Para a pesquisa, Marcella se debruçou nas
publicações do primeiro ano do jornal, inaugurado em 1960
Comunicóloga brasiliense estuda publicações do
primeiro ano do Correio Braziliense e relata o início das manifestações sociais
e culturais da nova capital. O resultado é uma dissertação de mestrado
O jornal Correio Braziliense teve
grande influência na construção da cena cultural de Brasília. Desde a
inauguração da cidade, em 1960, se consolidou como o primeiro veículo impresso
e contribuiu para registrar os costumes e a rotina dos pioneiros na capital
recém-inaugurada. O jornal nascia com o objetivo de apresentar o novo lugar no
coração do Brasil, transmitir aos leitores as ideias de progresso e de
liberdade em voga na época; além de servir como um guia de atrações de uma
cidade que acabava de ser criada. Essa foi a conclusão da dissertação de
mestrado O jornal Correio Braziliense no processo de construção da cultura de
Brasília: das origens ao dia 21 de abril de 1961, da Universidade Católica de
Brasília, assinada pela comunicóloga Marcella da Rocha.
Como motivação para a realização da
pesquisa, a mestre se inspirou nas histórias que o avô contava. João Nascimento
era jornalista, trabalhava como editor-chefe na Gazeta do Triângulo, em Minas
Gerais, e era um grande entusiasta da construção de Brasília. “Quando soube do
dia em que a cidade seria inaugurada, não hesitou em pegar um teco-teco para a
nova capital. Ele sempre me contava dessa aventura e da emoção de ver uma
cidade surgir do nada.”
Além das memórias compartilhadas pelo
avô, Marcella também tem carinho especial pela cidade. Nasceu e foi criada aqui
e se encanta com as características do território candango. O tema para a
dissertação estava escolhido e não poderia ser mais adequado: a comunicóloga
queria recuperar o primeiro ano da publicação, lançada em 21 de abril de 1960,
e traçar um paralelo com 365 dias inaugurais da cidade.
Saber qual era a importância de um
veículo de comunicação para a formação da cultura de uma cidade foi o principal
objetivo da mestre nesse trabalho. “Queria ver (pelas publicações do jornal) a
quantidade de serviços prestados, o crescimento da vida cotidiana em Brasília,
como surgia a ideia de comunidade, de pertencimento à cidade, essa nova relação
de bem-querer com o lugar que os acolheu. Tudo isso ajudou na humanização da
capital e, por que não, a criar a identidade do brasiliense?”
O estudo mostrou como a capital e o
jornal foram, gradativamente, sendo estruturados com o decorrer do tempo. O
Correio funcionou como um acolhedor das pessoas que chegaram para construir a
cidade. Segundo relatos dos pioneiros, ouvidos por Marcella, muitos vieram para
Brasília, convidados ou não, para instaurar o novo centro político do Brasil. O
barro vermelho, característica marcante do solo brasiliense, aos poucos, deu
espaço para construções modernas do arquiteto Oscar Niemeyer, pensadas no plano
urbanístico de Lucio Costa. Siglas e números viraram endereços e,
posteriormente, lares para aqueles que aceitaram o desafio de embarcar na aventura
de Juscelino Kubitschek.
Com uma configuração diferente de todas
as demais cidades brasileiras, a terra candanga também teve um processo de
desenvolvimento da vida cultural atípico. O impresso tinha, então, o papel de
apresentar aos moradores o que o incipiente Distrito Federal poderia lhes
oferecer. O jornal anunciava a abertura de lojas, a construção de igrejas e o
que mais fosse novidade. Nas suas páginas, saía publicada a lista de telefones
dos novos moradores. A comunicação não era feita nos moldes de um informe
publicitário, era quase bate-papo direto com o pioneiro. Uma conversa
despretensiosa para vender produtos, que começava mais ou menos assim: “Oh
pioneiro de Brasília, a cidade já tem isso que você quer e você já encontra em
tal loja...”
Primeira capa do jornal, que publicava lista de
telefones dos moradores
O casal Oscar e Elinor Moren estava
aqui na inauguração e tinha o jornal como fiel companheiro. “Era o nosso grande
aliado nas descobertas sobre a cidade. Era o nosso guia, assim como o de nossos
amigos, tanto em relação aos novos serviços que a cidade passava a oferecer,
como em relação às opções de lazer e cultura disponíveis àquela época.”
Marcella entrevistou ainda a esposa de um dos principais médicos da
época, o doutor Ítalo Nardelli. Elza conta que é leitora assídua do jornal até
hoje. “Cheguei em Brasília em dezembro de 1960, e o Correio me ajudou a
permanecer aqui. Todos os dias, eu o lia para saber o que acontecia na cidade e
aonde levar as crianças.”
De acordo com o historiador e
jornalista Adirson Vasconcelos também entrevistado para a dissertação, os
pioneiros recorriam ao primeiro impresso local para se inteirar do que
acontecia no mundo, na política e na cultura do país, buscando, igualmente,
informações sobre as novidades de toda ordem que surgiam na capital
recém-inaugurada.
Nas considerações finais, Marcella
resume a importância e a ligação da cidade com o jornal: “Por meio das páginas
do Correio Braziliense, Brasília foi cada vez mais humanizada e, aos poucos, se
transformou em muito mais que a capital do Brasil. A cidade tornou-se, verdadeiramente,
o lar definitivo de muitos de seus pioneiros e, hoje, 56 anos após sua
inauguração, é a cidade natal de 1,7 milhão de brasilienses.”
Construção do Correio: jornal, desde então, conta o
cotidiano da cidade
Fonte: Correio Braziliense – Foto: Breno
Fortes/CB/D.A.Press - Arquivo/CB