Navios graneleiros, quando não servem mais para o transporte de grãos,
por fadiga de material ou outros motivos, seguem para os portos da Ásia, onde
vão ser retalhados para a reutilização dos metais. Antes disso, passam por um
processo de dedetização completa para eliminar ratos e outros bichos. Nesse
momento que antecede a morte da grande nave, milhares de ratos, baratas e
outros insetos põem-se a correr afoitos por todos os lados, fugindo
desesperados da morte certa. É nesse momento que a tripulação do graneleiro
descobre que havia a bordo uma imensa e antiga tripulação de bichos, que viviam
escondidos, alimentando-se dos grãos transportados pela nave. Formavam, assim,
uma espécie de subtripulação escondida, por décadas, nos porões escuros,
reproduzindo-se e vivendo às custas do trabalho de outras pessoas. Essa tripulação
clandestina causou ao longo dos anos enormes prejuízos econômicos aos
transportadores, além de transmitir doenças fatais diversas.
Numa analogia ligeira, poderíamos comparar esses enormes navios
graneleiros aos estados, sobretudo àqueles que endossam políticas do tipo
estatizantes, nas quais o maior empresário é ninguém menos do que o próprio
Estado e, obviamente, todos aqueles que vivem próximos ao poder. Hoje, a esse
fenômeno que faz com que existam, simultaneamente, dois Estados convivendo ao mesmo
tempo numa só figura jurídica, foi dado o nome de “Deep State”, ou Estado
Profundo.
Esse termo vem ganhando cada vez mais atenção dos estudiosos e tem
entrado também nas discussões políticas dentro e fora do país. O termo parece
ter surgido na Turquia para descrever uma espécie de governo ou rede paralela,
que, mesmo operando de maneira oculta, envolvia agentes do governo e muitos
outros grupos de interesse.
Existe, sim, um sistema subterrâneo que controla, ou influencia, as
decisões políticas do Estado e do governo. Na sua maioria, é formado pela
própria elite de um país, que age como passageiros clandestinos nesse enorme
navio que é o Estado.
Ações de dedetização, como no caso da Operação Lava-Jato, têm efeitos
curtos para eliminar a totalidade desses ratos de duas pernas que operam nas
sombras. A população em geral não faz a mínima ideia da existência desse tipo
de Estado profundo, pois muitos partidos políticos e as grandes e múltiplas
corporações cuidam para que todo e qualquer escândalo seja logo abafado e não
venha à tona.
O combate ao “Deep State” exige grande dose de poder de decisão e de
vontade de eliminar, pelas raízes, esse mal, que acaba sempre afetando
negativamente a vida da população, pois esse Estado das profundezas, poderíamos
classificá-lo dessa maneira, exerce grande influência para moldar e mudar a
agenda política e econômica de um país. Essa é, justamente, a grande batalha
que vem sendo travada nos Estados Unidos pelo novo governo americano.
Pelas suas repercussões e pelo alarde e pânico que têm provocado, vê-se
logo que as ações de Trump contra esse verdadeiro hospedeiro danoso estão
atingindo áreas antes intocáveis e de muito poder. Trump está mexendo com um
verdadeiro vespeiro, contrariando a mídia e as grandes corporações que, por
décadas, usufruem de um poder paralelo às custas do contribuinte americano. São
bilhões ou talvez trilhões de dólares que são sorvidos pelo “Deep State” a cada
ano, sem fiscalização e às escondidas da população.
Os seguidos ataques que vêm sofrendo de todos os lados, inclusive, com
atentado à bala contra sua vida, evidenciam que essa é uma guerra interna de
grandes proporções. Engana-se quem pensa que a existência de um Estado profundo
ou das profundezas é coisa de outros países. Por aqui, a história se repete,
potencializada pela inoperância e leniência da Justiça e pela certeza de que as
penalidades nunca alcançarão os poderosos.
Embora opere nas sombras, não restam dúvidas de que a ação de um “Deep
State” em nosso país tem contribuído enormemente para a erosão da confiança do
cidadão nas instituições, criando ainda um ambiente nefasto de polarização
social e política, ao excluir grandes parcelas da população dos ganhos
econômicos. Trata-se, assim como nos Estados Unidos, de um processo de
dedetização que, mais cedo ou mais tarde, teremos que enfrentar, caso haja o
sincero objetivo de evitar que o enorme e infestado graneleiro, que é o Brasil,
não venha a pique.