Quando Fernando Henrique Cardoso assumiu a presidência da
República, depois de quase duas décadas de ditadura militar e da aventura
yuppie de Fernando Collor, parecia que um sonho democrático se transformava em
realidade. Tudo era muito simples: bastava desbancarmos os militares e
elegermos os nossos representantes. Fernando Henrique e Lula éramos nós no
poder. Mas logo o sonho revelaria a face do pesadelo que estamos vivendo
nos dias de hoje.
Para o
nosso espanto e revolta, Fernando Henrique se envolvia em negociações nebulosas
com Antônio Carlos Magalhães, José Sarney e outras raposas servis ao regime
militar, no gênero toma lá e dá cá. Nós nos julgávamos traídos, mas FHC nos
ensinava, dava-nos dura lição de realidade: no sistema político vigente,
a governabilidade tem um preço muito alto. Não se governa no Brasil sem os
achacadores do PMDB, partido de aluguel a serviço de quem estiver no poder, não
importa a coloração ideológica.
Na
arquibancada da oposição, um dos mais indignados era Lula; ele
estrebuchou e se desgrenhou contra as alianças espúrias. No entanto, o que fez
Lula quando substituiu Fernando Henrique na Presidência da República? A
mesmíssima coisa, com o agravante que a turma dos tais aloprados do seu partido
aperfeiçoou o método de negociação e transformou as alianças espúrias em um
pacto sinistro com o chamado Mensalão.
O
pesadelo só estava começando e mostraria sua face verdadeira com o escândalo do
Petrolão. Toda essa volta, é uma tentativa de chegar ao óbvio. No momento
em que milhares de pessoas saem embandeiradas pelas ruas do país para protestar
contra a corrupção, execrar o PT e pedir a saída de Dilma do governo, é preciso
lembrar que a desratização do Brasil passa, necessariamente, pela reforma
política e pelo fim do financiamento de empresas. Elas são as verdadeiras
fontes da corrupção sistêmica que tomou de assalto o país.
As
investigações da Operação Lava Jato revelaram que há conexões estreitas entre a
roubalheira na Petrobras e as falcatruas na construção de estádios para a Copa
ou nas usinas do sistema elétrico. O financiamento de empresas é a matriz da
corrupção, da deformação e da desqualificação que transformou a política em um
processo de seleção dos piores elementos da sociedade e não dos melhores.
É ele que viabiliza a reeleição de bandidos de carteirinha que deveriam estar
trancafiados na Papuda, frequentam os gabinetes da República e decidem o nosso
destino.
Com esse
dinheiro sujo, eles compram votos, eleitores, mandatos, projetos de lei e
até juízes. Graças a ele, o crime compensa. As manifestações de rua são
altamente positivas. Mas, em vez de atirar a esmo em muitas direções,
elas deveriam se concentrar nos dois alvos: a reforma política e o fim do
financiamento de empresas. A riqueza das campanhas levou ao delírio do roubo e
quase quebrou o país. A desratização da política inclusive tornaria Brasília um
lugar muito mais salubre, pois os brasilienses decentes são obrigados a
conviver, compulsoriamente, com a pior gentalha que nos enviam de vários pontos
do país.
Por: Severino Francisco – Correio Braziliense – Foto: Google