*Por Circe Cunha
“Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo
corpo dos principais ou dos nobres, ou do povo, exercesse esses três poderes: o
de fazer leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou
as divergências dos indivíduos.” (Montesquieu)
Manda a prudência que decisão judicial não deve ser discutida, apenas cumprida. Mas, não obstante a validade da teoria tripartite dos Poderes da República para a consolidação do Estado de Direito, o fato é que as seguidas crises políticas experimentadas nesses últimos anos pela democracia em nosso país têm suscitado a discussão sobre os fenômenos da “politização da justiça” versus a “justicialização da política”.
Para os especialistas no assunto, as interpenetrações de decisões têm
provocado constantes ruídos entre os poderes, facilitando e dando mais
combustível para o desequilíbrio e a desarmonia entre essas instituições, com
prejuízos claros ao funcionamento do governo e a toda a sociedade. Com as
recentes decisões adotadas pelas cortes superiores, o nível de ruído entre os
poderes foi elevado ao máximo, com troca de acusações e farpas para todos os
lados.
Preocupado com a possibilidade dessas rusgas descambarem para o
esvaziamento dos poderes, alguns parlamentares e mesmo juristas de renome têm
apresentado propostas para deixar patentes as fronteiras institucionais entre
os atores de modo a aperfeiçoar todo o sistema, em nome, obviamente, da
almejada estabilidade política. Para ter ideia do grau de desentendimentos a
que chegamos, opondo até membros de um mesmo poder, o ex-procurador-geral da
República Cláudio Fonteles protocolou, com o constitucionalista Marcelo Neves,
novo pedido de impeachment no Senado contra o ministro do Supremo Tribunal
Federal Gilmar Mendes, a quem acusam de crime de responsabilidade em diferentes
ocasiões.
Também corre contra esse ministro um abaixo-assinado com quase 700 mil
assinaturas com as mesmas acusações: “atitudes suspeitas no exercício do cargo
de ministro do STF”. Anteriormente, o ex-presidente do Senado Renan Calheiros
já havia arquivado dois pedidos de impeachment contra Gilmar por “ofender os
princípios de impessoalidade e celeridade processual em julgamentos no STF”.
Naquela ocasião, Renan teria afirmado: “Não cabe ao Senado, como já fizemos em
outras oportunidades, processar e julgar o ministro por condutas atinentes
exclusivamente ao cargo que ocupa e nos exatos limites de seus poderes”.
Atento a essas situações, o senador Reguffe (sem partido) apresentou
projeto de emenda à Constituição estabelecendo que os ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF), bem como do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do
Tribunal de Contas da União (TCU), além dos conselheiros desses tribunais nos
estados, sejam selecionados mediante concurso público de provas e títulos e
nomeados para mandato de cinco anos.
Na justificativa, o senador por Brasília lembrou que a PEC tem como
objetivo homenagear o princípio de independência dos poderes. Para o senador,
“urge que preservemos esses órgãos extremamente relevantes e sensíveis de
influências político-partidárias”.
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A frase que não foi pronunciada
“Quando não se quer resolver um problema, basta montar uma comissão para estudá-lo.”
(Tancredo
Neves, político
brasileiro)
(*) Por Circe Cunha – Coluna “Visto, lido e ouvido”
– Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google