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Eleições 2014 » Desânimo entre o eleitorado jovem

Corrupção, falta de estímulo da família e ausência de propostas destinadas a esse público são apontados como os principais motivos que distanciam os adolescentes do processo eleitoral. Este ano, apenas 35% deles tiraram o título para ir às urnas em outubro.

Marcos André, Andreia Naoni, Pedro Henrique, Marytza e Clara refletem a desilusão da juventude do DF com a política: desesperança e falta de interesse.

Ter o direito de votar, mas não querer exercê-lo. Esse é o perfil de adolescentes brasilienses que tiraram o Título de Eleitor por pressão dos pais ou sequer requisitaram o documento. Apesar de terem idade e garantia legal para escolher os futuros governantes do país e da unidade da Federação em que vivem, preferem não tomar para si essa responsabilidade. O último levantamento do IBGE revela que, há quatro anos, o Distrito Federal tinha aproximadamente 86 mil jovens entre 12 e 13 anos. Este ano, portanto, eles poderiam ir às urnas pela primeira vez. Número significativo, porém reduzido por conta da falta de interesse dessa parcela da população pela política. Dados do Tribunal Regional Eleitoral do DF (TRE-DF) mostram que apenas 35% desse contingente tiraram o título para as eleições de 2014, o equivalente a 30.591 pessoas. 

Os motivos são muitos. Falta de estímulo da família, prioridades diferentes, desgosto pela política e até preocupação com o vestibular. Mas a principal queixa dos futuros eleitores é a ausência de candidatos com propostas interessantes e voltadas especificamente para eles. Concorrentes sem sintonia com as ideias e sem contato direto com os jovens também tem feito os adolescentes recusarem as urnas. “Não vejo uma coisa melhor, existe uma desesperança. Nós temos o poder de decidir uma eleição, somos muitos, mas precisa de um diálogo maior, que poderia aumentar o meu interesse”, diz a estudante Clara Sandri de Oliveira Passos, 17 anos, que não tirou o Título de Eleitor.

Na casa da estudante Marytza Rafaela Barros de Macêdo, 17 anos, não houve incentivo. O pai não se liga no assunto e não houve pressão para tirar o documento. Por escolha própria, a garota preferiu deixar para pensar no voto nas eleições de 2018. Ela admite que o comportamento do pai pode ter influenciado, mas relaciona a falta de interesse, principalmente, à imaturidade. Marytza acha que ainda é cedo. “Não me sinto preparada. E, quando olho de fora, tenho a impressão de que todos os políticos são iguais. Preciso viver isso mais na prática. Além disso, tenho apenas 17 anos, não vou me ligar 100% em política. Tenho a minha vida”, afirma a adolescente. Outro ponto importante para ela é a credibilidade. Ela acredita que os jovens não são “levados a sério”. “Quando fiz um trabalho em grupo na escola, tentamos ir à Câmara, mas eles nunca responderam. Acham que a gente não tem voz ativa. Não acreditam no poder do nosso voto. Será que são os jovens têm que mudar ou são os políticos?”, provoca.

Contradição


Os mais antenados com o assunto, que conhecem os candidatos aos principais postos públicos do DF, associam o desânimo à corrupção. Para eles, a presença de ex-políticos, alguns com processos judiciais e condenações, ajuda a querer desviar o foco das eleições. “Até me interesso por política, mas vejo candidatos envolvidos em escândalos que continuam por aí. Como pode?”, critica Andréia Naomi Kaya, 17 anos. Ela vai à escola de ônibus diariamente e reclama do serviço de transporte. No entanto, apesar de sentir na pele os problemas, prefere não influenciar no futuro da cidade. “Eu vou ajudar as outras pessoas, falando sobre essas coisas, mas quero mais tempo. Não vejo boas opções”, diz. Fernando Bonfim, 17, é mais categórico. “Não tem candidato que preste.” Ele participou das manifestações do ano passado, mas acredita que os postulantes ao Governo do DF nestas eleições não são capazes de realizar as mudanças necessárias, principalmente as solicitadas nos protestos.


Parcela considerável

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Distrito Federal tem, hoje, 1.897.677 eleitores. Os jovens de 16 a 24 anos somam 16,8% do total do Distrito Federal (DF) e representam uma parcela considerável da população, que pode fazer a diferença nas urnas em outubro — cerca de 380 mil votantes.


Título em troca de viagem.

Para a psicóloga Ângela Branco, é preciso que pais e escola incentivem.

Em 2010, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) registrou aproximadamente 59 mil eleitores candangos entre 16 e 18 anos. Para este ano, a soma desse segmento é mais animadora. O número de votantes subiu para 71.483. No entanto, mesmo com o documento na mão, não há garantias de que eles vão às urnas. Assim como o estudante Marcos André de Melo Filho, 16 anos, outros adolescentes fizeram o alistamento, mas não pretendem participar do processo. “Não queria tirar. O meu pai que pediu. Na negociação, eu troquei o título por uma viagem. Fiz, mas não vou votar. Não sou obrigado, não estou muito a fim e tenho medo de fazer alguma besteira”, comenta. Pedro Henrique Pires, 17, aponta as opções de candidatos como a maior fonte de desânimo. “Tem um pouco de desesperança. A minha família também nunca se interessou e acho que o voto anda perdendo a importância porque esses candidatos não têm condições de representar o povo”, analisa.

Segundo a doutora em psicologia do desenvolvimento pela Universidade de Brasília (UnB) Ângela Branco, será preciso ocorrer uma mudança cultural no país para, em seguida, ser possível trabalhar na cabeça dos jovens um novo conceito. “Enquanto o discurso for de que política é só safadeza e falta de ética, os jovens vão desviar do tema. Eles têm outras coisas interessantes nessa idade para se ater. Além disso, o assunto precisa ser trabalhado dentro de casa e na escola. A gente constata que a política está desmoralizada”, afirma. (CC)


Correio Braziliense - 16/08/2014


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