou proibir o Telegram
na Rússia, mas desistiu em 2020. O órgão fiscalizador de comunicações
Roskomnadzor apontou em comunicado à época que havia desistido da proibição “em
acordo com o gabinete do procurador-geral da Rússia” porque Durov se mostrou
“preparado” para cooperar no combate ao terrorismo e extremismo na plataforma.
Hoje, o app é utilizado sem restrições no país. Não se
sabe ao certo se houve um acordo com Putin, mas o Telegram é amplamente
utilizado pelas autoridades russas, que manifestaram apoio a Durov após sua
prisão.
Deputados russos pediram sua libertação e a porta-voz
do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, disse que a
Embaixada Russa em Paris está empenhada em ajudar o empresário com os seus
problemas com a Justiça francesa.
Durov diz ser pai biológico de mais de cem pessoas:
Acusado no passado de permissividade com crimes praticados por meio do Telegram
(exatamente a acusação da promotoria francesa agora), Durov costuma alegar que
seu app é apenas o aplicativo de mensagens mais seguro – o que inclui proteção
contra o Estado.
“Você não pode torná-lo seguro contra criminosos e
aberto para governos”, disse em entrevista à CNN em 2016. “Ou ele é seguro, ou
não é.”
Vegetariano que também diz não consumir álcool, drogas
recreativas e cafeína, Durov tem um patrimônio de US$ 9,15 bilhões, segundo
dados da Bloomberg, e em julho deste ano revelou uma informação pessoal
curiosa: disse ter sido informado de que era pai de mais de cem filhos
biológicos.
“Como isso é possível para um cara que nunca foi
casado e prefere viver sozinho?”, escreveu no Telegram. Ele relatou que há 15
anos um casal de amigos que não conseguia ter filhos lhe pediu que doasse seu
esperma. Na clínica, afirmou Durov, o diretor do local lhe disse que havia
falta de “doadores de material de alta qualidade”, o que o levou a se tornar um
doador frequente.
“Avançando para 2024, minhas doações ajudaram mais de
cem casais em 12 países a terem filhos. Além disso, muitos anos depois de eu
ter parado de ser doador, ao menos uma clínica de fertilização in vitro ainda
tem meu esperma congelado disponível para uso anônimo por famílias que querem
ter filhos”, disse Durov, que informou que pretende tornar público seu código
genético para que seus filhos biológicos “possam se encontrar mais facilmente”.