Diretor-geral diz que ex-presidente da Câmara,
denunciada por corrupção, tentou indicar dois delegados para cargo estratégico
na PCDF
Por Ana Dubeux – Ana Maria
Campos,
O diretor-geral da Polícia Civil, Eric Seba, disse
que a deputada Celina Leão (PPS) quis fazer ingerências políticas na escolha de
chefias de delegacias. Ele contou que a ex-presidente da Câmara Legislativa
tentou, sem sucesso, emplacar dois delegados, Flamarion Vidal e Rodrigo
Larizatti, na chefia da 5ª Delegacia de Polícia. A área central de Brasília
recebe informações e ocorrência de todos os órgãos do poder na capital:
Ministério Público, Tribunal de Justiça, Câmara Legislativa e Esplanada dos
Ministérios.
Ao contrário do que disse Celina, em entrevista ao
Correio, publicada ontem, a afirmação de Seba revela que há um vínculo político
entre a deputada, denunciada na Operação Drácon, e Flamarion. O delegado que
chefia a 4ª DP (Guará) é citado nas gravações realizadas pela escuta ambiental
no gabinete da deputada como um aliado. Mas Celina nega essa proximidade.
Seba disse que nunca autorizou a participação de
agentes de polícia no depoimento que Celina Leão colheu do hacker que clonou o
telefone do governador Rodrigo Rollemberg (PSB). Ele disse que tomou
conhecimento, por WhatsApp, depois que o agente Marcello de Oliveira Lopes
havia estado no gabinete da distrital. A conversa, de agosto de 2016, ainda
está registrada no celular de Seba. Ele pretende entregar o conteúdo desse
diálogo à Corregedoria da Polícia Civil.
Ao Correio, Seba considerou que Celina foi “infeliz
e leviana” ao dizer que pediu ajuda a Flamarion porque poucos policiais civis
teriam coragem para investigar Rollemberg. Ele saiu em defesa do governador,
que, segundo Celina, age no submundo para derrubá-la. “Montar dossiês, fazer
espionagem ou atuar no submundo não são práticas do governador ”, afirmou.
O fato de dois agentes da Polícia Civil acompanharem uma investigação
informal de uma deputada é um procedimento adequado?
O acompanhamento, por parte da polícia, de uma
situação que possa caracterizar um crime é normal. O que pode não ser normal é
como esse caminho é seguido. É preciso entender que temos delegacias
responsáveis por áreas e que existe a questão da competência pela
especialidade. Dentro da própria Câmara, existe a Copol (Coordenadoria de
Polícia Legislativa), chefiada por um delegado de polícia, que está ali para
zelar pela segurança e para fazer a interface, principalmente com a Polícia
Civil. Então, não vejo lógica nesse caminho seguido, da forma como aconteceu.
Houve irregularidade?
Se houve alguma irregularidade no âmbito civil,
administrativo ou criminal, a Corregedoria vai apurar. E, se é suscitada uma
conduta errada do diretor da Polícia Civil, no caso, um comportamento meu, que
ele seja apurado também, não só pela Corregedoria, mas pelo Ministério Público.
A deputada Celina Leão colheu o depoimento de um hacker que clonou o
telefone do governador Rollemberg com o apoio de dois policiais civis. Um
deles, Marcello de Oliveira Lopes, teria lhe comunicado essa situação. Isso
aconteceu?
Conheço o Marcello e conheço a deputada. Sei que os
dois têm uma relação de amizade e congregam o mesmo ambiente religioso,
frequentam a mesma igreja. Sei que existe a proximidade. Marcello teve algumas
conversas comigo falando sobre essa suposta procura desse estelionatário
chamado Jefferson. Quando ele relatou isso pra mim, ela já teria recebido o
Jefferson. Já tinha acontecido. Isso está registrado nas mensagens do meu
celular. Inclusive, vou fazer a entrega para a Corregedoria e para o Instituto
de Criminalística para que isso fique muito claro. Quando ele manda a mensagem
pra mim, já foi no tempo passado.
Marcello cita o outro agente também?
Não, em momento nenhum, ele fala do Welber (Lins de
Albuquerque). Diz que estava com Celina, de quem era amigo e que estava
acompanhando o caso.
Nas gravações da Drácon, uma pessoa entra no gabinete de Celina dizendo
que tinha acertado tudo com Flamarion Vidal, delegado-chefe da 4ª DP. Ele
estaria 100% fechado com Celina e que mandaria outra pessoa para ajudar. Esse
procedimento, na sua avaliação, é suspeito?
Não queria usar o termo suspeito, mas não é o
normal, habitual. Se ela suspeitava que poderia ser vítima de extorsão, poderia
procurar outro caminho. Nós temos uma unidade especializada na apuração de
extorsão, que é a Divisão de Repressão a Sequestro. É matéria específica dela,
tem expertise e equipe para aquilo. O trabalho da polícia poderia ter sido
feito de uma forma técnica. Então, o delegado que recebeu a informação,
independentemente de quem fosse, deveria ter dado encaminhamento via diretor de
departamento ou via direção da polícia. Essa é uma forma de agir de quem
respeita a hierarquia.
É do métier de um deputado colher um depoimento de uma pessoa que vai
fazer uma acusação contra um adversário... Ou contra qualquer pessoa?
Para ser sincero, não acho anormal. Se uma pessoa
procura um parlamentar dizendo que tem uma denúncia a fazer, há uma tendência
natural de a pessoa ouvir, até para saber se é verdade, e aí ela pode se
acautelar de outras situações, que é chamar estruturas de segurança orgânica e
institucional.
Mas ali se percebe que era um movimento após uma operação bombástica na
cidade. Num ambiente como esse, a deputada começar a investigar o governador,
não fica parecendo que é uma retaliação ou uma cortina de fumaça para diluir as
suspeitas? Fica mais evidente que era um procedimento para a construção de um
dossiê?
Vamos lá: em relação à pergunta de vocês, eu
mudaria a palavra dossiê, que é uma palavra que tenho alergia a ela — dossiê é,
normalmente, feito para destruir a pessoa, para cometer injustiças, é
repulsiva... Do ponto de vista genérico, não vejo como totalmente anormal um
deputado ouvir uma denúncia. O que teria de ser visto é se foi feito de forma
republicana. No caso específico de uma deputada, que estava sob investigação,
aí passa a ser questionável. Por mais que ela precise atender e ouvir as
pessoas, ela poderia ter se cercado da própria segurança da Câmara. Ou mais: se
quisesse demonstrar transparência e seriedade, comunicasse ao Ministério
Público e que levasse a pessoa lá. E por que encaminhar à Polícia Federal? Não
vejo como da alçada da Polícia Federal.
Celina diz que o governador está por trás de toda a trama da Operação
Drácon…
Ela deve ter alguma fonte de informação muito forte
ou mergulhou muito no submundo. Na verdade, as pessoas julgam as outras pelo
que elas fazem e pelo que elas são. A verdade é essa.
Essa não é a prática de Rollemberg?
Muito pelo contrário. Todas as vezes que tivemos
algum tipo de ação que pudesse ter algum tipo de reflexo mais grave, ele me
chamou e me pediu muita cautela para que não se atacasse ou destruísse a
reputação dos investigados. Montar dossiês, fazer espionagem ou atuar no
submundo não são práticas do governador Rodrigo Rollemberg. O governador nunca
me pediu para nomear delegado ou gestor. Pedidos só recebi de deputados.
Quem pediu?
Ela (Celina). Ela pediu, por exemplo, para nomear
Flamarion na 5ª DP. É uma delegacia cobiçada porque recebe informações de
ocorrências na área do Tribunal de Justiça, do Ministério Público, da Câmara
Legislativa, da Esplanada, do Correio Braziliense. É o poder político e
econômico. Não sei por que ela quis indicar o Flamarion, já que a deputada
disse que não o conhecia.
Ela pediu por mais alguém?
Sim, pelo delegado Rodrigo Larizatti, também para a
5ª DP. Eu disse que eles não seriam por falta de competência, mas não teriam o
perfil. Fiz a nomeação do delegado Rogério (Henrique) e mantive.
Há uma tentativa de derrubá-lo da direção-geral?
Chegou uma notícia de que tinham três ou quatro
delegados, anteontem (segunda-feira), extremamente aborrecidos, chateados e
fazem parte desse grupo. E hoje (ontem) de manhã, os dois estavam sorridentes.
Por quê? Porque saiu a entrevista (de Celina Leão). Cada ficha que apostam,
apostam a ficha errada. A verdade é essa.
E essa história de que o senhor procurou o Marcello para arranjar um
encontro com a Celina? É verdade?
Isso é uma mentira. Nunca procurei ou pedi a alguém
para falar com a deputada Celina. As vezes em que tive algum contato com ela
foi direto, por questões diversas e, normalmente, institucionais. Se tenho
contato direto, não precisaria pedir... Mesmo sabendo que o Marcello é amigo
dela. O que aconteceu, nesse episódio, foi uma proposta, que também está no meu
celular. O Marcello, por ser amigo da Celina, e por achar que sou amigo do
governador, incomodado com a situação que realmente estava ruim, de uma briga,
uma desavença quase no ambiente pessoal da presidente da Câmara Legislativa com
o governador, tentou uma aproximação. Falei: ‘Ela pode ir lá, que será
atendida’. Como qualquer deputado, como qualquer autoridade, como qualquer
pessoa do povo. Eu atendo. Sou até muito criticado por atender todas as pessoas
que vão lá. Não atenderia a deputada? Com certeza, atenderia. Só que ela não
foi.
Então, partiu dele (Marcello)?
Partiu dele. O Marcello pediu. O objetivo não seria
a Drácon. Seria tentar diminuir a tensão que havia entre o Executivo e o
Legislativo pelo bem da sociedade.
E quando o Marcello e o Welber foram liberados da Polícia Civil para
serem cedidos ao Ministério da Defesa, houve alguma ingerência política? Algum
pedido?
Não, nenhum pedido. Apenas o do ministro da Defesa
(Raul Jungmann). Normalmente, pedidos do governo federal, a gente atende. Até
porque é ele que nos paga. A cessão é em nome da cordialidade, porque é quase
uma requisição. Mas não houve nenhum pedido, apesar de eu saber que o ministro
é do mesmo partido da deputada Celina (PPS).
A que o senhor atribui o fato de a deputada ter incluído seu nome na
história?
Olha, eu não sei. O meu relacionamento com ela
sempre foi muito bom e respeitoso. Até o determinado momento em que começou a
ter desavenças entre ela e o governador. E atribui muita coisa que acontece à
Polícia Civil. Aí, eu afirmo: ela está sendo injusta, precipitada e mal
orientada. Na verdade, acho que, em determinados momentos, a deputada está
sendo usada por um grupo. A verdade é essa.
A deputada Celina Leão disse que pediu apoio do delegado Flamarion
porque poucos têm coragem de investigar...
Como delegado e diretor, repudio o que ela falou.
Ela foi extremamente infeliz e leviana no que disse. Ao contrário do que ela disse,
os delegados têm coragem, sim, ou não teriam feito as operações Drácon, a da
Casa Militar e outras, como agora o dr. Fernando (Cesar Costa), da DRF, que foi
lá em São Paulo buscar a maior quadrilha de furto a residência e de alta
periculosidade do país. Então, em nome da Polícia Civil, da carreira de
delegado, que tem, em sua maioria, gestores sérios, eu repudio. Posso dizer que
99% dos nossos policiais são corajosos e fazem a coisa certa. Qualquer delegado
ou agente que ela procurasse poderia ter feito da forma correta o que ela
precisasse, e não da forma como foi feita, de maneira informal, invadindo áreas
e ultrapassando limites até éticos. Ela foi muito infeliz.
(*) Por Ana Dubeux – Ana Maria Campos – Foto: Bruno
Peres-Esp/CB/D.A.Press – Correio Braziliense