O sumiço das cigarras
Os sons de Brasília começam a mudar antes da época de chuvas. A cantoria
inconfundível das cigarras, acompanha aqueles que passam pelas áreas mais
arborizadas do Plano Piloto. Esses insetos peculiares surgem, normalmente, no
fim de julho e permanecem até novembro. No entanto, este ano, eles ainda não
apareceram.
O aparecimento das cigarras está ligado diretamente ao clima. O
desaparecimento delas pode estar ligado a seca prolongada. No entanto, o
professor de zoologia Paulo Cesar Motta, da Universidade de Brasília, explica
que ainda não há estudos que mostrem a ausência real do bicho este ano. “As
cigarras adaptaram o próprio ciclo de vida à transição climática entre seca e
chuva. Com a demora das precipitações, elas também levam mais tempo para
aparecer”, explica. De acordo com ele, as próximas chuvas podem trazer de volta
as cigarras.
O Correio percorreu as ruas do Plano Piloto em busca das famosas
cigarras. No entanto, a reportagem encontrou apenas a carapaça vazia de uma
delas. Motta esclarece que, quando a cigarra passa para a fase adulta, ela
deixa para trás essa casca, cria asas e começa a se reproduzir. “Os jovens
vivem em baixo da terra e se alimentam da ceiva das raízes. Após cinco ou sete
anos, eles fazem um buraco no solo e sobem para superfície. Em seguida,
procuram uma árvore para o processo de transformação em adulto”, observa.
Na fase adulta, as cigarras vivem de um a dois meses. Após a
transformação, elas ganham asas e crescem para copular. O macho é responsável
por reproduzir o som para atrair as fêmeas. “Após o acasalamento, as cigarras
fêmeas sobem no galho das plantas e depositam os ovos. Assim que os jovens
nascem, eles caem no chão e se enterram, permanecendo ali até repetir o mesmo
processo”, conta o especialista. A evolução das cigarras ocorre somente para a
reprodução, após isso, elas morrem.
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CRISE HÍDRICA » Menos chuva, mais corte
* Pedro Grigori
Reservatório do Descoberto, ontem, quando atingiu 14%, o pior nível de
sua história: no mesmo dia, foi registrada a temperatura mais alta do ano
O prolongamento da estiagem tem levado a diários recordes negativos nos
níveis dos dois principais reservatórios de água do DF. Adasa trabalha com
novas medidas de racionamento
Com o nível dos reservatórios que abastecem o Distrito Federal batendo
recordes negativos diariamente, a ampliação do racionamento pode sair do papel
ainda nas próximas semanas. Ontem, Descoberto e Santa Maria chegaram a 14% e
27,5%, respectivamente, os piores índices da história, no mesmo dia em que foi
registrada a temperatura mais alta do ano, 34,1ºC.
Caso a vazão de água do Descoberto siga a média apresentada nos
primeiros dias de outubro, o reservatório deve fechar o mês abaixo do previsto
pela curva de acompanhamento estipulada pela Agência Reguladora de Águas,
Energia e Saneamento Básico (Adasa), 9%. Por isso, o órgão afirma que, se
houver percepção de que a meta será batida, medidas mais rígidas, como
ampliação do racionamento e redução na retirada de água das propriedades
rurais, podem ser antecipadas e tomadas ainda neste mês.
A ampliação do racionamento é prevista desde novembro. Na resolução da
Adasa que autorizava o início do rodízio de água, um artigo decretava que o
período de interrupção poderia ser ampliado, progressivamente, caso sobrevenha
agravamento na situação de escassez hídrica dos reservatórios. Só neste mês, o
Descoberto caiu 2,9 pontos percentuais. Para deixar a situação mais crítica, o
Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) prevê menos chuvas no último
trimestre de 2017 que o registrado na média histórica.
Área rural
Nos últimos 10 dias, choveu 19,7 milímetros, menos de 11% da média
história para o mês –166.6 milímetros. A Adasa anunciou que vai intensificar a
medição do volume de vazão dos afluentes do Descoberto, para identificar se
menos água, subterrânea ou não, está chegando ao reservatório. A fiscalização,
que antes era semanal, será feita três vezes por semana. A lei federal nº
9.433, de 1997, prevê que em situações de escassez, o uso prioritário dos
recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais. Por isso, os
primeiros cortes devem ocorrer no meio rural do DF.
A captação de água bruta por produtores, que antes era feita 24 horas
por dia, foi restringida neste ano em 75%, podendo ocorrer apenas entre 6h e 9h
e três vezes por semana. A possibilidade de mais restrições preocupa quem vive
de agricultura. A presidente da Associação de Produtores Rurais Pró-Descoberto,
Rosany Jakubowski, afirma que alguns agricultores diminuíram o cultivo em até
70%. De acordo com ela, uma nova redução do tempo de captação ameaça o futuro
do setor. “Nossas irrigações estão limitadas desde o início do ano e sofremos
restrição na área em que podemos plantar. O número de demissões por parte dos
empregadores também cresceu, pois não temos garantia de renda nem de faturamento”,
conta.
Rosany trabalha com a produção de frutas e flores em uma área rural
localizada no Incra 6, em Brazlândia. De acordo com ela, a produção este ano
caiu cerca de 60%. A mulher vem de uma família de produtores agrícolas e está
na terceira geração deles, porém, acredita que esta pode ser a última. “O DF
deve ficar atento quanto aos produtores rurais. Se o mercado decretar falência,
nossa saída será vender as terras. Com isso, teremos a presença de grileiros e
futuramente mais ocupações irregulares”, alerta.
27,5%
Nível do reservatório de Santa Maria, registrado ontem
34,1%
Temperatura máxima registrada ontem, a maior do ano
(*) Pedro Grigori » * Estagiário sob supervisão de Renato
Alves - Especial para o Correio» Walder Galvão* - Fotos: Breno
Fortes/CB/D.A.Press - Jonathan Araújo Fotografia -
Correio Braziliense