Atividade é avaliativa, mas adolescentes se envolvem tanto que passam o
dia na escola para participarem
Projeto desenvolvido no Centro Educacional 4 do Guará une grafite e
matemática. Desenhos na área externa da escola também servem para conquistar a
simpatia da comunidade pelos estudantes
*Por Yasmin Cruz
Ao passar em frente ao Centro Educacional 4 do Guará, é possível
observar a frase “Aqui acreditamos em você”, e gravuras no muro. As pinturas
fazem parte do projeto Grafimat, desenvolvido pelos alunos no ensino médio, que
une a arte e a matemática. Sprays de tinta são vistos nas mãos de adolescentes
que se divertem revitalizando o muro. A escola atende turmas a partir do oitavo
ano do Ensino Fundamental e também da Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Localizada próxima a uma estação do metrô, a mudança no visual da escola
tem chamado a atenção da vizinhança. Quem passa em frente chega a parar para
elogiar o trabalho que está sendo feito. Antes do trabalho executado pelos
alunos, o muro estava descuidado e repleto de pichações. A diretora Janete de
Maria Ribeiro conta que o projeto tem um objetivo maior, obter o acolhimento da
população aos alunos. A maioria, 87%, são moradores da Estrutural. Em 2009, a
instituição de ensino enfrentou sérios problemas devido à indisciplina dos
estudantes.
Eles se rebelaram contra as regras e começaram a quebrar pertences da
escola. “Foi um ano terrível. A direção foi afastada e o Batalhão Escolar
precisou intervir”. A situação provocou a rejeição dos alunos pela comunidade.
“Hoje ,fazemos esse trabalho para que a população os acolha e respeite”, diz a
diretora. Outro ganho com o projeto “é o cuidado que os estudantes
passaram a ter com o ambiente escolar”, ressalta Janete.
Grafiteiros conhecidos foram convidados para ensinar técnicas de pintura
aos alunos. E fizeram sem cobrar nada. Antes de os adolescentes colocarem a mão
na massa, os convidados contaram suas histórias de vida, pelo que passaram até
serem reconhecidos como artistas.
Encaixe de figuras
O grafite feito pelos alunos foi inspirado no trabalho do artista
holandês Escher, em que as figuras se encaixam nelas mesmas. “Apresentei a
parte matemática do trabalho do artista, depois os alunos começaram a criar”,
explica o professor de matemática Emerson Teixeira, que leciona na escola há 18
anos.
Os alunos se uniram em torno do projeto, que foi visto como diversão. A
aluna do terceiro ano Thayná Monteiro, 18, diz que não há escola de ensino
médio na Estrutural, onde mora com a mãe e o padrasto. Thayná fez as provas da
última edição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e sonha fazer faculdade
de química ou estética. Durante o projeto, ela foi incentivada a perseguir seu
desejo. “Um dos grafiteiros falou para eu acreditar em mim, não deixar nada me
desanimar”, falou entusiasmada.
O projeto uniu os alunos e fez com que eles se divertissem. Apesar da
pintura ser avaliativa, eles se envolvem tanto que acabam vindo no turno
contrário apenas para participar”, ressalta a professora de química Joanna de
Paoli, 32, que está na função de coordenadora do programa Ensino Médio Inovador
(EMI). Esse programa disponibiliza apoio técnico e financeiro para o
desenvolvimento de propostas curriculares inovadoras nas escolas de ensino
médio.
Pinturas são mais do que trabalho, são um estilo de vida, defende Mikael
Do gibi para a vida
“Quando eu tinha seis anos, minha irmã lia gibi para mim todo dia no
mesmo horário. Quando ela começou a namorar, parou de ler. Foi aí que começou
minha paixão pelo desenho. Como sabia o que os personagens falavam, passei a
desenhar o que estavam fazendo”, conta Mikael Guedes, 23, ou “Omik”, como é
conhecido. O grafiteiro, que nasceu e cresceu em Brasília e agora reside no
Guará, diz que o grafite é mais que um trabalho, é um estilo de vida.
Mikael diz que sua arte lhe dá retorno financeiro suficiente. “O grafite também
me deu amigos e ganhei o respeito de pessoas que admiro.”
Ele conta que, ao ser convidado para participar do projeto, chamou os
amigos de profissão para participarem: Rafael Atoa, Marcos Breubs e Erik
Derk. “A direção queria dar uma cara nova para a escola. Com a
participação dos alunos, eles passam a respeitar o que eles mesmos fizeram”,
opina.
Maurits Cornelis Escher
A obra de Maurits Cornelis Escher (1898-1972) é conhecida por suas
construções impossíveis. Ele é autor de 448 litografias, gravuras em madeira e
2 mil desenhos e esboços. O artista ainda ilustrou livros, tapeçarias
desenhadas, selos postais e murais.
(*) Yasmin Cruz – Fotos: Ana Rayssa/CB/D.A.Press – Marcelo Ferreira/CB/D.A.Press
– Correio Braziliense