O reajuste nas regalias de deputados custará aos cofres públicos R$ 112,7 milhões apenas este ano e R$ 150,7 milhões a partir de 2016
Após anunciar o reajuste nos benefícios e a volta da farra
das passagens, Eduardo Cunha diz que tocará obras de ampliação da Casa,
incluindo anexo e centro comercial. Custo é de R$ 1 bilhão
Depois de anunciar a liberação das passagens aéreas para
cônjuges de parlamentares e o reajuste geral de todas as benesses recebidas por
deputados, com impactos da ordem de R$ 112,7 milhões apenas em 2015, o
presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), reforçou a intenção de tirar do
papel outra promessa feita na campanha para a presidência do órgão: a ampliação
do espaço físico da Casa. O projeto envolve a construção de ao menos três novos
prédios, que contemplariam um novo plenário, maior do que o atual, e até mesmo
uma espécie de shopping center, que ficaria a cargo da iniciativa privada. O
custo total da empreitada é estimado em cerca de R$ 1 bilhão por integrantes da
Mesa Diretora, que começará a tratar do tema já na próxima semana.
“Estamos
estudando fazer essa ampliação por meio de parceria público-privada (PPP).
Temos dinheiro em caixa para a obra, mas vamos trabalhar para ter o menor
custo. Se possível, a custo zero para a Câmara”, disse Eduardo Cunha, na tarde
de quinta-feira.
Segundo
o primeiro-secretário, deputado Beto Mansur (PRB-SP), a Câmara dispõe de cerca
de R$ 300 milhões guardados para a ampliação. O objetivo da PPP, segundo ele, é
guardar esse recurso. “Na legislatura passada, foi incluída uma alteração em
uma Medida Provisória (a de nº 656) para permitir que o Legislativo também
pudesse celebrar parcerias público-privadas. Mas foi vetado pela (presidente)
Dilma (Rousseff). Agora, estamos discutindo como faremos. Ou derrubamos o veto,
ou incluímos o tema numa nova MP”, diz Mansur. “O chamariz para atrair a
iniciativa privada seria justamente a construção de uma espécie de shopping,
que ficaria atrás desses prédios, afastado por uma praça. Assim, a empresa que
ganhasse (a concorrência) poderia explorar as lojas e as vagas de estacionamento,
e nós obteríamos as obras que precisamos”, disse ele. O tema será discutido na
próxima reunião da Mesa, segundo Mansur.
Conforme
antecipou o Correio no início do mês, o Departamento Técnico (Detec) da Câmara
tinha uma proposta de licitação pronta para a construção do Bloco B do Anexo
IV, com custo estimado em R$ 285 milhões. “(O bloco B) estava pronto para ser
licitado. Aí veio a mudança da Mesa (Diretora) e entrou o deputado Eduardo
Cunha, que disse: ‘Esse prédio vai resolver todos os problemas?’. Nós dissemos
que não, pois os deputados vão precisar de gabinetes maiores, e o novo prédio
não possibilitaria isso. Precisamos de um plenário maior, que a gente não
consegue colocar aqui. Tem um deficit de vagas de garagem também. Então ele
disse: ‘Quero estudar algo diferente, que resolva”, descreveu o diretor do
Detec, o engenheiro Maurício da Silva Matta.
Capacidade
maior
A
última proposta elaborada pelo Detec, de abril de 2014, previa a construção de
um novo edifício, de três andares, no espaço hoje ocupado pela garagem do Anexo
IV, e a construção de um prédio idêntico ao existente hoje, no lado oposto. A
estrutura do meio receberia um novo plenário, com capacidade para 670 pessoas,
que seria usado em situações de emergência ou para receber sessões do Congresso.
“Vamos
deixar esse auditório todo preparado para funcionar como plenário em uma
situação emergencial”, diz Matta. O Plenário Ulysses Guimarães, em comparação,
tem 398 assentos. Eduardo Cunha, porém, garantiu que a estrutura não será
aposentada. “Quando nós falamos para o presidente, ele disse que ‘o plenário
nunca vai ser substituído. Aquele plenário tem história, tem peso’”, contou o
engenheiro.
A
ideia divide opiniões dos líderes partidários ouvidos pela reportagem. “Vou
consultar a bancada na próxima semana sobre isso, mas, grosso modo, sou contra.
Especialmente, em virtude da situação em que o país se encontra. Os Poderes da
República não deveriam estar pensando em obras suntuosas neste momento”,
criticou o líder do PPS, Rubens Bueno (PR).
Já o PT
apoiará a construção de um novo anexo na Câmara. “O Congresso de hoje está
praticamente inviável, sem salas suficientes para reuniões”, reclamou o líder
do PT na Câmara, o deputado federal Sibá Machado (AC). “A construção de um novo
prédio é uma necessidade e não temos de ter vergonha de afirmar isso. Essa era
uma proposta do Arlindo (Chinaglia), que conseguiu levantar mais de R$ 300
milhões para a obra. Temos dinheiro em caixa para essa finalidade”, defendeu.
Folha
No
Orçamento de 2015 (que ainda não foi aprovado), a Câmara reservou cerca de R$ 5
milhões para a obra, o que não chega nem perto dos custos estimados pela Mesa
Diretora. Outra fonte de recursos aventada por Cunha é o dinheiro da venda da
folha da Casa, que recebe um bônus em dinheiro dos bancos escolhidos para fazer
os pagamentos aos servidores e comissionados. Como o contrato deve ser renovado
em breve, outra parcela entraria em caixa. Em 2007, porém, o então presidente
da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP) acabou frustrado ao tentar utilizar o
dinheiro da “venda da folha” para essa finalidade
.
Na
ocasião, o Tribunal de Contas da União (TCU) emitiu parecer informando que os
recursos obtidos com a prática iriam para o Tesouro e só poderiam ser usados
pela Câmara depois de serem transferidos para a rubrica do órgão, por meio da
aprovação de créditos especiais.
de segurança
O líder da bancada do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP) não conseguiu fechar acordo com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para rever a concessão de passagens aéreas a esposas e maridos de parlamentares. Ontem, o tucano impetrou no Supremo Tribunal Federal (STF) mandado de segurança pedindo a suspensão do benefício, autorizado por uma decisão da Mesa Diretora da Câmara. Na petição, Sampaio argumenta que a medida atenta contra o princípio constitucional da moralidade. Ele alega ainda que a mudança só poderia ter sido feita por meio de um projeto de resolução, com apreciação em plenário. Mais de 150 mil pessoas haviam assinado, até a noite de ontem, uma petição no site Avaaz, que pede que os deputados revejam o reajuste nas mordomias. A petição, criada na quinta-feira, está no ar no endereço avaaz.org. (AS)
Memória - Coautoria de Niemeyer
A construção de novos prédios na Câmara — sobretudo para
abrir gabinetes — é uma demanda dos parlamentares há quase uma década. O
processo iniciou-se ainda na gestão do hoje ministro Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
“Nós não podíamos fazer um prédio tão alto aqui (ao lado do Anexo IV) porque o
gabarito não permitia. Mas o (Oscar) Niemeyer, desde a construção de Brasília,
tinha a prerrogativa de mudar isso. Como nós fizemos o estudo em coautoria com ele,
ficou autorizado. Isso levou uns dois anos para ser aprovado”, descreve o
engenheiro e diretor do Departamento Técnico da Câmara, Maurício Silva da Matta.
“Aí
veio a gestão de Chinaglia, quando surgiu a ideia de vender a folha de
pagamento para pagar a obra”, conta. “Quando a gente ia detalhar o projeto de
instalação, acabou a gestão dele.” Ainda segundo o engenheiro, a ideia acabou
paralisada nas gestões de Michel Temer (PMDB-SP), Marco Maia (PT-RS) e Henrique
Eduardo Alves (PMDB-RN). (AS)
Fonte: Naira Trindade – André Shalders - Correio Braziliense – 29/02