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SAÚDE » Três anos de dedicação

Hospital da Criança faz aniversário hoje. Com ele, comemoram funcionários, enfermeiras, médicos, voluntários e os mais de 1,1 milhão de pequenos que passaram pelas salas e corredores da unidade. Objetivo dos responsáveis é chegar a 80% de cura de quem chega até lá.

Por: Saulo Araujo - Correio Braziliense 
Publicação: 23/11/2014



Natanael, a mãe de Tatiana, e a técnica em enfermagem Edna: depois de três anos de tratamento bem-sucedido, o menino vai embora (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Natanael, a mãe de Tatiana, e a técnica em enfermagem Edna: depois de três anos de tratamento bem-sucedido, o menino vai embora


Sala de espera: um espaço para ricos e pobres trocarem experiências  (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Sala de espera: um espaço para ricos e pobres trocarem experiências


Um trenzinho, na entrada, mostra que o lugar é feito para as crianças (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Um trenzinho, na entrada, mostra que o lugar é feito para as crianças


Manhã de quinta-feira. O relógio marcava 8h16 quando Natanael Medeiros do Vale entrou pela última vez no centro cirúrgico do Hospital da Criança de Brasília José Alencar. Após ser submetido a centenas de punções na lombar, três transfusões de sangue e um procedimento para implante de cateter, o garoto de 5 anos concluía um longo e doloroso tratamento contra uma leucemia linfoide aguda. O procedimento para a retirada do tubo flexível do peito era a etapa final. Natanael estava livre da doença. 

A história de superação do menino se confunde com a do próprio hospital. Hoje, o estabelecimento de saúde referência em oncologia pediátrica completa três anos — e atende também outras doenças dos pequenos, como problemas de crescimento, subnutrição e diabetes. Natanael foi o primeiro paciente internado no local. Depois dele, mais de 1,1 milhão de crianças e adolescentes receberam atendimento na unidade situada no Setor de Áreas Isoladas Norte (Sain). Como o menino, o hospital conseguiu curar mais de 70% dos pequenos que deram entrada na unidade com alguma patologia grave, índice de países de primeiro mundo. 

Para explicar o sucesso dos números, é preciso entender o hospital além da competente equipe médica. Na recepção, mães angustiadas são recebidas por sorridentes e prestativas atendentes. A preocupação com o estado de saúde dos filhos é amenizada por um ambiente colorido e que pouco lembra um lugar que concentra enfermidades tão nocivas. Servidores da limpeza, vigilantes, enfermeiros, médicos, assessores de comunicação e todos os funcionários se mostram dispostos a ajudar a qualquer momento, seja fornecendo uma simples informação seja oferecendo uma palavra de conforto. É como se o espírito solidário da internação de Natanel, há três anos, tivesse se multiplicado.

A mãe dele, Tatiana Medeiros do Vale, 38 anos, descobriu a doença do filho no fim de outubro de 2011. Àquela altura, o Hospital da Criança estava pronto, mas a burocrática festa de inauguração só aconteceria dias depois. A equipe médica que cuidava do menino no Hospital de Base do DF (HBDF) decidiu interná-lo antes. Enquanto autoridades da cidade cortavam fitas e posavam para fotos, o garoto já começava a fazer sessões quimioterapia. “O diagnóstico foi terrível, ficamos sem chão. O que nos deu força foi a forma como eles abraçaram a causa. Era uma incansável luta pelo bem-estar do meu filho. Hoje, ele encerra o ciclo no hospital — voltará apenas a cada seis meses para fazer acompanhamento —, mas a família toda levará no coração a gratidão de todos aqueles que contribuíram para a recuperação dele”, contou Tatiana, que à época abriu mão de um bom salário como promotora de eventos na Caixa Econômica Federal para se dedicar integralmente ao filho.

Voluntários

Não falta gente que decidiu desistir de momentos de lazer para doar amor aos pacientes. São 205 voluntários cadastrados, distribuídos em 13 grupos. Eles tornam a estadia no hospital menos triste. Os funcionários também exercem participação importante na elevação da autoestima dos familiares e das crianças com câncer. Manuella Alves Batista, 6 anos, mostrava, na terça-feira última, orgulhosa, uma medalha de Nossa Senhora Aparecida recebida de uma vigilante. 

Popular no hospital, Manu arranca sorrisos até dos mais tímidos. Também em tratamento contra uma leucemia, apelidou toda a equipe médica. Nem a supervisora de enfermagem, Érica Fontes, escapou da língua afiada da garota, que sonha em bombeira. “Ela (Érica) eu chamo de chefe, porque ela é chefe, uai! É a que eu mais gosto no hospital. Às vezes, me dá chocolate”, explicou a menina. Um dia antes de a reportagem do Correio entrevistar a garota, os cabelos dela caíram. O pai, Paulo Sérgio Antônio Batista, 45 anos, filmou o delicado momento. Mas, em vez de choro, risos. “Ela achou engraçado ficar sem cabelo e, como sempre, fez piada”, contou o policial militar.

A mãe, Sandra dos Santos, 40, diz ter amadurecido com a experiência de passar longos períodos entre idas e vindas ao hospital acompanhando Manu. “Às vezes, chego aqui tão para baixo que basta um abraço para me fortalecer. O mais incrível aqui é que os funcionários têm essa sensibilidade de perceber quando você não está bem. A Manu também ajuda muito. Não admite tristeza e briga se vir alguém chorando por causa dela.”

Muito dessa alegria contagiante da menina vem da relação construída com os funcionários. “Nos momentos mais complicados, nós somos a fortaleza das famílias. Quem trabalha aqui preza muito pelo princípio da equidade e gentileza, o resto é consequência”, destaca Érica, a “chefe” de Manuella e supervisora de uma equipe composta por mais de 100 profissionais. 

Gratidão
Muitas crianças e adolescentes perdem a batalha contra o câncer e, mesmo em meio ao luto, os pais não deixam de reconhecer os esforços de quem trabalhou para prolongar a vida de seus filhos. A maioria volta ao local para agradecer. Alguns fazem questão de presentear os profissionais com os quais os filhos criaram mais afinidade durante o tratamento.

Quando esgotados todos os meios para buscar e não conseguir a cura, o tratamento da criança continua, mas o foco passa a ser a qualidade de vida dela. “Quando não há mais chance de cura, passamos a ministrar medicação para preservar a qualidade de vida e evitar a dor. Durante esse processo, vamos preparando os familiares e os profissionais que cuidaram daquela criança durante tanto tempo”, explicou Érica.




"O diagnóstico foi terrível, ficamos sem chão. O que nos deu força foi a forma como eles abraçaram a causa. Hoje ele encerra o ciclo no hospital, mas a família toda levará no coração a gratidão de todos aqueles que contribuíram para a recuperação dele”


Tatiana Medeiros do Vale, mãe de Natanael, primeiro paciente do hospital

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