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Chicungunha, a ameaça do verão






Especialistas alertam para uma explosão da doença que causa dores fortes nas articulações e cujo vírus também é transmitido pelo Aedes aegypti. Casos até setembro deste ano cresceram 880% em relação a todo o ano passado.


Em 1952, a população do sudeste da Tanzânia, na África, foi acometida por uma doença tão dolorosa que suas vítimas andavam com o corpo arqueado. A epidemia ficou conhecida como chicungunha — na língua kimakonde, “aqueles que se dobram”. O vírus CHIKV foi isolado e identificado em pequenos surtos na Ásia. Mas, por muito tempo, ficou adormecido. Até acordar, em 2004, no Quênia. Durante uma década, a ameaça se manteve distante do Brasil. Em 2014, porém, ela chegou. Agora bem-adaptado, o micro-organismo avança por todas as regiões, com um número de casos confirmados até setembro 880% maior que de todo o ano passado.

O boletim epidemiológico mais recente do Ministério da Saúde mostra que, de janeiro a 20 de setembro, foram notificados 236.287 mil casos, sendo que, desses, 116.523 de fato eram febre chicungunha. Esse número deve aumentar significativamente nos próximos meses, pois o vírus é transmitido pelo Aedes aegypti, mosquito que se prolifera nos meses chuvosos de verão.

“O chicungunha entrou no Brasil antes do zika, mas o período de incubação dele é mais longo. Por isso, se propaga mais lentamente”, explica Luiz José de Sousa, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica e diretor do Centro de Referência de Doenças Imuno-Infecciosas (CRDI-RJ), justificando o fato de, dois anos depois da entrada do vírus, haver uma explosão de casos. “Agora, a perspectiva é que este ano tenha um aumento muito maior, principalmente no Sudeste”, alerta o médico, também autor do livro Dengue, zika e chikungunya — diagnóstico, tratamento e prevenção.

Uma preocupação de Sousa é com o pouco conhecimento que se tem sobre a doença. “A dengue já foi altamente estudada. Mas há poucos estudos sobre chicungunha. Não se sabe, por exemplo, porque pacientes com doenças crônicas prévias, como diabetes e doença pulmonar obstrutiva, têm um risco de mortalidade maior. Sabe-se que há uma ação do vírus no endotélio vascular e no tecido das articulações, mas não se sabe o mecanismo”, exemplifica.

Crônicos
O comprometimento articular é o que leva as pessoas infectadas a “se dobrarem”. Uma das características da febre chicungunha é a poliatrite, uma dor muito forte nas articulações, principalmente nas regiões de mãos, punhos, tornozelos e pés. Em abril, a Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR) começou um estudo que, por enquanto, inclui dados de 431 pacientes. Os resultados iniciais indicam que a doença persiste por 14 semanas, sendo que a forma poliarticular é a mais comum (80,5%), com 100% dos pacientes queixando-se de dor, 52,9% deles com comprometimento da coluna cervical e 43,4% da lombar.

De acordo com a reumatologista Claudia Marques, da SBR, em 30% dos casos, as manifestações articulares da doença podem durar meses. Dentro desse percentual de pacientes, 5% cronificam, ou seja, jamais se recuperam e terão de fazer tratamento reumatológico para o resto da vida. Diante da expectativa de uma epidemia no verão, a SBR está elaborando um conjunto de orientações voltadas aos médicos. “Mesmo nos locais em que houve epidemia, os médicos da atenção básica são capazes de dar o diagnóstico, mas ainda não estão capacitados para o tratamento da fase crônica, e a gente precisa lembrar que não vai ter reumatologista para todo mundo”, justifica a médica, que coordena a elaboração do documento.

“Agora no verão, quem tratará o grupo que vai cronificar? Por isso a importância das recomendações que estamos fazendo, para que o clínico, o médico lá da ponta da atenção básica, se sinta mais preparado e tenha mais subsídios para tratar o paciente”, completa Claudia Marques. “Quando tínhamos só dengue, era uma coisa. Agora, temos epidemia de dengue, zika e chicungunha juntas. Numa epidemia, o médico tem de estar muito treinado, o risco de diagnóstico errado é maior”, concorda Luiz José de Sousa.

“Há poucos estudos sobre chicungunha. Não se sabe, por exemplo, por que pacientes com doenças crônicas prévias, como diabete e doença pulmonar obstrutiva, têm um risco de mortalidade maior”

Luiz José de Sousa, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica e diretor do Centro de Referência de Doenças.

Fonte: Correio Braziliense
Foto: Internet

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