Em Prova de coragem, do diretor Roberto Gervitz, Mariana
Ximenes vive uma artista plástica em busca de um sentido para a vida. Casada
com um médico, Adri engravida sem o real consentimento do marido e decide levar
adiante uma gravidez de risco. A personagem está em busca de uma felicidade na
qual deposita muitas esperanças. É uma mulher comum. Nem de perto a psicopata
de Clara, da novela Passione, ou da cantora de cabaré de Joia rara.
A
variedade de personagens é o que atrai a atriz de 34 anos quando decide se vai
ou não mergulhar em um projeto. É preciso ter algo que a desafie. “Quando o
Gervitz me chamou, ainda não tinha o roteiro”, conta Mariana, em entrevista
durante o 48º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, no qual Prova de
coragem foi exibido como parte da mostra competitiva. O próximo desafio é a
série de terror Super Max, dirigida por José Eduardo Belmonte e José Alvarenga
Júnior para a Globo. Com linguagem de cinema, roteiristas como Marçal Aquino,
Fernando Bonassi e Raphael Montes, a série ainda não tem data para estrear. “É
um seriado na Globo, sendo filmado como cinema, com diretores de cinema. Tem
até foquista!”, comemora Mariana, que faz uma enfermeira na trama, por enquanto,
misteriosa.
Recentemente,
a atriz filmou com Ruy Guerra uma participação em Quase memória, inspirado em
livro de Carlos Heitor Cony, com Cacá Diegues. Quando soube que Diegues
começaria a montar o elenco de O grande circo místico, ela tratou de se
oferecer para um teste. “Às vezes, eu sei que o teste não está avaliando minha
qualidade de atriz e acho que isso é importante, você ser avaliado naquele
personagem, ver se o diretor te olha para fazer o filme dele. Estou mega aberta
para fazer teste”, diz. No ano passado, a atriz também passou um mês e meio em
Brasília para filmar a comédia romântica Depois de você, de Marcos Ligocki.
Perfeccionista,
Mariana gosta de se concentrar em todos os detalhes de suas atividades. Quando
dá uma entrevista, desliga o celular para não ser perturbada. Se vai fazer
fotos, gosta de escolher a luz correta. Se acha que não foi clara o suficiente
em uma reflexão, liga novamente para a reportagem e reforça um ou outro ponto.
E faz cada coisa no seu tempo. Até 2010, nunca havia experimentado as redes
sociais. Além de reservada, não sabia muito bem como funcionavam. Há um ano e
meio, fez uma inscrição no Instagram e outra no Facebook. Mariana percebeu que
as redes sociais são canais diretos de comunicação com o público. “É um mundo e
a gente não pode se fechar para ele”, diz. Abaixo, a atriz conta como se
envolve na criação do personagem, fala sobre privacidade e comenta os trabalhos
com os diretores.
Você fez uma
vilã marcante, que foi a Clara de Passione. E Adri, que tipo de personagem é?
Não dá
pra classificar se é mocinha ou vilã, na verdade, todos são um pouco de tudo. O
que diferencia é o caráter, ter índole, caráter, ou não, ser inescrupulosa, que
é o que caracteriza uma vilã. Mas a Adri não pode ser classificada nem como
mocinha, nem como vilã, é uma mulher que quer exercer a profissão dela. Ela
quer se expressar, é uma artista e acha que não encontra a forma de
expressão dela naquela árvore. É uma mulher tentando ser feliz, tentando se
encontrar. É muito pouca a gama de personagens se você classifica como mocinha
ou como vilã.
Clara foi
catártica para você. E Adri? Você tem mais ou menos a mesma idade que ela. Se
identifica com ela?
Qualquer
criação de personagem para mim é uma busca dentro de mim e uma busca com quem
eu estou jogando. Primeiro, veio o livro, o roteiro; aí, o Roberto e, depois,
os atores. E também tem a cidade na qual você está, que também te modifica um
pouco. Passei um mês e meio em Brasília (para filmar Depois de você) e foi uma
experiência linda, que nem em Porto Alegre, onde passei quase dois meses.
Ensaiamos e amo ensaiar e amo ser dirigida, sou completamente aberta com meus
diretores. O jogo quem propõe é o diretor. O Roberto (Gervitz) propõe muito o
jogo, então, quando você vai fazer um filme, que é um projeto dele há muitos
anos, você parte para jogar o jogo dele. Claro que tenho a minha identidade,
meu trabalho, e o instrumento é meu, é meu corpo, minha voz, mas eu estou
aberta a ele. É assim que eu vejo.
E como foi o
processo de construção da personagem?
Tem uma
cena de escalada e eu fui fazer aula de escalada como o Armando Babaioff
(também ator do filme). A gente fez um curso e escalou o Morro da Babilônia.
Cada personagem me traz uma coisa nova, me proporciona algo. Esse me trouxe a
convivência com os atores, com o Baba, a gente ficou muito próximo, e ganhei
vários amigos, os gaúchos, os uruguaios, porque é uma coprodução, então ganhei
mais a percepção de uma cultura com a qual eu não tinha muito contato. Quando
você troca com outras culturas, você ganha. Sou muito aberta para aprender,
tenho muita fome de aprendizado, muita disponibilidade, muito ouvido.
Como você busca
o alimento para essa fome?
Trabalhando,
entendendo e compreendendo as outras pessoas, sendo aberta para outras pessoas.
Sou muito aberta para receber e para dar também, é sempre uma troca. Não tem
como. Sou aberta para as pessoas, a equipe, gosto de perguntar, de conviver,
fui fazer escalada. Uma coisa bonita que o instrutor me perguntou é qual o
objetivo da escalada. E disse “chegar ao topo”. Mas não. É o caminho, é o estar
a caminho, superando cada dificuldade.
Você mergulha
também, né?
Mergulho,
mas isso faço por mim mesma, porque amo o fundo do mar, acho um mistério aquilo
tudo. É um sonho, você desce, é um silêncio. Fiz batismo em Noronha. Na
escalada, se alguém cair, você vai ter que cortar a corda do teu companheiro. A
corda, na escalada é como o cordão umbilical. É tão bonito isso. É tudo uma
simbiose. Para contracenar, a gente tem que estar unido como se fosse um cordão
umbilical, um depende do outro.
Em 2010, você
não estava ainda nas redes sociais. As redes sociais consomem muito? É muita
exposição?
Sou uma
neném ainda. Já tenho um Instagram e Facebook, um dia vou chegar no Twitter. O
problema é que, quando estou aqui com você, eu estou aqui, não consigo ficar
fazendo mil coisas. Preciso prestar atenção aqui agora. Mas é um mundo e a
gente não pode se fechar para ele. Por isso, fiz o Instagram. E posto. As redes
sociais são muito importantes, inclusive na divulgação do filme e no termômetro
do filme. A gente não pode ignorar. E tenho contato direto, respondo. Quero
comunicar, acho que a gente tem que se comunicar. E não posso estar em todas as
sessões de cinema para ver a reação do público, então o Instagram é um termômetro.
O Twitter, vou chegar lá.
Tinha medo das
redes sociais ou era só falta de tempo?
Não. Era
falta de tempo e de entender um pouco como é que funciona. Mas fui tomando
gosto mesmo. Gosto de fotografar e gosto de imagem. A única coisa que dá
trabalho é que não gosto de postar qualquer coisa. Sou perfeccionista. E
Instagram, o ideal é que seja instantâneo. Às vezes, não consigo. Mas eu gosto
e entendi que é uma ferramenta de comunicação direta.
Sempre quis ser
atriz?
Sempre
tive muita inquietude. Com seis anos, decidi que queria ser atriz. Não tinha
ninguém na família e isso foi durando. Nunca me imaginei fazendo outra coisa. E
não sabia que ia durar tanto, então sou muito grata por estar aqui. Não sei se
conseguiria fazer outra coisa. O primeiro trabalho foi um comercial de
Aquafresh, eu lembro de tudo. Sempre fui muito....não cara de pau, mas sou uma
pessoa que liga quando quer, peço “posso fazer o teste”? Quincas berro d´agua
foi assim, A máquina foi assim e, no ano passado, foi assim no filme do Cacá
Diegues.
Qual o lugar do
cinema, do teatro e da tevê nesse universo?
Eu gosto
de tudo. E estou gostando cada vez mais de produzir. Produzi Um homem só, será
lançado este ano, sou produtora associada de Prova de coragem. Gosto muito de
fazer cinema, mas gosto de fazer televisão também. Um bom personagem em novela
comunica tanto, é tão bom! Até hoje as pessoas se lembram de Passione e de
Chocolate com pimenta. Chocolate faz 12 anos. É muito potente. E muito louco.
Eu estava em Miami e os cubanos vieram falar comigo porque me conheciam de
novela. Gosto muito de fazer novela. E amo estar no set de cinema. É muito
diferente.
Você é muito
reservada. Como lida com essa coisa da fama?
É uma
questão de domar. E uma questão de ser natural. Faço televisão e me dei conta
que estou há 17 anos na Globo. Você invade a casa das pessoas todos os dias. As
pessoas vão te vendo crescer. Comecei com 17, hoje estou com 34, não sou mais
uma adolescente. Como não querer que as pessoas cheguem a mim? Não tenho nenhum
problema em tirar foto, eu tiro, sou superreceptiva com as pessoas. Ao mesmo
tempo, gosto de ter minha privacidade, minha identidade. Acho que tem uma
dosagem. Se você se expõe muito numa entrevista ou nas redes sociais, as
pessoas querem mais e se sentem no direito de entrar mais. Mas eu posso falar
sobre o meu trabalho, posso até falar sobre minhas opiniões, mas tem uma parte
só minha, da minha família, dos meus amigos, e aí tem um limite mesmo.
Do que tem medo
e em que tem esperança?
Tenho
medo da situação atual do país, da política econômica. Tem que fazer uma
avalanche para poder mudar. É tanta desigualdade social, tantos deficits nas
coisas básicas, educação, saúde. A gente tem muito o que fazer. Minha esperança
é que a gente consiga virar o jogo, que cada vez mais venham pessoas aptas a
administrar nosso país, mas com muita honestidade, justiça e ética.
Por: » Nahima Maciel – Foto: Rodrigo Nunes – Especial para
o CB/D.A.Press – Correio Braziliense