Polêmica: Obras que estão na Biblioteca do Alvorada terão de
ser devolvidas ao Museu Nacional de Belas Artes, que fica no Rio de Janeiro
Planalto devolve, a partir desta semana, 48 obras ao Museu Nacional de
Belas Artes do RJ. Rogério Carvalho, ex-curador do Alvorada, diz que diretora
do museu carioca sugeriu troca de obra de artistas internacionais por quadros
de pintor recifense
A poucos dias do fim, 2016 deixa mais um golpe para a população de
Brasília. Com o encerramento do contrato de comodato, o Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan) autorizou, em decisão acertada pelo
Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e pela Diretoria de Documentação
Histórica (DDH) do gabinete da Presidência da República, a devolução de 48
obras de arte do acervo do Palácio do Planalto e do Alvorada ao Museu Nacional
de Belas Artes do Rio de Janeiro (MnBA). Com a decisão, a cidade perde
relíquias de Cândido Portinari, Djanira da Mota, Alberto da Veiga Guignard,
Arcângelo Ianelli, Eliseu Visconti, Maria Leontina, Rodolfo Amoedo e Henri
Nicolas Vinet, destinadas à voltar ao lugar de origem, onde já existem mais de
70 mil itens artísticos.
Além das
pinturas, estudos, desenhos e porcelanas, há também esculturas e mobiliários do
século 18 e 19, grande parte trazidos para a cidade em momentos distintos a
partir da década de 1950. O empréstimo durou de 1956 a 1991 e foi prorrogado
até o fim deste ano. As peças que, em grande parte ficavam abertas a curiosos,
turistas e à população do DF, serão substituídas por outras do acervo da
Presidência e do Banco Central (BC). De acordo com o Ibram, a devolução será
feita em duas etapas. Até o fim da semana serão devolvidas 34 pinturas e o
conjunto de seis objetos do acervo de arte decorativa. Na segunda leva,
prevista para janeiro, voltarão ao Rio oito peças de mobiliário.
A atitude
do Planalto e do Museu de Belas Artes revoltou Maria Elisa Costa, herdeira do
urbanista Lucio Costa, um dos “inventores” de Brasília. Em carta aberta nas
redes sociais, a arquiteta fez um apelo para que Kátia Bogea, atual presidente
Iphan — cargo que Maria Elisa ocupou durante 15 anos — intervisse para que as
obras permanecessem em Brasília, onde se enfrenta um momento delicado na
cultura, com o fechamento de importantes equipamentos. Exemplo disso é a
interdição do Museu de Arte de Brasília, há mais de 10 anos.
“O que fez
nosso JK? Conseguiu que o Museu de Belas Artes da antiga capital lhe cedesse
uma bela coleção de obras, a serem colocadas nos Palácios de Brasília, como a
dizer – aqui, Poder & Arte convivem, cotidianamente. Com o tempo, essas
obras passaram, de fato, a ‘pertencer’ a Brasília. A ideia de JK criou raiz.
Retirá-las seria desmerecer a sensibilidade e a sabedoria de quem foi capaz de
construir, em três anos, nossa capital.... Ele não merece!”, desabafou Maria
Elisa.
O argumento
da assessoria da Presidência da República é que as obras estavam sendo
devolvidas por motivo de preservação, que passariam por uma limpeza profunda e
seriam expostas de forma adequada. Afirmam, também, que telas como Trecho do
Jardim Botânico no Rio de Janeiro, de Guignard, estariam à mostra para o grande
público após ficar 35 anos nos palácios presidenciais de Brasília e no Rio —
onde vivia o representante máximo do Executivo, antes da transferência da
capital do país.
Troca
Curador do Palácio da Alvorada durante quase 10
anos, Rogério Carvalho revela que, pouco antes de Dilma Rousseff deixar a
Presidência, após o processo de impeachment, houve uma reunião entre ele e
Mônica Xexéo, diretora do MnBA. “Ela teve a pachorra de oferecer, guardando
todas as proporções de qualidade e de gosto, o descarte do museu para
substituir as obras que estavam aqui havia décadas. Nas últimas reuniões que
participei, Mônica ofereceu um Rometo Britto em troca de um Eliseu Visconti”,
declara. A curadora do MnBA, Monica Xexéo, não pôde falar com o Correio devido
a problemas de saúde.
Rogério
Carvalho fez coro com as acusações de Maria Elisa Costa. Segundo ele, a
transferência das propriedades prejudicam o patrimônio cultural brasiliense.
“Essa relação das peças de arte com a cidade se dá não só porque são quadros ou
objetos que estão aqui há 40 anos. Ela acontece porque eles fazem ambientação
dos dois prédios mais importantes do país. Essa relação direta deve ser
preservada. Precisamos deixar claro que elas não se encerram nelas mesmas. São
representações da relação não só do presidente, mas de todas as pessoas que
passaram por ali durante esse tempo todo. Não podemos vê-las como algo isolado,
meros objetos. São objetos que se relacionam com pessoas”, critica.
Especialistas
Curador do Museu Nacional da República, crítico
de arte e artista plástico, Wagner Barja acredita que a devolução, ainda que
cumprindo protocolo, significa uma perda aos valores culturais da capital. “São
acervos referentes à história da República e Brasília e, como a capital do
país, não vejo com que direito os pegam de volta”, pontua.
Marcelo Mari, professor de História da Arte do Departamento de Artes
Visuais da Universidade de Brasília (UnB), acredita que a transferência das
obras foi uma atitude infeliz e leviana. “São artefatos com significado
cultural e adequadas ao patrimônio arquitetônico de Brasília. Somos uma cidade
construída para ser moderna, as obras expostas no Palácio conversavam com isso
e contavam a nossa história aos visitantes. Na minha visão, foi uma decisão que
não se deixou ser fundamentada por especialistas na área”, constata o professor.
Ao descobrir sobre o episódio, Marcelo diz que se recordou de um caso
semelhante que aconteceu com Silvio Berlusconi, ex-primeiro Ministro da Itália,
em que o cuidado artístico foi deixado em segundo plano. “Episódios como esses
acabam muito malvistos. É uma perda não só para o público local, mas para
visitantes. São obras que fazem parte do projeto de construção de uma imagem de
Brasília, rimando com a história contada pelos edifícios de Niemeyer”, relata.
* Estagiário
sob supervisão de Anderson Costolli
176
Quantidade de obras de arte no Palácio do Planalto
48
Número de peças a serem devolvidas, que correspondem a cerca de 28% do
acervo total
Por » Rebeca Oliveira » Pedro Grigori* - Correio
Braziliense
Nota pública sobre o retorno das obras de arte do Palácio do Planalto ao MNBA:
ResponderExcluirO retorno ao Museu Nacional de Belas Artes – MNBA, no Rio de Janeiro, das 48 obras de arte que estavam cedidas à Presidência da República/Palácio do Planalto acontece em virtude do término do contrato de comodato, tratado entre as duas instituições. Tal devolução faz parte de um processo administrativo interinstitucional comum e se dá visando, principalmente, à conservação e preservação desse acervo.
As obras em questão fazem parte do patrimônio da União, uma vez que o Museu Nacional de Belas Artes, detentor da guarda do acervo, é uma instituição do Instituto Brasileiro de Museus – Ibram, autarquia vinculada ao Ministério da Cultura.
Ao retornarem ao Museu Nacional de Belas Artes, as obras passarão por restauro e higienização e, posteriormente, integrarão ações de circulação, por meio de exposições no próprio MNBA, em museus ligados ao Instituto, ou mesmo instituições nacionais e internacionais, considerando que o Ibram tem como uma de suas finalidades contribuir para a divulgação e difusão dos acervos museológicos brasileiros.
A parceria entre o Ibram e o gabinete da Presidência da República, representado pela Diretoria de Documentação Histórica, é permanente e se traduz no desenvolvimento de ações de conservação e de preservação de obras que integram o acervo da Presidência da República e em outras atividades de colaboração voltadas ao aprimoramento das relevantes ações museológicas desenvolvidas.
Assessoria de Comunicação do Instituto Brasileiro de Museus