Na tênue teia que vai se enredando o
principal personagem político desses últimos 14 anos, estão presos, além do
partido e da sucessora no cargo, todo o governo e, por tabela, o Estado,
inclusive o Poder Legislativo. Paralisados, à espera da aranha da lei que
avança sobre os ímprobos.
Ao país, só resta aguardar o ato final e o desfecho de uma saga que
mistura política e polícia na mesma proporção. De positivo, vislumbra-se o
aflorar de um Estado mais depurado e, por conseguinte, uma democracia mais
aprimorada, expurgada da ação nefasta de falsos e numerosos partidos, sempre
alheios aos reais interesses da nação.
Para um Estado que se vê obrigado a sustentar tantas e tão diversas
legendas, o mínimo que se poderia esperar é que tivesse iniciativa de deliberar
para cessar a crise. Na verdade, a crise demonstra claramente a total
inutilidade e até mesmo o prejuízo para o cidadão em manter superestrutura
partidária, formada por miríade de legendas de aluguel, que funcionam mais como
clube fechado, voltado ao atendimento dos interesses dos associados da cúpula.
O processo insidioso que permite que o partido no poder possa se
imiscuir na máquina pública, parasitando a administração é, entre as muitas
variáveis da crise, o fator que mais chama a atenção e, por isso mesmo, clama
por reparos urgentes.
O governo de coalizão, baseado, isso sim, na cooptação de partidos, por
meio de prebendas, deve ser banido de imediato. Qualquer reforma que minimize a
ingerência de partidos na gestão pública será um avanço na política brasileira.
É preciso, e isto é consenso entre muitos brasileiros, vedar o acesso desses
clubes políticos à máquina administrativa, fechando a porteira do Estado à ação
infecciosa dessas instituições.
Se a democracia não pode prescindir de partidos para funcionar, do mesmo
modo não pode existir sabotada por multidão de agremiações de fantasia. Nesse
dilema, de aparente complexidade, a solução passa primeiro pela redução dos
excessos, filtrando esses clubes de acordo com um rígido esquema de cláusula de
barreiras.
A quantidade, em nosso caso, nos conduziu à superdosagem, levando nossa
recém-democracia a envenenamento grave. Também o Tribunal Superior Eleitoral,
criação exótica de nossa Carta, mostrou que, em momentos de crise, é inócuo.
Mais do que políticos articulados e incensados, o país necessita agora de
autênticos brasileiros. Quem sabe eles estejam em meio à grande multidão que as
ruas anunciam.
***
O texto que não foi escrito:
“Nação brasileira, nos perdoe. Mentimos. Defendíamos uma Nação e
criticamos as elites. Hoje fazemos parte da elite que sempre criticamos. Da
banda podre da elite. Da parte desonesta, que rouba. E, para dizer a verdade,
valeu a pena. Estamos riquíssimos. Temos dinheiro para qualquer parada. Preso
ou não, o dinheiro é só meu e ninguém tasca. Isso tudo vai passar e vocês vão
esquecer e me adorar novamente. Esperem para ver. Pensamos na política como bem
comum. Antes, queríamos estar no poder; hoje, defendemos nos manter no poder.
Para mim, é bem comum viajar, voar, ficar nos melhores hotéis, comer do bom e
do melhor. Tentem vir para o poder para vocês verem como é bom. Duvido que
queiram deixar isso aqui! Estou cantando e andando para o que vocês pensam. Por
isso, nem percebi em que jatinho estava viajando para escapar da prisão. Eu aprendi
que ser do governo é buscar o bem social dessa galera daqui. Quero mesmo que
vocês briguem bastante, negros contra brancos, ricos contra pobres,
homossexuais contra héteros. Assim, vocês me esquecem um pouco. Nossa meta é
deixar mais ricos os ricos, ensinar os filhos a tomarem parte desse queijo.
Façam tudo para o povo continuar manso e ignorante. Assim a gente consegue mais
tempo nesse paraíso. Perdão, Brasil. Quando eu dizia bem de todos vocês
deveriam entender bem de todos os meus amigos, interesseiros ou não. Perdão,
mas não estou arrependido. Nem teria do que me arrepender. Essa é a verdade. “
(Carta jogada na Esplanada assinada por um
ex-presidente)
Por: Circe Cunha – Coluna “Visto,
lido e ouvido – Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog –
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