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O julgamento de Bolsonaro: as imprevisíveis consequências do resultado previsível

O julgamento de Bolsonaro: as imprevisíveis consequências do resultado previsível

Quem acompanha as notícias, mesmo por alto, já percebeu que a prioridade de setores da Justiça brasileira parece ser prender, colocar na cadeia, de qualquer forma, o político mais popular da história recente do país: Jair Bolsonaro. É mais ou menos como aconteceu com Donaldo Trump nos EUA – só que pior.

Quando juristas importantes opinam sobre as investigações e inquéritos contra Jair Bolsonaro e outras figuras públicas, a maioria deles denuncia as “inovações” jurídicas envolvidas, como a ideia de manter os termos do foro privilegiado de políticos mesmo quando eles não ocupam mais o cargo que deu origem ao foro. Traduzindo: basta ter ocupado uma vez um cargo de presidente, senador ou deputado federal e você estará, pelo resto de sua vida, sujeito a ser julgado por um tribunal cujas decisões são irrecorríveis. A classe política será feita de refém.

Essa não é uma discussão jurídica; essa é uma questão política.

Aos poucos a nação desperta para a realidade: o Estado brasileiro decidiu que a política deveria ser tutelada pela Justiça. Políticos cuja autoridade e legitimidade têm origem nos votos que receberam são tutelados – censurados, tornados inelegíveis ou até encarcerados – por burocratas não eleitos, nomeados por políticos e cuja legitimidade depende – ou costumava depender – da estrita observação da lei. É nesse último ponto que a porca torce o rabo.

“Com Bolsonaro encarcerado, a sequência lógica é retirar da vida pública (e talvez também prender) os políticos que o apoiam, inclusive parlamentares com mandato. Restará a questão do que fazer com os cinquenta e oito milhões de eleitores que escolheram Bolsonaro na última eleição presidencial”

A tutela dos eleitos pelos não-eleitos saiu de controle. Chegamos ao ponto em que os tutores acreditam que podem dispensar os próprios políticos e aplicar a tutela diretamente ao povo. Juízes deixam de ser magistrados para se tornar governantes.

Como a lei se tornou fluida, ela é usada conforme as preferências do aplicador: ela é aplicada com dureza máxima em alguns casos, enquanto em outros ela é ignorada. Desaparece o conceito de juiz natural, neutro e inerte: causas são julgadas por juízes incompetentes, inclusive juízes com interesse no processo, inclusive por juízes com parentes atuando como advogados de uma das partes, inclusive por juízes que abrem, eles próprios, “de ofício”, o processo. Inaugura-se no país a doutrina legal do “fiz porque quis”. É uma espécie de UFC jurídico, no qual juristas de combate competem em um tribunal-octógono contra senhoras idosas, cabelereiras, moradores de rua e vendedores de algodão doce.

Parece clara a determinação de retirar Jair Bolsonaro da vida pública e – é difícil encontrar um termo mais adequado – extirpar o “bolsonarismo” da política brasileira. A popularidade de Jair Bolsonaro é antifrágil: quanto mais ele é atacado, mais ela aumenta. Contra Bolsonaro já se tentou de tudo, até uma investigação por extrema proximidade com uma baleia. A acusação mais recente é a de golpe de Estado. Aparentemente, trata-se de uma denúncia autoprovada; ou seja, a acusação em si já é a prova do crime. Com Bolsonaro encarcerado, a sequência lógica é retirar da vida pública (e talvez também prender) os políticos que o apoiam, inclusive parlamentares com mandato. Restará a questão do que fazer com os cinquenta e oito milhões de eleitores que escolheram Bolsonaro na última eleição presidencial, especialmente quando o político em quem eles votaram tiver sido preso por seus adversários políticos.

Perverter a Justiça é um crime pior do que o pior crime do pior bandido, porque a Justiça é o último recurso das pessoas de bem e a principal justificativa para a existência do Estado. O Brasil é o país onde, em meio a mais uma crise de criminalidade, o Estado anuncia o plano "Pena Justa" para melhorar os presídios e reduzir as penas de criminosos. Esse projeto, que deveria se chamar "Crime Justo", é a prova de que a elite burocrática do país – os tutores da população – vivem em um mundo diferente do nosso. É um mundo onde o imaginário moral é ocupado por uma obsessão com o bem-estar de bandidos.

Ao mesmo tempo em que afagam e desencarceram criminosos violentos, nossos tutores querem prender o político mais popular da história recente. As consequências dessa decisão são imprevisíveis. Mas a verdade – que produz muitas noites insones em opulentas mansões do Lago Paranoá – é que alguém que realmente venceu o bolsonarismo não precisaria prender Bolsonaro.


Roberto Motta – Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil – Gazeta do Povo





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