Alana Mendes está prestes a se aposentar: estabilidade, segurança e falta de espaço no setor privado a empurraram para o serviço público há 19 anos.
Estudo mostra que 44% dos
funcionários do GDF têm mais de 46 anos e apenas 1,81% estão abaixo dos 25
anos. Para especialistas, isso mostra a necessidade de o governo abrir novos
concursos para repor as aposentadorias que estão por vir.
O quadro de pessoal do Governo do Distrito Federal
está mais velho. Com 44% dos 108.684 funcionários acima de 46 anos, o retrato
do funcionalismo público local é de profissionais experientes. Em
contrapartida, apenas 1,81% dos servidores têm menos de 25 anos. Na análise de
especialistas, essa situação pode ser entendida de várias formas. De um lado,
mostra que as poucas vagas atrativas na iniciativa privada, por falta de um
setor produtivo forte, fazem com que uma carreira no serviço público do DF seja
uma boa alternativa de emprego. Por isso, quem entra não quer sair e acaba
dedicando toda a vida profissional ao setor público. Pode mostrar também um
desinteresse dos jovens pelo serviço público. “Ao mesmo tempo, a pouca
porcentagem de jovens pode indicar que eles estão com mais tempo para se
preparar; por isso, se qualificam mais e vão direto em concursos de salário maior,
com idade superior a 25 anos”, acredita Débora Barem, professora do
Departamento de Administração da Universidade de Brasília (UnB) e especialista
em mercado de trabalho.
Os dados com a radiografia sobre o funcionalismo público no DF foram elaborados
pela Escola de Governo do Distrito Federal (Egov). Com as informações, os
responsáveis pela escola pretendem planejar melhor o futuro da administração
pública. Para José Wilson Granjeiro, diretor executivo da Egov, a idade dos
servidores alertou para a necessidade do governo em preparar futuros concursos
públicos, uma vez que muitos funcionários já estão perto da aposentadoria e
será preciso repor mão de obra. “O GDF está com um quadro envelhecido. Esse
estudo vai ajudar o governo a programar a reposição de quadros. Vamos ter
milhares de funcionários em condições de se aposentar e em vários setores. Por
isso, o governo tem que se programar para renovar os quadros — caso contrário,
ou o serviço público vai parar ou ficará comprometido. Mas isso, em uma política
futura.”
A escola pública tem um poder de transformação social e dá mais autonomia pedagógica para os professores Juliana Vieira de Freitas Galeazzi, professora
São perfis como o da psicóloga Alana Dias Mendes,
56 anos, que trabalha há 19 no serviço público. Ela conta que migrou do setor
privado e afirma não se arrepender da decisão, apesar das dificuldades
encontradas no caminho. “Pude prestar atendimento a uma classe social que tem
necessidade e não tem condição de pagar. É gratificante poder fazer algo por
essas crianças”, completa. Ela é servidora da Secretaria de Estado de Educação
do Distrito Federal (SEDF) e trabalha na Escola Classe 403 Norte há 10 anos.
Entre os motivos que a fizeram optar pela rede pública, estão a estabilidade e
a segurança que o concurso traz e a falta do serviço de psicólogos em escolas
privadas. Alana se prepara para a aposentadoria e, na semana passada, deu
entrada no processo. “Vou me aposentar, mas não quero parar. Vou trabalhar em
clínica de novo e fazer trabalhos voluntários com crianças.”
Como 17,23% do quadro dos funcionários do GDF, Alana tem pós-graduação — no caso dela, em educação especial e gestão de pessoas. O que mostra a alta especialização dos servidores, 39,06% deles têm nível superior. “A alta porcentagem de pessoas com pós-gradução é um reflexo da cidade de Brasília, que tem muitos centros de ensino de qualidade e as pessoas estudam mais que a média nacional. Além disso, quem se qualifica recebe as gratificações, o que é um incentivo”, explica Aldo Paviani, geógrafo, professor emérito da UnB e diretor de estudos urbanos e ambientais da Companhia de Planejamento do Distrito Federal.
Para a professora Débora Barem, a maior disponibilidade para fazer uma pós-gradução no serviço público também contribui para a alta taxa de escolaridade. “Boa parte dos mestrados e doutorados ocorrem durante o horário comercial. A flexibilização de horários é mais compatível no serviço público do que na iniciativa privada”, explica.
Atração e repulsão
As remunerações iniciais mais altas do que as oferecidas no setor privado e a estabilidade pesam na escolha da carreira pública. Assim como os benefícios de aposentadoria integral, que ainda existe no GDF e não mais no governo federal. Porém, a pouca infraestrutura afugenta profissionais, principalmente os mais jovens.
O médico Matheus Cabral Lelis Deleza, 25 anos, atua como funcionário do GDF no programa de residência da rede pública de hospitais e não se enxerga como médico da rede pública no futuro. Ele afirma sentir-se desestimulado. “Não vejo possibilidade de melhora, e é triste porque tem muito potencial. Não quero trabalhar sem poder proporcionar o melhor para os meus pacientes”, explica.
Elas são maioria
O contingente de 66.888 mulheres deixa o
funcionalismo público do DF bem feminino. Elas representam 61,54% entre os
servidores. O índice deve-se, em grande parte, à presença de mulheres na
Secretaria de Educação, a maioria em sala de aula. A professora Juliana Vieira
de Freitas Galeazzi, 35 anos, faz parte desse número. Há 17 anos na SEDF,
Juliana é formada em pedagogia, com as três habilitações do curso e
pós-graduação em psicomotricidade.
Juliana tinha o sonho de ser professora desde criança e, apesar da melhor
estrutura do ensino privado, nunca considerou trabalhar em escolas
particulares. “Eu me identifico mais com o público. A escola pública tem um
poder de transformação social e dá mais autonomia pedagógica para os
professores”, justifica. Apesar da preferência pelo tipo de trabalho, Juliana
enxerga diversas formas nas quais o ensino público poderia melhorar. Ela afirma
que a escola de hoje é a mesma em que ela estudou. “Parece que parou no tempo.”
A professora afirma que falta um aproveitamento melhor das verbas disponíveis.
Embora as mulheres sejam maioria, quando o assunto são os cargos de chefia, os
homens aparecem mais. Nos cargos de natureza política, com remunerações acima
de R$ 14 mil, por exemplo, os homens somam 98,9%, são 887 profissionais do sexo
masculino para nove mulheres. “As mulheres estão participando mais do mercado
de trabalho. No concurso público, elas ainda podem ganhar como os homens, mas,
quando entra chefia, o DF repercute uma cultura nacional”, diz Débora Barem.
Granjeiro rebate as críticas e afirma que, embora ainda haja diferenças, as
mulheres no DF ocupam, proporcionalmente, mais posições de chefia do que no
governo federal, por exemplo.
Por: Flávia Maia – Ailim Cabral – Correio Braziliense
– 03/03/2015