Em solenidade pública, anos atrás, o ex-presidente Lula,
tentando explicar, à sua maneira, as causas que induzem o chamado efeito estufa
ou aquecimento global, disse, a uma plateia incrédula, que a poluição só se
torna um fenômeno planetário devido à forma esférica do planeta. “Freud dizia
que tem muitas coisas que o homem não controlaria, uma delas eram as
intempéries. Essa questão do clima é delicada porque, se o mundo fosse quadrado
ou retangular e a gente soubesse que nosso território está a 14 mil quilômetros
de distância dos centros mais poluidores, ótimo, vai ficar só lá. Mas como o
mundo gira e a gente também passa lá embaixo, onde está poluído, a
responsabilidade é de todos.”
Deitando
essa lição ímpar de ciências do clima sobre o divã largo da psicanálise e
perscrutando mais detidamente nas entrelinhas dessa fala histórica, diversas
ilações podem ser extraídas daí, sem muito esforço. Talvez a mais importante e
esclarecedora de todas, já percebida anteriormente, é a de que o ex-presidente
jamais assumiu qualquer responsabilidade pessoal ou mesmo demonstrou um gesto
de autocrítica, quando teve que se defrontar com problemas sérios.
A busca
de culpados na casa do sujeito indeterminado e não sabido sempre foi uma
constante. Foi com esse discurso que Lula conseguiu governar por dois mandatos
seguidos. E é com essa mesma fala que hoje tenta empurrar para parte das
oposições — sobretudo sobre o ex-presidente FHC — as responsabilidades pelo
fracasso de seu projeto de poder pessoal.
Se a
culpa pelo aquecimento global é dos americanos, a crise econômica e política do
atual governo também é obra da herança maldita legada por FHC e dos ajustes
feitos pelo atual ministro da economia. Ao reconhecer, contudo, que a terra é
redonda (e pur si muove), Lula deixou pistas rasas em que reconhece,
inconscientemente, que os efeitos vêm a posteriori das causas, ou seja, o que
foi feito em seu governo e no da sua sucessora, levou o país, muitas voltas do
mundo depois, à situação dramática em que se encontra na atualidade.
***
A frase que não
foi pronunciada
“A
liberdade está em viver sem superstições e ilusões.”
(Contracapa
do manual ideal do eleitor)
Por: Circe Cunha – Coluna: “Visto, lido e ouvido” – Ari Cunha
– Correio Braziliense – Foto: Google