Tudo indica que o governo do PT já se esqueceu como foi que Dilma Rousseff perdeu o cargo no Palácio do Planalto – evento que em breve completa uma década. Dez anos é passado remoto para quem confia na amnésia nacional (a espontânea e a induzida).
Talvez por terem passado tempo demais repetindo a versão de que Dilma sofreu um golpe – e não um impeachment legítimo, presidido pela Suprema Corte na pessoa de um aliado político do PT – os partidários de Lula talvez tenham se esquecido do crime de responsabilidade que levou ao afastamento da presidente em 2016. E esse afastamento se deu por irregularidades contábeis – popularmente conhecidas como pedaladas fiscais.
"Segundo o Tribunal de Contas da União, o poder Executivo está atuando de forma reiterada para suprimir despesas do quadro contábil. O último lance dessa ação foi a proposta de exclusão de uma quantia da ordem de 10 bilhões de reais"
A semântica sempre foi uma aliada dos políticos fisiológicos. Ou pelo menos eles assim a consideram. Caixa dois virou “dinheiro não contabilizado”, por exemplo. De fato, é bem mais simpático. Por que não investir na fraude de boa aparência? Não custa nada passar a chamar vultuosas comissões em negociatas de “pixuleco”. Ou melhor: custar, custa. Mas o bolso alheio está aí pra isso mesmo. Agora, o governo Lula parece estar disposto a um novo investimento nas aparências – o perigoso banho de loja nas contas públicas.
Segundo o Tribunal de Contas da União, o poder Executivo está atuando de forma reiterada para suprimir despesas do quadro contábil. O último lance dessa ação foi a proposta de exclusão de uma quantia da ordem de 10 bilhões de reais - referente a despesas de empresas estatais – do cálculo do resultado primário das contas governamentais.
“A prática reiterada da exclusão de despesas contribui para a elevação do endividamento público, para a redução da transparência das estatísticas fiscais e para a perda da credibilidade das regras fiscais vigentes”, alertou o TCU. De acordo com o Tribunal de Contas, esse tipo de expediente fere os princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal. Será que o governo petista acha que o impeachment é como um raio que não cai duas vezes no mesmo lugar?
É um drama visível a olho nu. Essa última cartada foi dada no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias – ou seja, à luz do dia, para quem quiser ver. O Tesouro Nacional e o Ministério da Fazenda estão discutindo diante de todos se podem injetar recursos públicos no rombo dos Correios, e de onde virão esses recursos. Circula aos olhos de todos um cálculo de 20 bilhões de reais como valor necessário para esse socorro. E é notória a cogitação por parte da equipe econômica da retirada do balanço das estatais do resultado fiscal do governo. Seria a oficialização do que o TCU está chamando de exclusão de despesas.
Em tradução livre, o que o Tribunal de Contas está dizendo ao governo poderia ser fixado numa placa na entrada do Palácio do Planalto: é proibido pedalar. Ou seja: tentar fazer a conta fechar artificialmente, no puxa-estica de balanços, não pode.
Como o grupo político que se encontra hoje no Planalto está cansado de saber disso – inclusive pela experiência dolorosa de 2016 – talvez esteja apostando que a atual onda de indulgência irá se estender ao ciclismo contábil. Quem ousa duvidar?



