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Violência: "Chega de estupidez

Seis famílias narram o drama vivido com os filhos espancados no Distrito Federal, geralmente em lugares destinados à diversão. Todos reclamam das sequelas e da falta de punição aos acusados, apesar da extrema agressividade empregada nos ataques.
Diante do Supremo Tribunal Federal (STF), vítimas (à frente) e familiares demonstram revolta e indignação com as punições determinadas pela Justiça aos acusados de agredi-los.

Por: Saulo Araujo - Correio Braziliense - 26/02

"Ninguém foi punido. No fim das contas, só eu paguei o preço" Caio Rodrigo Lessa, 18 anos, atacado em frente ao Caseb em julho de 2010.

"Bateram para me matar. No mínimo, deveriam responder por homicídio culposo" Gabriel Pereira de Souza, 22 anos, vítima de espancamento no Pier 21 em julho de 2007
"Ele (o agressor) responde por lesão corporal e sabe que não vai para a cadeia" Leonardo Guimarães Moreira, 19 anos, agredido no Lago Norte em outubro de 2012
"Evito sair à noite por medo de me ver novamente frente a frente com esses covardes" Augusto César de Freitas, 27 anos, agredido com uma pedrada no rosto em 2011.

“Eu não sei se o meu irmão vai poder andar de bicicleta, correr e nadar, coisas que ele amava fazer.”  O desabafo da bancária Sara Silva Lopes Xavier, 30 anos, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), tinha como alvo a Justiça. Irmã de Lucas Silva Lopes Xavier, 27, espancado no último domingo no Shopping Pier 21, ela teme que o caso do professor de educação física caia no esquecimento e os dois agressores não sejam punidos (leia mais na página 20). A preocupação dela faz sentido. Na tarde de ontem, o Correio reuniu Sara e cinco famílias de jovens linchados no Distrito Federal. Apesar da violência, em nenhum dos casos, os autores das barbáries receberam punição exemplar.

Em comum, todos carregam o trauma e a revolta das agressões desmedidas. Enquanto conversavam, os que sofreram com a brutalidade no passado se colocavam no lugar de quem está em recuperação. O servidor público Gabriel Pereira de Souza, 22 anos, quase morreu ao receber socos e pontapés a poucos metros de onde Lucas foi covardemente agredido, também no shopping Pier 21, no Setor de Clubes Sul.

Em julho de 2007, Gabriel foi deixado desacordado no estacionamento externo do centro comercial. Cinco recrutas da Aeronáutica tinham como alvo o amigo do garoto, que conseguiu fugir. O grupo, então, decidiu descontar a raiva no rapaz franzino, à época, com 15 anos. Ele não correu, para proteger a namorada. Gabriel lembra ter recebido golpes na cabeça e no rosto. Como resultado, ficou 40 dias sem poder abrir a boca. Nesse período, só se alimentava por meio de um canudo. “A dor física era imensa, mas não havia nada pior do que ver a minha mãe chorando ao bater os alimentos no liquidificador”, contou.

O caso foi registrado na 1ª DP (Asa Sul), a mesma unidade que investiga o espancamento de Lucas. Indignado pela condução do inquérito, Gabriel retirou a queixa. “O indiciamento foi por lesão corporal. Eu ia me expor tendo de ficar frente a frente com esses marginais durante as audiências para, depois, eles serem condenados a pagar cesta básica. Bateram para me matar. No mínimo, deveriam responder por homicídio culposo”, revoltou-se.

Deboche na audiência
Quem também demonstra indignação com o tratamento dado pela polícia e pela Justiça ao seu caso é o estudante de direito Leonardo Guimarães Moreira, 19 anos. Em 28 de outubro de 2012, ele foi cercado por três jovens na saída de uma festa no Lago Norte. Entre os agressores, estava o aluno de engenharia da UnB Fabrício Macedo, então com 19 anos. Os golpes desferidos pelo praticante de artes marciais e por dois adolescentes causaram danos graves. A vítima implantou 15 pinos e duas placas de titânio no rosto. Enquanto Leonardo enfrentava uma dolorosa e longa recuperação, Fabrício frequentava os mesmos lugares. “Ele debocha de todos na audiência, inclusive do juiz. Está respondendo apenas por lesão corporal e sabe que não vai para a cadeia. A sensação é de impunidade e de impotência.”

Já a covardia contra o estudante Caio Rodrigo Lessa, 18, deixou sequelas irreversíveis. Espancado por 13 adolescentes em julho de 2010 por defender a prima, alvo de gozações de colegas em frente ao Caseb, na 909 Sul, o jovem carrega uma grande cicatriz no lado esquerdo da cabeça. A visão ainda ficou comprometida. “Eu fico tonto quando corro e esqueço as coisas. Ninguém foi punido. No fim das contas, só eu paguei o preço”, disse.

Os pais de Yan Lopes Xavier, 18 anos, também procuram entender as razões que levaram mais de 10 rapazes a bater no jovem. O crime aconteceu na 105 Sul, à luz do dia. Yan teria sido confundido com um ladrão de carros. Escapou da morte graças à interferência de agentes do Departamento de Estradas de Rodagens (DER). “Essa selvageria não tem cabimento na nossa sociedade. Ontem, foi o meu filho; hoje, o Lucas; e amanhã, será outro. O sentimento que fica é de descaso”, queixou-se o pai de Yan, o policial civil Antônio Xavier, 46 anos.

Enquanto o grupo compartilhava dramas pessoais, o namorado de Sara — irmã de Lucas, cujos acusados estão detidos e tiveram ontem à noite a prisão preventiva decretada —, Augusto César de Freitas, 27, revelou ter sofrido violência parecida há três anos, na Vila Planalto. Ao sair de uma festa, acabou agredido com uma pedrada no rosto. Os autores da agressão integravam um grupo de baderneiros que promovia arrastões na entrada do evento. “Até hoje, sou extremamente assustado com isso. Evito sair à noite por medo de me ver novamente frente a frente com esses covardes”, contou.

Punição mais branda
O artigo 129 do Código Penal Brasileiro estabelece pena de 1 a 8 anos para quem for indiciado pelo crime de lesão corporal. Normalmente, os condenados cumprem penas alternativas. Já a tipificação de tentativa de homicídio prevê punição de 6 a 20 anos em regime fechado.

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