As futuras colegas de trabalho, que têm entre 60 e
80 anos, durante a primeira reunião do grupo, realizada ontem: emoção e alegria
As 22 vovós selecionadas para trabalhar num estabelecimento de Águas Claras estão animadas com o novo trabalho
Juntas, elas preenchem de ternura e alegria o lugar onde estão. Ainda não era o primeiro dia de trabalho. A presença ali era para uma reunião introdutória. Mas estavam ansiosas e devidamente vestidas e maquiadas como em data de festa. As 22 vovós, com idades entre 60 e 80 anos, acabam se ser contratadas por um estabelecimento comercial em Águas Claras — que será inaugurado em 28 de dezembro. Cada uma a seu modo, e com seu estilo, estão dispostas a mostrar que a experiência profissional e de vida acumuladas ao longo dos anos faz, sim, diferença. No emprego novo, pretendem trazer todo o carinho e o cuidado com que tratam os filhos e os netos para atender os clientes.
“Não quero acreditar que estou envelhecendo. Digo que a estrada que
passou, não me lembro”, afirma Deusina Pereira da Silva, 62 anos. Vaidosa,
moderna e disposta. Estas são as palavras que melhor definem a selecionada para
uma das vagas. Ela foi a primeira a prontificar-se a contar um pouco de sua
história e, ao final, fez questão de tirar uma foto no próprio celular e
registrar o momento. Quando ficou sabendo do anúncio do emprego pelo genro,
pensou que fosse brincadeira. “Mas, hoje, estou achando o máximo. Foi o melhor
presente de aniversário que poderia ter recebido”, comenta. No último domingo,
Deusina celebrou a chegada de mais um ano e também o novo trabalho.
Mãe de uma filha, a mulher acredita que o corpo está adaptado ao esforço
que será requisitado. “Poupei muito a minha filha do trabalho de casa. Sempre
fiz tudo. Quero trabalhar feliz e vou fazer o possível para agradar”,
acrescenta. Maria de Lourdes Rodrigues Resende, 67 anos, foi selecionada
para ser um dos rostos do empreendimento que leva o nome da mãe do
proprietário, Luiza, uma senhora de 90 anos que mora fora de Brasília. “Será
uma cara alegre e feliz. Não achei nem a palavra certa para falar. Quero me
doar totalmente”, afirma.
Nos pés, o companheiro inseparável: o tênis. “Só uso sapato fechado.
Sandália só para ir ao salão”, conta Maria de Lourdes. A razão é muito simples.
Desde que fechou o restaurante que tinha, há cinco anos, não consegue ficar
parada. “Gosto de andar muito. Fico na casa de um filho, depois do outro. Cuido
de um neto, depois do outro”, descreve. Ela, que mora em Taguatinga Norte,
conta que conhece tudo por ali e afirma ainda ser cozinheira de mão cheia.
“Gosto de pegar na massa. Faço carne, torta de frango. E amo trabalhar com
gente. Conversar com as pessoas”, complementa.
Apoio
Maria de Fátima Nascimento, 63 anos, é outra que integra o time e está
ansiosa com a iniciativa. Sentada na primeira fileira, é uma das mais animadas
do grupo. “É a realização do seu ego, rejuvenesce, traz satisfação e prazer”,
define. Antes de ser contratada, trabalhava em um shopping e chegou a ser
reconhecida como a melhor atendente de Brasília. Além da habilidade no trato
com o público, Maria de Fátima é artesã. “Trabalho com tudo o que pode
imaginar. Tecido, biscuit, pintura. Antes de vir, estava expondo meus produtos
de Natal”, conta.
Moradora de Valparaíso (GO), a senhora não está preocupada com a
distância. “É o de menos”, declara. Para ela, a idade começou a pesar quando o
corpo deixou de acompanhar a cabeça. “A mente não para. Está a mil. Mas, começa
a ter um acabamento físico”, comenta.
O encontro entre as 22 selecionadas foi cercado de muita emoção. “Sou
muito devota de Deus. Acreditei que seria capaz de conseguir a vaga”, comenta
Shirlley Maria Santana, 69 anos, também contratada. “É uma honra. Estou
emocionada”, resume. Shirlley se aposentou do serviço no Judiciário e estava
sem trabalhar. Por mais que tenha encontrado atividades, como ioga e aulas de
pintura, o tempo nunca ficava preenchido. “Agradeço muito o apoio da Maria, a
minha secretaria, que me incentivou a vir aqui e me candidatar”, afirma.
Shirlley sabe que encontrará dificuldades, mas obstáculos não serão
suficientes para tirar a alegria que essa oportunidade lhes trouxe. “Eu era
melancólica. Hoje, não sou mais. Devolveu minha vontade de sorrir. Quero ser
amiga, compartilhar o que tenho e sou no carinho, no amor, na atenção e na
vontade em ajudar”, afirma.
Grande parte do grupo selecionado ficou sabendo do anúncio da vaga por
alguém da família e ,se hoje estas vovós estão animadas para começar o primeiro
dia de trabalho, é também por causa do apoio dos parentes. “No começo, ficamos
um pouco preocupados, porque ela estava aposentada há muito tempo. Tinha o
hábito de não sair muito de casa. Mas, depois que começamos a ver como seria,
as outras senhoras, percebemos que será importante para a socialização, para
novas amizades”, comenta um dos filhos de Shirlley, o comissário de bordo
Manuel Joaquim de Santana Neto, 34 anos.
Fonte:
Roberta Pinheiro – Foto: Gustavo Moreno/CB.D.A.Press – Correio
Braziliense