O MP deflagrou ontem a Operação Hemera na Câmara Legislativa: Sandra e o
irmão são acusados de cobrar um terço dos salários dos comissionados
*Por Ana Viriato
Operação do Ministério Público do DF e Territórios coloca a deputada
distrital como suspeita de crimes como corrupção, falsidade ideológica e uso de
documento falso. O irmão dela e comissionados do gabinete também são alvos da
apuração
Alvo de uma ação de dívida na Justiça e de um processo por quebra de
decoro parlamentar na Câmara Legislativa, a distrital Sandra Faraj (SD) também
está na mira do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT). Deflagrada
ontem, a Operação Hemera — em referência à deusa grega da mentira —
investiga uma série de denúncias contra a deputada, o irmão Fadi Faraj,
suplente do senador Reguffe (sem partido-DF), e comissionados do gabinete. A
apuração aponta indícios de crimes de corrupção, falsidade ideológica e uso de
documento falso. As penas referentes aos delitos ultrapassam 20 anos de
reclusão e incluem a perda do cargo público.
No total,
os promotores cumpriram oito mandados de busca e apreensão, além de quatro
conduções coercitivas na Câmara Legislativa, na igreja Ministério da Fé e na
casa da distrital. Sandra e Fadi são suspeitos de comandar um suposto esquema
de cobrança de um terço dos salários dos servidores comissionados alocados em
cargos da Câmara Legislativa, da Secretaria de Justiça e da Administração
Regional de Taguatinga. Conforme o Correio apontou em março, a parlamentar
mantém em seu gabinete do Legislativo pelo menos nove fiéis da Ministério da
Fé, igreja ligada à família Faraj.
Ademais, a
parlamentar é acusada por Filipe Nogueira Coimbra, sócio da Agência de
Comunicação e Tecnologia Netpub, de embolsar R$ 150 mil em verba
indenizatória, montante que deveria ser repassado à empresa pela prestação de
serviços de publicidade e informática ao longo de um ano (veja As confusões de
Faraj). Segundo o empresário, além de desviar o montante, Faraj teria fraudado,
com carimbo e assinaturas falsos, a nota fiscal que atesta os pagamentos
relativos a fevereiro de 2016, último mês do contrato.
O advogado
da parlamentar alega que todos os pagamentos foram realizados em espécie, com o
dinheiro que a distrital guardava em casa, conforme declarado à Receita Federal
e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A defesa usa, ainda, perícia da
Secretaria de Fazenda sobre a nota fiscal em questão, emitida pela Netpub. O
comprovante sequer poderia ser entregue a Sandra, porque não foi transmitido à
pasta previamente para autorização. A distrital também nega ter falsificado
carimbos ou assinaturas da empresa.
A distrital
e o irmão ainda são investigados por, supostamente, ameaçarem pessoas
envolvidas nas investigações preliminares do Ministério Público em reunião
secreta, convocada em um fim de semana e realizada em um colégio. Na
oportunidade, os dois teriam divulgado vídeos e dito que “destruiriam as
testemunhas”. Em nota, a assessoria de Comunicação da parlamentar informou que
apura os fatos relacionados às diligências do MPDFT. Porém, refutou as
acusações e argumentou que a parlamentar está “contribuindo com
esclarecimentos e informações”.
Horas após
a conclusão da operação na Câmara Legislativa, o corregedor da Casa, Juarezão
(PSB), ouviu o depoimento de Filipe Nogueira Coimbra durante oitiva relacionada
ao processo por quebra de decoro parlamentar que tramita, no Legislativo local,
contra Faraj. Na reunião, o empresário reiterou as alegações que constam nos
autos da representação.
Ainda
ontem, Juarezão encaminhou um telegrama de convocação para oitiva direcionado a
Manoel Carneiro, ex-chefe de gabinete de Sandra e única testemunha do caso. O
encontro está marcado para as 11h da próxima quarta-feira. O colhimento das
versões deve munir o parecer elaborado pelo parlamentar, que tem de ser
entregue até 11 de maio à Comissão de Ética e Decoro Parlamentar.
Inconsistências
Além de prestar serviços por meio da empresa Netpub, Filipe Nogueira
esteve lotado, por cerca de 13 meses, no gabinete da distrital com um salário
de pouco mais de R$ 11 mil. A simples condição fere determinação do Supremo
Tribunal Federal (STF), cujo conteúdo veta “a nomeação de servidor da mesma
pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o
exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada
na administração pública direta e indireta”.
Para
driblar possíveis ações de improbidade administrativa, Sandra defendeu que
pouco sabia sobre o ex-comissionado, uma vez que “o conheceu durante a corrida
eleitoral de 2014 e, apenas por gostar do trabalho, efetivou a nomeação”. Em
nota, informou que o gabinete “não tinha como identificar o parentesco de
Filipe Nogueira com quaisquer sócios da Netpub”. E conclui: “a minuta de
contrato foi assinada por terceira pessoa, a sócia Michelly, que constava como
solteira”.
Em
contrariedade à versão, Filipe Nogueira esteve próximo ao trabalho da
parlamentar por anos. Em 31 de janeiro de 2013, o Diário Oficial do DF trouxe a
nomeação do servidor na Administração Regional do Lago Norte, à época,
comandada por Sandra. Quando exonerado, três meses após a distrital deixar a
gerência da região administrativa e deixá-la nas mãos do amigo e pastor do
Ministério da Fé Ricardo Lustosa, o dono da Netpub pediu exoneração. No lugar
dele, entrou a mulher, Michelly Ribeiro de Souza Nogueira. Sandra afirmou que
não tinha relação direta com o empresário à época e que o contratou por
indicação de outro servidor.
Exoneração
Filipe também acumulou cargos ao longo de seis meses: um na Câmara dos
Deputados e outro na Câmara Legislativa. O empresário trabalhou no Congresso
Nacional entre setembro de 2014 e 2015. No Legislativo local, a prestação de
serviços ocorreu entre janeiro de 2015 e fevereiro de 2016. Portais da
transparência consultados pela reportagem atestam que, entre abril e setembro
de 2015, houve o recebimento de vencimentos dos dois poderes por parte de
Filipe Nogueira. Em defesa, Filipe informou que solicitou exoneração do
Congresso antes de ingressar na Câmara Legislativa.
Além disso,
entre setembro e dezembro de 2014, o empresário era alocado no gabinete da
liderança do Partido Verde na Câmara dos Deputados. Ao mesmo tempo, a Netpub e
a F.N.Coimbra prestavam serviços a um parlamentar da sigla. Filipe alega que, à
época, não era sócio de quaisquer empresas. Situação similar à atual.
R$ 150 mil - É o valor da suposta dívida de Faraj com a Netpub
(O gabinete de Sandra Faraj) Não tinha como identificar
o parentesco de Filipe Nogueira com quaisquer sócios da Netpub”
(Trecho de
nota enviada pela assessoria de Comunicação da parlamentar)
Ações contra Faraj - Na Câmara Legislativa
Dez dias após o sócio da Agência de Comunicação e Tecnologia Netpub
Filipe Nogueira Coimbra acusar Sandra Faraj de embolsar R$ 150 mil em verba
indenizatória — valor que deveria ser repassado à empresa pela prestação de
serviços ao longo de um ano —, a ONG Adote um Distrital, do Instituto de
Fiscalização e Controle (IFC), protocolou, no Legislativo local, um processo
por quebra de decoro parlamentar contra a distrital. A peça passou pelo crivo
da Mesa Diretora, com três votos favoráveis à condução e dois contrários.
Encontra-se nas mãos do Corregedor da Casa, Juarezão (PSB). O deputado tem até
11 de maio para encaminhar o parecer à Comissão de Ética e Decoro Parlamentar,
colegiado com autonomia para instaurar investigações internas.
Na Justiça
Logo no início de fevereiro, a Netpub recorreu à
Justiça para receber os valores supostamente pendentes — o processo tramita na
2ª Vara de Execução de Título Extrajudicial. Em 15 de março, a magistrada
Luciana Corrêa Torres de Oliveira determinou que Sandra Faraj quitasse o débito
em três dias, a partir da data de notificação. A distrital apresentou defesa e
interpôs embargos à execução. Para analisar o pedido de efeito suspensivo, a
juíza determinou, no dia 17 daquele mês, a penhora do carro do marido da parlamentar,
uma Evoque Dynamic 5D. Desde então, o processo não registrou movimentação. Caso
perca a ação, Faraj terá de pagar a Filipe Nogueira R$ 217.630,36, valor da
dívida acrescido de juros.
(*) Ana Viriato – Fotos: Daniel Alves/CB/D.A.Press – Marcelo
Ferreira/CB/D.A.Press – Correio Braziliense