Brasília, uma cidade planejada, honrada com o
título de patrimônio cultural da humanidade por sua arquitetura e urbanismo,
não resistiu à pressão do crescimento demográfico. Exceto a área tombada (o
Plano Piloto), as ocupações irregulares do solo estão entre os grandes
problemas da capital federal. As dificuldades brasilienses existem em todas as
unidades da Federação. A maioria delas tem problemas agravados pela desordem na
estrutura fundiária, que levam parcela da população a cobrar a implantação da
reforma agrária, ou pelo crescente deficit habitacional urbano, hoje estimado,
pela Fundação Getulio Vargas, em mais de 5 milhões de residências em todo o
país — 90% concentrados na camada de baixa renda da população.
Seja no
campo, seja na cidade, o brasileiro quer ser proprietário do espaço que ocupa.
Reivindica ao poder público a regularização da área para ter um mínimo de
segurança. Contornar as restrições impostas pela legislação ou vencer o
conflito pela posse da propriedade não é fácil. A solução poderá vir com
aprovação, prevista para ocorrer até o fim deste mês, da Medida Provisória
759/2016, que trata da regularização fundiária rural e urbana no país. A MP
simplifica a legalização de áreas prevendo, inclusive, compra direta pelos
ocupantes de imóveis nas cidades e o assentamento de camponeses potencialmente
beneficiários da reforma agrária, dos quais não está excluída a possibilidade
de compra do imóvel.
A
proposta poderá mitigar os conflitos e arrefecer as ações dos movimentos
sociais, que paralisam o trânsito nos perímetros urbanos ou protagonizam graves
embates na disputa por imóveis nas principais capitais do país. No campo, a
luta pela terra, em 2016, foi a principal causa de 59 assassinatos.
Historicamente, é pano de fundo de chacinas e outras tragédias que inundaram o
solo de sangue.
Mas, ao
lado das facilidades e flexibilização de normas, ronda o perigo de abusos e
fraudes. As mesmas mudanças que buscam eliminar os obstáculos à realização do
sonho de milhões de brasileiros exigirão do poder público esforço redobrado na
fiscalização, evitando que a regra abra espaços que fortaleçam práticas
condenáveis, como a grilagem de terras e de áreas urbanas. Trata-se de infração
secular no país e que levou à concentração dos espaços rurais e das urbes nas
mãos de poucos, com lucros exorbitantes, em detrimento das necessidades dos
mais despossuídos.
Além de
danos sociais severos, as intervenções inescrupulosas resultaram em perdas
profundas de patrimônio natural, que hoje têm repercussão na saúde e na oferta
de elementos essenciais à vida, como a água. Mais: não é suficiente apenas
regularizar as áreas, mas dotá-las dos equipamentos sociais, como escolas,
centros de saúde, saneamento básico e outros elementos de infraestrutura,
que assegurem e dignifiquem o espaço de vida dos beneficiários da medida, tanto
no campo quanto na cidade.
Visão do Correio Braziliense – Foto/Ilustração:
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