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Entrevista: “Inquéritos do 8 de janeiro precisam ser anulados”: David Ágape comenta Vaza Toga 2

Entrevista: “Inquéritos do 8 de janeiro precisam ser anulados”: David Ágape comenta Vaza Toga 2

Em entrevista exclusiva, o jornalista David Ágape detalha as descobertas do Vaza Toga 2, uma investigação realizada em parceria com Eli Vieira e publicada pelo site Civilization Works, de Michael Shellenberger. O material revela documentos internos do Tribunal Superior Eleitoral que apontam para a criação de um grupo de WhatsApp usado em investigações informais sobre os presos dos atos de 8 e 9 de janeiro de 2023. Segundo Ágape, essas apurações, solicitadas pelo ministro Alexandre de Moraes, teriam influenciado diretamente quem seria mantido preso e quem seria liberado nas audiências de custódia. Ele também comenta a reação da imprensa, possíveis desdobramentos jurídicos e casos emblemáticos, como o de mulheres presas até hoje.


Entrelinhas: Houve um Vaza Toga 1, divulgado por Glenn Greenwald e Fábio Serapião. Esse novo material já estava com o Glenn? David Ágape: Não tenho certeza, mas imagino que parte desse material sim. É uma investigação complexa. Quando recebemos grandes lotes de arquivos, nem sempre usamos tudo. Isso já aconteceu várias vezes comigo. Uma pequena informação pode gerar uma pauta enorme. O Glenn foi muito corajoso, publicou boas reportagens na Folha de S. Paulo por dois meses. Nossa investigação sobre o Vaza Toga demandou meses de apuração e ninguém até agora tentou refutar, porque eles não têm como fazer isso.

Entrelinhas: Como você percebe a cobertura da maior parte da imprensa até agora? David Ágape: Só veículos como Gazeta do Povo, Revista Oeste, Poder360 e CNN citaram nossas investigações. A maioria da imprensa foi silenciada ou preferiu ignorar. Muitos jornalistas, até de esquerda, me procuraram no privado para elogiar, mas os veículos não publicaram nada.

Entrelinhas: Um dos pontos que chamou atenção foi o uso de “certidões positivas” e “negativas”. Como isso funcionava? David Ágape: Uma certidão positiva significava que a pessoa tinha postagens consideradas “antidemocráticas” e, portanto, deveria ficar presa. Isso incluía, por exemplo, ter assinado um abaixo-assinado pedindo respeito à liberdade e apoio a Bolsonaro, que teve mais de 1,6 milhão de assinaturas. Certidões negativas não garantiam liberdade; idosos e até pessoas sem postagens foram mantidas presas. O caso da dona Vildete Guadia, de 74 anos, é emblemático: mesmo com erro na certidão, ela continua presa e doente.

Entrelinhas: Como funcionou o caso específico sobre mulheres no Dia Internacional da Mulher? David Ágape: No 8 de março, Moraes quis fazer um gesto “humanitário” e liberar algumas mulheres presas, mas usou critérios políticos: se houvesse algo “antidemocrático” nas redes sociais, a mulher ficava presa, mesmo idosa ou doente. De 17 certificadas como positivas, só uma foi solta — e depois voltou para a prisão por motivos absurdos, como falha na tornozeleira eletrônica ou vender bens, interpretado como “tentativa de fuga”. Isso é ilegal e seletivo.

Entrelinhas: Vocês têm mais materiais para publicar? David Ágape: Acredito que sim. Enviamos informações para jornalistas investigativos de várias regiões do país, que podem avançar em pontos que não abordamos. Poderia ter sido uma série, mas publicamos tudo de uma vez para evitar bloqueios. Continuo investigando e, esta semana, devo publicar um relatório sobre a escalada autoritária do TSE nas eleições de 2022.

Entrelinhas: Você vê possibilidade de autocrítica ou revisão no STF por conta dessas denúncias? David Ágape: Já começou. Alexandre de Moraes disse “Cometemos erros”, tentando minimizar. Só que não basta dizer “Errei”. Ele precisa confessar as ações ilegais e buscar reparação. Para mim, a anistia é urgente, porque muitas dessas pessoas não cometeram crimes, e o correto é anular inquéritos e sentenças, com reparação. Temos casos como o de Clezão, que morreu na prisão, e o de famílias destruídas.

Entrelinhas: Que recado você deixa para quem acompanha o caso? David Ágape: Que não ataquem pessoalmente ministros, equipes ou servidores. Críticas devem ser firmes, mas pacíficas e sérias. Comentários violentos só prejudicam. Estamos num regime que não é normal, e só conseguimos continuar denunciando porque tratamos o assunto com coragem, mas também com responsabilidade.


Mariana Braga - (Foto: Lula Marques/ Agência Brasil) - Gazeta do Povo


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