O Dia Mundial de Combate à Violência Contra a
Pessoa Idosa - Buriti foi iluminado em lilás. Foto:
Nilson Carvalho/Agência Brasília
Rankings da vergonha 1
*Por Circe Cunha
Sexagenária e com uma população que já ultrapassou
os 3 milhões de habitantes, Brasília é hoje uma metrópole que, a exemplo de
muitas capitais país afora, apresenta sintomas visíveis de decrepitude precoce.
Além dos problemas urbanos clássicos que se avolumam por causa do crescimento
rápido e desordenado, a cidade vai se despontando também no cenário nacional
nos vergonhosos rankings da violência contra a mulher e contra os idosos.
A cada dia, novos casos e novos dados reforçam a
tese de que Brasília é mais um ente da União com seriíssimos problemas de ordem
social, cujas causas principais ainda não são totalmente conhecidas. Uma coisa
é certa: as características humanizadoras, quase inocentes, idealizadas e
defendidas pelos criadores da capital, já não existem mais. É coisa de um
passado distante e esquecido.
Denúncias de violência contra pessoas idosas têm
chegado a cada instante e em tal volume ao conhecimento público que acabaram
por obrigar as autoridades locais a criarem delegacias especializadas somente
para atenderem essas ocorrências e racionalizar o combate a esses crimes
hediondos. Com a criação recente da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes
por Discriminação Racial, Religiosa ou por Orientação Sexual ou Contra a Pessoa
Idosa ou com Deficiência (Decrin), os casos de abuso e violência contra os
idosos começaram a vir à luz, mostrando situação até recentemente desconhecida
dos brasilienses.
Nessa delegacia, mais de 63% das denúncias
registradas são referentes a maus-tratos contra idosos. Das 278 ocorrências
anotadas, 176 se referiam à violação de direitos contra maiores de 60 anos. Dos
183 casos registrados em 2016, 61 eram de violência explícita contra pessoas da
terceira idade. Apenas nos primeiros meses deste ano, houve relatos de mais de
60 crimes contra os idosos.
Apesar da quantidade preocupante, a delegada que
comanda essa unidade da polícia, Gláucia Cristina da Silva, reconhece que esses
números não refletem a realidade. Como a maioria dos crimes de ofensa moral,
financeira e física ocorrem dentro de casa, praticados pelos próprios
familiares, os respectivos registros quase nunca são feitos, o que dificulta
muito o conhecimento das estatísticas reais.
Pelo canal criado pelo Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e dos Territórios, conhecido como Central Judicial do Idoso,
ficou mais fácil conhecer de perto a realidade. Em 2016, essa Central computou
2.601 casos, sendo 283 de violência, dos quais 106 foram de violência
psicológica e 94 de negligência. No quadro assustador, as mulheres foram as que
mais sofreram violações de direitos, com 157 casos registrados.
Plano Piloto e Ceilândia lideram os números de
violência contra idosos. Com uma população acima dos 60 anos, estimada em
aproximadamente 300 mil pessoas ou 15% do total, chega a ser surpreendente que
2.601 casos de violência contra idosos tenham ocorrido num período de apenas um
ano. Pelo Disque Idoso, no número 156, opção 8, e pelo Disque 100, Disque 197 e
Disque 162, podem ser feitos registros e denúncias de violência contra os
idosos.
Para uma capital que foi idealizada como marco de
nova civilização, que iria comandar os destinos do país, Brasília parece ter
tal forma se desviado do rumo natural que se tornou necessário ao Estado criar
um departamento especializado em socorrer a população idosa, a maioria formada
de candangos pioneiros, massacrados por jovens que parecem não acreditar nem na
Justiça, nem no fato de que um dia vão ser idosos também.
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A frase que foi pronunciada
“A história é um conjunto de mentiras sobre as
quais se chegou a um acordo.”
(Napoleão Bonaparte, um visionário)
(*) Circe Cunha – Coluna “Visto, lido e ouvido” –
Ari Cunha – Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google