A nossa orquestra
*Por Mariana Niederauer
“Prestigiem essa orquestra, que é de Brasília, é
desta cidade, é do povo: é de vocês”, clama o maestro antes de dar início ao
concerto e logo após a apresentação do hino nacional, ao som de violinos,
violoncelos, contrabaixos, clarinetas, trompetes e tantos outros instrumentos.
O telão branco ao fundo contrasta com o conjunto de músicos vestidos de preto.
Distante do Teatro Nacional Claudio Santoro, sua casa e lugar natural, a
Orquestra Sinfônica da cidade encontra (e transforma) no Cine Brasília um verdadeiro
ponto de cultura. Diverso, dinâmico, plural.
Assistir a um concerto em Brasília é, por esses e
por outros motivos, uma experiência completa de vivência da cidade, que
ultrapassa a esfera cultural. O ambiente acolhe, por ser nosso, mas sem deixar
de lado o rigor. Entra-se de graça, apenas com a vontade de apreciar o
espetáculo. Não se admite, no entanto, atrasos ou levar qualquer alimento.
Até o músico é barrado com um copo de água na mão.
“Assim não entra”, afirma, categórica, a responsável pelo acesso à sala. “Não
vou atirá-lo em ninguém, garanto”, argumenta o músico, com sua gravata
borboleta, segurando o copo de plástico. “Ele é músico”, endossa o
representante da Secretaria de Cultura, ao que o homem tem a entrada liberada,
sob protestos: “É preciso avisar”, diz a mulher, compenetrada na tarefa de
garantir um espetáculo impecável.
Mas as imperfeições… O que seria do concerto de uma
orquestra brasileira que vence adversidades diárias e se apresenta em um cinema
não fossem as imperfeições? Antes de a apresentação começar, um locutor afável
pede gentilmente que os celulares permaneçam desligados ou programados para não
incomodar.
Explica-se: a performance que se seguirá exige dos
músicos extrema concentração, qualquer desvio de atenção, portanto, poderá
comprometer o resultado final. Por esse mesmo motivo, nosso narrador pede a
gentileza de pais que levaram os filhos pequenos (e que bom que o fizeram!) se
acomodarem próximo a uma das saídas, para que a calma seja brevemente
restabelecida e possam voltar rapidamente ao espetáculo.
E é assim que o concerto começa, de maneira
espetacular. Numa pequena pausa na apresentação de A Flauta Mágica, de Mozart,
um espectador ensaia uma salva de palmas, logo abafada pelas próximas notas. Em
outro respiro da orquestra, o choro do bebê complementa o acorde do violino.
Momentos depois, a Flauta Mágica é personificada
por Sefika Kutluer, flautista solista turca reconhecida internacionalmente. Em
desempenho impressionante, ela tira notas do fundo do pulmão, com elegância que
completa o brilho do instrumento. É aclamada de pé por uma plateia estarrecida
com o solo. A mesma que pode não saber o momento exato de aplaudir, mas com
certeza reconhece o talento e expressa como nenhuma outra a emoção provocada
por uma imersão cultural.
Amanhã é tempo de aplaudir e prestigiar o que é
nosso novamente: a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacinal Claudio Santoro
apresenta o projeto Música na Estrada, com obras do francês Claude Debussy e do
russo Tchaikovsky, às 20h, no mesmo Cine Brasília (106/107 Sul).
Programação - Entrada Franca - 20 Horas - Cine Brasília - 106/107 Sul
(*) Mariana Niederauer –
Correio Braziliense - Foto/Ilustração: Blog - Google