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Quem são os verdadeiros tiranos do Brasil?

Quem são os verdadeiros tiranos do Brasil?

Chega a ser engraçado, mas a resposta para essa pergunta – estranha num país que insiste em se chamar de “democracia” – está na ponta da língua de uma ministra suprema. Segundo sua sapientíssima excelência, eu sou uma “tirana” do Brasil. Isso mesmo. E você também, aliás. E ainda aquele seu vizinho chato, junto com o vendedor de pipocas da esquina, o padeiro, todos os assalariados, as donas de casa – enfim, todo brasileiro. Com exceção, óbvio, da casta dos iluminados que assumiram por conta própria a tarefa de nos conduzir pelo caminho que o Supremo Poder considera o mais correto.


Somos todos “pequenos tiranos”, segundo Cármen Lúcia: insignificantes seres convencidos de que possuem alguns direitos fundamentais, como o de pensar livremente e expor a própria opinião – inclusive sobre a sociedade, o país, seus políticos, seus juízes, as eleições. Não, nada disso: tiranos não podem ter direitos. São seres abjetos que precisam ser contidos com camisa de força, mordaça na boca e venda nos olhos – senão, são um perigo para a “democracia”.


"Somos todos 'pequenos tiranos', segundo Cármen Lúcia: insignificantes seres convencidos de que possuem alguns direitos fundamentais, como o de pensar livremente e expor a própria opinião"


Veja a que ponto chegamos: antes era só a “extrema-direita” (ou seja, qualquer um que não fosse esquerda); agora, toda a população brasileira é considerada inimiga do país. No entendimento supremo, somos todos tiranos dispostos a usar as redes sociais para implodir a suposta (há dúvidas sobre a real existência da dita cuja) democracia brasileira – e é esse o real motivo para instaurar a censura nas redes sociais. Usaram argumentos legítimos, como a “proteção às nossas crianças”, mas isso é o de menos. O real intuito é evitar que critiquemos o Estado e os Poderes cada vez mais carcomidos pelo autoritarismo – e cobremos mudanças.


Melhor que as redes sociais filtrem nossas palavras e pensamentos e só deixem ser publicado aquilo que o Supremo Poder considera “civilizado”. Criticar, por exemplo, o salário e penduricalhos dos membros do Judiciário é um ato evidente de tentativa de desestabilização dos Poderes e da democracia – então, não pode. Igualmente, debater sobre o sistema eleitoral ou, pior ainda, questionar como ministros supremos podem simplesmente deixar de lado o que as leis e os códigos jurídicos estabelecem e fazer o que quiserem, são casos evidentes de tiranices populares que precisam ser limados das redes sociais.


Democracias, por definição rasteira, são regimes em que o povo – eu, você, todo mundo – teria o poder de decidir os rumos do país, seja de forma direta ou, como é mais comum, elegendo aqueles que serão nossos governantes e legisladores. E o povo erra – e como erra! Volta e meia, elege estrupícios para os governos, se deixa levar por promessas falsas, acredita uma, duas, três vezes nos mesmos políticos ladrões. Faz parte. E também faz parte das democracias a liberdade para criticar, opinar, pensar – mesmo que de forma capenga, mesmo estando errado.


Se eu elimino ou limito significativamente a liberdade do povo de dizer, pensar, criticar – será que ainda posso falar em democracia? Como defender que existe democracia – que precisa de povo e da liberdade para existir – tratando cada brasileiro como um “pequeno tirano” e limitando de forma grave sua liberdade? Não somos “pequenos tiranos”, ministra. Nem somos a verdadeira ameaça à democracia. Somos apenas o povo diante de grandes tiranos que não cansam de nos espezinhar e que, estes sim, colocam a pobre democracia brasileira em risco.


Jocelaine Santos - (Foto: Antonio Augusto/STF) - Gazeta do Povo


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