A fragilidade política do segundo governo Dilma
Rousseff tem sido um dos obstáculos à implantação do ajuste fiscal destinado a
administrar uma das mais pesadas heranças do primeiro governo: as trapalhadas
fiscais. Desde o mês passado, quando desistiu de cumprir a meta fiscal
prometida para 2015 de superavit primário equivalente a 1,13% do Produto
Interno Bruto (PIB), rebaixando esse objetivo para apenas 0,15%, aumentou a
desconfiança dos agentes do mercado na capacidade de o governo levar a cabo até
mesmo a reduzida economia de gastos.
Motivos
não faltam. Além da forte perda de receitas tributárias provocada pela
desaceleração da atividade econômica, o governo enfrenta enorme dificuldade no
campo político para viabilizar a parte do ajuste que depende de aprovação do
Congresso. “A reoneração da folha de pagamentos vai agravar a crise da economia
e o desemprego, e, por isso, temos de conversar mais com as lideranças antes de
votar essa medida.” A frase é do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente
do Senado Federal, ao justificar o provável adiamento da votação da matéria.
A inépcia
da presidente e da equipe palaciana em retomar o trânsito do Congresso Nacional
só tem feito agravar a dificuldade de diálogo com o parlamento, de resto já
bastante alterado com o avanço das apurações da Operação Lava-Jato, que ameaçam
colocar em risco figuras do comando do Congresso.
A não
aprovação da desoneração da folha ou a sua desfiguração, como já ocorreu com
outras medidas do ajuste submetidas ao Congresso, pode, de fato, comprometer a
integridade do ajuste fiscal, aumentando ainda mais as dúvidas sobre sua
eficácia. Além disso, aproxima-se a apreciação pelos parlamentares do voto do
Tribunal de Contas da União (TCU), que pode reprovar as contas da presidente
referentes ao exercício de 2014.
Há, pois,
razões de sobra para alimentar incertezas quanto ao sucesso do ajuste fiscal e,
portanto, da retomada da confiança na economia. Incerteza é, como se sabe, um
ingrediente da aversão ao risco nos mercados financeiros. O câmbio e suas
flutuações costumam ser, nesse ambiente, os primeiros termômetros a acusar a
opção de busca por proteção. Não é outra, segundo especialistas, a causa da
desvalorização do real frente ao dólar nas últimas semanas. Ontem, a moeda
norte-americana foi negociada em forte alta. Bateu nos R$ 3,50, e acabou
fechando em R$ 3,48, a mais elevada cotação em 12 anos.
Nessa
hora, o pior que pode ocorrer é a precipitação. O governo não deve cair na
tentação de intervir pesado para conter artificialmente o movimento altista,
colocando em risco a política de flutuação cambial. Afinal, estão bem claras as
razões conjunturais da temporada de alta do dólar. Acerta, portanto, o ministro
Joaquim Levy, quando garante que o dólar continuará flutuando.
Fonte: “Visão” do Correio Braziliense – Foto:
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