Reunião da CPI do Transporte na CLDF: conclusão, até agora, é que a licitação foi "danosa ao Estado" e deveria ser anulada
Comissão da Câmara que investiga a licitação do transporte
público do Distrito Federal em 2012 ainda não ouviu os principais nomes
relacionados às decisões do período. Depoimentos feitos até agora não acrescentaram
em nada as investigações do Ministério Público
Iniciada há mais de 100 dias, a CPI do Transporte não avançou
em relação às investigações do Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios (MPDFT). Até o momento, os parlamentares ouviram 13 pessoas e,
estranhamente, figuras centrais no processo de licitação, como o advogado Sacha
Reck, ainda não foram convocadas. Reck é apontado pelo MP como o comandante da
licitação, que custou R$ 7,8 bilhões aos cofres públicos. O então diretor do
DFTrans, Marco Antônio Campanella, também escapou de comparecer à CPI, apesar
de a convocação ter sido aprovada há 60 dias. Enquanto isso, o secretário de
Mobilidade, Carlos Tomé, no cargo há oito meses — que não participou do
processo licitatório —, prestará esclarecimentos pela segunda vez na
terça-feira.
A única
Comissão Parlamentar de Inquérito em curso na Casa tem pouco mais de dois meses
de trabalho pela frente para comprovar fraudes na licitação que renovou a frota
de ônibus do Distrito Federal no governo passado. Entre os depoentes, três são
procuradores do Ministério Público. Outros três, incluindo o secretário de
Mobilidade, fazem parte da atual gestão. Também foi ouvido o ex-diretor técnico
do DFTrans Raimundo Lúcio da Silva. Ele limitou-se a dizer que não era
responsável pelos contratos. O então secretário de Transportes, José Walter
Vazquez Filho, negou todas as acusações e fez um relatório da gestão. João de
Pádua, membro da comissão de licitação e responsável pela elaboração das atas,
negou a influência de Sacha Reck no processo, contrariando o entendimento do
MPDFT (leia Para saber mais).
O
ex-presidente da comissão de licitação Galeno Furtado Monte, ao contrário do
que fez Pádua, admitiu a influência de Reck. Ele prestou um dos mais longos
depoimentos e afirmou que a ele cabia apenas “aplicar o edital”. “Quando a
comissão foi nomeada, recebemos o edital e o consultor (Sacha Reck). Ele nos
foi apresentado em reunião com os subsecretários Luiz Fernando Messina e José
Augusto Pinto Júnior. Ele (Reck) era o responsável pela parte jurídica, fazia
os textos e as atas, e os trazia para que eu assinasse”, admitiu.
O nome de
Messina, hoje chefe de gabinete de Rodrigo Delmasso (PTN) — membro suplente da
CPI —, também foi citado por Umberto Rafael de Menezes Filho, integrante da
primeira fase da comissão de licitação. Ele confirmou, em depoimento, ter
alertado o então subsecretário por meio de um documento entregue em mãos que a
proposta aprovada “dobraria o valor das tarifas técnicas”. A alteração ocorreu
após a retificação no edital da licitação, que anteriormente previa um valor de
R$ 1,50.
A serem ouvidos
De acordo
com o presidente da CPI, Bispo Renato Andrade (PR), Messina deve ser ouvido na
quinta-feira, assim como Augusto Pinto. Os depoimentos do vereador Jorge
Bernardi, presidente da CPI do Transporte Coletivo de Curitiba, e de Samuel
Barbosa dos Santos, diretor jurídico do DFTrans na época do certame e membro da
comissão — esse último tinha a presença esperada há 15 dias —, devem
ocorrer em breve. “A conclusão a que chegamos é que a licitação foi danosa ao
Estado. Os vícios no processo deveriam levar à anulação do processo”, disse o
deputado. Apesar disso, o requerimento para ouvir Sacha Reck nem sequer foi
aprovado pelos integrantes da CPI. A assessoria do distrital afirma que “se
nada mudar, Sacha Reck será ouvido em 1º de outubro”.
Sem lucro
O sistema de transporte
público do DF é operado por empresas privadas. O valor pago pelo usuário não
cobre os custos operacionais. Por isso, o governo complementa a diferença com a
chamada tarifa técnica.
Para saber mais - Improbidade
administrativa
Em maio
deste ano, a Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social
(Prodep) do MPDFT ajuizou ação de improbidade administrativa devido à licitação
de 2012 contra Reck, Vazquez, Furtado e o ex-coordenador da Unidade de
Gerenciamento do Programa de Transportes Urbanos, José Pinto Junior. Para o
órgão judiciário, a atuação do advogado no certame como consultor da secretaria
enquanto prestava serviço para empresas vencedoras da concorrência vai contra
as regras da Lei de Licitações e Contratos. O MP também aponta outras
irregularidades ocorridas no processo.
Documentos contra Reck
O Correio teve acesso a documentos que reforçam as denúncias
da influência de Sacha Reck e do direcionamento da licitação do transporte
público no Distrito Federal. Em um deles, em papel timbrado com o nome do
escritório do advogado, há o texto base para uma ata de reunião para julgamento
final de recursos administrativos. O texto é praticamente idêntico àquele com a
logomarca da Secretaria de Transportes (Veja fac-símile). Também levanta
suspeita o fato de o Consórcio Metropolitano ter entregue proposta com tarifa
R$ 0,59 mais barata e, ainda assim, ter perdido a licitação.
O
Consórcio Metropolitano disputou com a Piracicabana a exploração da Bacia 1
para transportar passageiros do Plano Piloto, de Sobradinho, de Planaltina, do
Cruzeiro, de Sobradinho 2, do Lago Norte, Sudoeste/Octogonal, Varjão e
Fercal. Apresentou ao governo, em 1º de fevereiro de 2013, a proposta de R$
2,0602 para a tarifa técnica. A Piracicabana, por sua vez, pediu R$ 2,6555 a
fim de prestar o mesmo serviço. A proposta foi entregue em 18 de janeiro do
mesmo ano. Apesar de o valor ser 22,4% mais alto, a Piracicabana venceu o
certame.
Fonte:Guilherme Pera - Matheus Teixeira - Adriana Bernardes – Correio Braziliense – Foto: Ed Alves – CB/D.A. Press