Carlos Chagas
A presidente Dilma tem quinze dias para definir o ministério do segundo mandato, ou, pelo menos, o ministério que começará o segundo mandato. Já se reuniu com líderes e dirigentes dos partidos que apóiam seu governo, encontrou-se mais de uma vez com o Lula e com o vice-presidente Michel Temer, conversa todos os dias com Aloísio Mercadante, chefe da Casa Civil, mas, até agora, dos 39 ministros novos e velhos a ser nomeados em solenidade no palácio do Planalto, no primeiro dia de janeiro, poucos receberam convites formais.
A hesitação deve-se ao desconhecimento, pela presidente, da lista de políticos que serão denunciados pelo procurador-geral da República como envolvidos na roubalheira da Petrobras. A versão é de que seriam mais de trinta deputados e senadores, entre eles caciques em condições de ser escolhidos ministros ou, ao menos, de recomendar seus preferidos. O governo ficará desmoralizado caso um político indicado para ministro fizer parte das denúncias. Pior, no entanto, se acontecer depois da nomeação e da posse, com prazo já fixado.
Uma solução, para Dilma, seria fazer chegar a Rodrigo Janot a importância de pronunciar-se até 31 de dezembro. Envolto na análise das delações premiadas, ninguém garante que ele atenderia a um suposto apelo nesse sentido. Sendo assim, caracteriza-se uma situação singular: a presidente prestes a inaugurar seu segundo mandato ainda não sabe com quem irá governar. Está em sinuca.
LEMBRANÇAS
Houve tempo em que os presidentes da República tomavam posse a 31 de janeiro, aliás, data bem mais oportuna do que a fixada atualmente pela Constituição, quando metade do país amanhece de ressaca.
Getúlio Vargas havia sido eleito em outubro de 1950 e ficou recolhido em sua fazenda, no Rio Grande do Sul. Não se sabia ao certo quando chegaria ao Rio de Janeiro. Naqueles idos, os políticos não viajavam de jatinhos particulares, mas em aviões de carreira. Os principais jornais da então capital federal designaram seus melhores repórteres para ficar de plantão na calçada do edifício onde o presidente eleito tinha apartamento, na Avenida Rui Barbosa. Certa noite, de um taxi vindo do Aeroporto Santos Dumont, Getúlio desembarca, acompanhado de um auxiliar. Cercado imediatamente pelos jornalistas, improvisa uma entrevista onde o tema principal era a formação do ministério. Revelou alguns nomes, até aceitando a afirmação de um repórter sobre ser aquele o “ministério da experiência”, ou seja, sem muita convicção de que os escolhidos permaneceriam ministros até o final de seu mandato.
Junto com os cardeais da reportagem encontrava-se um jovem foca, representante de uma estação de rádio, com um daqueles imensos gravadores da época, que mais parecia um paraquedas colado em suas costas. Tímido, nada falou, até que Getúlio notou seu embaraço e indagou: “você, jovem, não tem nenhuma pergunta?”
Nervoso, tremendo, ele percebeu que todas as indagações importantes já tinham sido feitas. Embotado pela presença do novo presidente, soltou a primeira que lhe veio à cabeça: “O que o senhor acha da campanha das Casas Gebara para baratear o custo de vida?”
As emissoras há dias divulgavam aquela publicidade, com um jingle que tomou conta do país. Surpreso, Getulio respondeu tratar-se de uma iniciativa muito louvável, digna de elogios. O jovem voltou para a redação arrasado, disposto a não seguir a carreira de jornalista, sentindo-se desmoralizado por não ter feito uma pergunta relacionada com o futuro governo. Um diretor ia passado, ouviu as lamentações e logo exigiu a gravação, feita em fio. Procurou o dono das Casas Gebara, faturou horrores e no dia seguinte a publicidade que o Brasil inteiro aplaudia ganhou um acréscimo, junto com o jingle: “Agora, ELE vai falar!” Seguia-se o comentário de Getúlio Vargas, para deleite dos ouvintes.
O jovem, Mário Garófalo, fez brilhante carreira no rádio brasileiro, tornando-se proprietário de uma das emissoras mais populares de Brasília. Mas comentava com muita graça não haver recebido um centavo sequer por conta daquele furo monumental…